O presidente dos EUA, Donald Trump, coerente com seu discurso de campanha, anunciou o aumento de tarifas de importação de aço e alumínio. A Europa reagiu mal, ameaçando com uma guerra comercial. Trump, que é do tipo que quer ficar com a última palavra, retrucou dizendo que esta guerra ele ganha.
O assunto começou mal, mas poderá acabar bem.
O caminho para a agenda protecionista de Trump não está tão livre como parece.
Impor tarifas é normalmente uma prerrogativa do Legislativo. A iniciativa de Trump só foi possível, porque ele alegou ser uma questão da segurança nacional, cabendo a decisão, neste caso, exclusivamente ao presidente.
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Há oposição de parte da equipe econômica e de seu próprio partido. Gary Cohn, importante conselheiro, renunciou e membros do Partido Republicano, incluindo o presidente da Câmara, Paul Ryan, vieram a público para se opor ao anúncio.
Coube à China ser o adulto da relação, colocando-se contra uma guerra comercial. O ministro do Comércio, Zhong Shan, afirmou que “não há vencedores em uma guerra comercial. Apenas causará desastre à China, aos EUA e ao mundo”. Na mesma linha seguiu a chanceler alemã, Angela Merkel.
Com visão míope e parcial – vício comum de populistas –, Trump aposta nos empregos gerados no setor, desconsiderando os custos futuros para todos. A agenda econômica de Trump é inconsistente. Porém, assim como os erros de Dilma não ficaram evidentes tão cedo, os de Trump também poderão tardar a se materializar.
Corretamente, os republicanos temem o aumento de custos de produção das indústrias que dependem desses insumos (esse efeito tende a ser mais rápido) e de preços ao consumidor em algum momento. Além disso, o fechamento da economia reduz o potencial de crescimento do país.
Outro efeito perverso é nas relações externas. Não existe vácuo de poder. Enquanto os EUA se isolam, a China avança, ampliando sua influência com investimento nos países e reforço de laços comerciais e financeiros com seus parceiros (“soft power”). Por essas e outras, uma nova ordem mundial vai se moldando, com menor protagonismo norte-americano.
Apesar do temor de guerra comercial, esse não parece o cenário mais provável, a julgar pelas reações dos países às decisões polêmicas de Trump. O risco é de isolamento dos EUA. Aqui alguns exemplos.
Primeiro, o recém assinado Acordo Transpacífico (TPP), que teve a liderança de Barack Obama. O agora chamado Tratado Integral e Progressista de Associação Transpacífico (CPTPP) engloba relações comerciais e também serviços e acordos de cooperação em várias áreas. Os EUA se retiraram, mas os demais onze países envolvidos seguiram seus planos. Juntos, representam 15% do comércio mundial. Outros países demonstram interesse em aderir: Tailândia, Indonésia, Coreia, Filipinas e Taiwan. A ausência dos EUA deixa o caminho livre para a China fazer acordos.
Segundo, o Acordo de Paris sobre o Clima, com adesão de 196 países. O acordo havia sido assinado por Obama, mas Trump voltou atrás por considerá-lo prejudicial aos interesses dos EUA, mesmo sendo o segundo maior emissor mundial de gases de efeito estufa. A Casa Branca está sozinha.
Terceiro, apesar da oposição do governo americano desde a época de Obama, o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura foi criado como alternativa ao Banco Mundial. São atualmente 61 países membros.
Para o Brasil, o impacto do aumento das tarifas de importação do aço e do alumínio é setorial, e não no nível macroeconômico, pelo reduzido peso no PIB. As lições, no entanto, são claras. O Brasil deve responder não com retaliações, mas com aceleração de acordos comerciais com o resto do mundo.
O Brasil é demasiadamente fechado, mesmo levando em consideração seu isolamento geográfico e o tamanho do mercado interno. Isso implica menor estímulo à inovação e menor acesso a tecnologias, insumos e serviços mais sofisticados. A decisão de Trump deve ser estímulo para a abertura e não desculpa para maior fechamento do País.
Fonte: “Estadão”, 15/03/2018