Quanto custam os incentivos fiscais no Brasil? Esta pergunta, caro leitor, poderia ser respondida de diversas formas, de acordo com o ângulo através do qual se observa essa prática já tão entranhada na cultura e no Estado brasileiros. Segundo dados do próprio Ministério da Fazenda, os governos Lula e Dilma gastaram R$ 3,5 trilhões em subsídios entre 2003 e 2016, montante que incluía uma série de empréstimos bilionários do Tesouro ao BNDES, a desoneração da folha de pagamentos de empresas e os programas Minha Casa Minha Vida, Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e de Sustentação do Investimento (PSI). Para se ter uma ideia, apenas o governo de Dilma Rousseff, de 2011 a 2015, gastou R$ 458 bilhões em desonerações, uma das políticas responsáveis pelo desequilíbrio fiscal das contas públicas. Para 2019, a previsão de gastos com incentivos fiscais é de R$ 376 bilhões, o que fatalmente tem um custo que, uma vez revisto, poderia ser uma vasta fonte de investimento público em saúde, educação e segurança.
Para entender como as desonerações fiscais nos afetam diretamente, é preciso fazer uma matemática simples: o mercado funciona a partir de trocas voluntárias, ou seja, uma pessoa opta por trocar seu capital por um produto de que outra pessoa dispõe. Acontece que, quando o Estado interfere oferecendo incentivos seletivamente a certa empresa, como acontece no Brasil nos setores automobilístico e de agricultura e agroindústria, o que ele faz, na prática, é criar uma imperfeição por dentro deste circuito de trocas voluntárias, tornando algumas empresas mais competitivas em relação a outras. Isto impede que haja competitividade real, criando um ambiente artificial de mercado que, via de regra, impede uma das premissas básicas do pensamento liberal – afinal, como o incentivo beneficia um setor em detrimento de outro, além de criar este desarranjo pontual, a longo prazo isso interfere também na inovação e na capacidade de investimentos no interior da própria cadeia produtiva.
Quando o estado passa a ser o motor de movimento do mercado, cria-se uma relação de dependência com importantes consequências. É este ponto, por exemplo, que nos coloca em uma posição baixíssima nos Rankings de Liberdade Econômica e faz com que a OCDE, em relatório emitido sobre a economia brasileira, alerte que não vê nenhuma evidência que possa comprovar a relação entre incentivos fiscais e produtividade ou investimentos em nosso país. A organização recomenda, inclusive, que alguns desses benefícios sejam reduzidos como alternativa para um reaquecimento econômico. Diante deste cenário, o que fazer? Basta nos colocarmos diante de alguns números para que se evidencie como uma política massiva de desonerações serve de obstáculo para as contas e investimentos públicos.
O BNDES, por exemplo, é um dos principais responsáveis pelos incentivos fiscais e desonerações de impostos no Brasil. Estudo do professor Marcos Bonomo, do Insper, estima que, em 2017, subsídios implícitos do BNDES passaram de R$ 222 milhões, a maioria deles através de crédito por uma taxa muito abaixo do mercado (TJLP), as vezes até abaixo da inflação, caracterizando-se como uma espécie de transferência de dinheiro dos impostos das pessoas pobres para empresas multimilionárias. O resultado desses empréstimos foram um rombo de R$ 279 milhões nos cofres públicos. Para o ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, estas distorções com subsídios, aliadas também às pedaladas fiscais, acabaram por produzir um passivo de pelo menos R$ 20 bilhões que precisaram ser devolvidos ao Tesouro Nacional. De lá pra cá, ou seja, desde 2017, houve uma queda de pelo menos R$ 10 bilhões deste déficit – o que, embora não seja ainda uma solução, demonstra que não há uma relação entre corte de subsídios e desaquecimento econômico.
Outro exemplo é o caso do Simples Nacional. Este sistema compartilhado de arrecadação, cobrança e fiscalização de tributos aplicável às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, criado em 2006 visando “simplificar” e reduzir as formas de pagamento das pequenas empresas, acaba por produzir também uma série de distorções, principalmente porque inclui benefícios para empresários que lucram até R$ 4,8 milhões por ano. Segundo Melina Rocha Lukic, uma das autoras de um estudo feito pela IPEA, em entrevista à Folha de São Paulo, caso esses incentivos sejam reduzidos, ou até eliminados, seria possível uma redução no Imposto de Renda para pessoas jurídicas. No total, seria possível economizar até R$ 74,8 bilhões.
Ainda, a Zona Franca de Manaus concentra, apenas nela, 10% das desonerações dadas a empresas, totalizando em torno de R$ 26 bilhões ao ano. Apesar de funcionar como um incentivo para uma área de isolamento geográfico, auditorias mostram que a política não é eficiente e as falhas na fiscalização permitem que até beneficiários do Bolsa Família estejam incluídos entre os contemplados. Estima-se que, no total, o governo deixe de arrecadar em torno de R$ 26 bilhões entre impostos – IPI, PIS e Cofins e Imposto de Importação. Embora o governo estude formas de reduzir os incentivos da Zona Franca de Manaus, há um grande empecilho em seu caminho: a decisão de 2018 do STF que incide sobre empresas fora da Zona aumenta em R$ 16 bilhões os incentivos para a Zona Franca. Trata-se de uma equação que precisa ser invertida.
Ao pensar sobre desonerações fiscais, antes de tudo é preciso ter em mente que grande parte da população não tem qualquer tipo de redução em seus impostos. É a população como um todo que arca com estes incentivos que geram desequilíbrios em nossa economia, gerando concentração de renda e monopólios que obstruem a nossa capacidade de crescimento. Uma política responsável no que diz respeito a incentivos fiscais, tanto no que se refere a uma gradual redução destas desonerações quanto a extinção de muitos desses privilégios, poderiam, a longo prazo, permitir uma redução geral de impostos para toda a população, possibilitando uma política de investimentos coerente com a função do Estado: prover saúde, educação e segurança, além de permitir e manter um mercado aquecido.
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