O governo brasileiro deverá em breve anunciar uma das decisões estratégicas mais importantes do atual mandato. Estava prevista para ocorrer em 2020 a licitação do uso da tecnologia de quinta geração para telefonia móvel que terá forte impacto sobre as pessoas e sobre as empresas. Não é uma decisão fácil.
Qual o problema? Aceitar ou não a utilização da tecnologia chinesa, mais avançada, mais barata, mas vetada pelos EUA no contexto da disputa com a China. Segundo se informa, o governo, seguindo informe político do Itamaraty, teria cedido a pressão do governo Trump e decidido impedir, por razões geopolíticas, a participação de empresa chinesa da licitação para a instalação dessa tecnologia no Brasil.
Caso se confirme, essa decisão se choca com interesses nacionais concretos. Em primeiro lugar, vai obrigar as empresas de telecomunicações a trocar os equipamentos da empresa chinesa que há muitos anos são utilizados no serviço 3G e 4G pelo de outros fornecedores com um custo adicional e um atraso na entrada em funcionamento da nova tecnologia. Em segundo lugar, vai prejudicar a modernização da indústria nacional na saída da pandemia.
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A modernização da indústria poderia ser acelerada com a utilização do 5G pela velocidade do uso de dados, da internet das coisas e da robotização. O interesse das empresas é o de iniciar o mais rapidamente possível a utilização do 5G. Em terceiro lugar, o Brasil vai tomar partido em uma disputa entre os EUA e a China, que apenas se inicia e que deverá se estender por décadas pela hegemonia global no século XXI. Haverá certamente muitas outras disputas em que países, como o Brasil, deverão decidir sobre de que lado vão ficar. Não atende ao interesse nacional o Brasil tomar partido agora de um lado ou de outro. Em quarto lugar, vai acrescentar mais um elemento negativo no relacionamento com a China, o que poderá acarretar consequências no campo comercial, com eventual reflexo nas exportações do setor agrícola.
Nesse, como em todos os outros casos, a decisão deveria ser tomada segundo nossos próprios interesses e conveniências, acima de considerações ideológicas ou geopolíticas. Alguns países europeus (Alemanha, França, Itália) e a India decidiram não excluir nenhuma empresa e buscar as melhores condições de mercado. Setores sensíveis de governo, em especial de defesa, podem ser segregados, se for o caso. No Brasil, o presidente Bolsonaro, o vice-presidente Mourão e o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcio Pontes, tinham se manifestado a favor da livre concorrência, sem exclusão de nenhuma empresa na licitação que a Anatel deverá realizar. O novo ministro das Comunicações deverá seguir a posição do Itamaraty.
Com essa decisão, o Brasil estará perdendo tempo precioso. A licitação deverá ser adiada para 2021 com prejuízo para a indústria que só vai poder utilizar essa tecnológica em 2022 ou 2023.
Fonte: “O Estado de São Paulo”, 17/6/2020