O ano é 2020 e a multinacional americana Apple anuncia que não vai vender mais carregadores junto com os seus celulares. Uma decisão de mercado, transparente e legítima. Como reage a SENACON, Secretaria Nacional do Consumidor? Notifica a empresa, pedindo esclarecimentos sobre uma prática privada.
Esse é um recorte recente de um dos grandes problemas da legislação brasileira, que abre espaço para que agências do Estado possam aplicar multas e penalidades em empresas privadas, ainda que não haja fraudes ou violações. E o resultado da intervenção estatal não é novidade: desconfiança para o setor empresarial e falta de opções para o consumidor.
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No ano passado, segundo dados divulgados pelo G1, o Brasil ficou de fora do ranking dos 25 países mais confiáveis para investimento estrangeiro. O levantamento foi feito pela consultoria A.T.Kearney e contou com a participação de 500 executivos de companhias líderes mundiais, que respondem sobre a possibilidade de investimentos em mercados ao longo de no mínimo três anos.
Para João Accioly, mestre em economia, advogado e membro-fundador do Instituto Millenium, ao criarmos dificuldades para que o mercado atue de forma livre, impedimos que haja inovações e perdermos credibilidade.
“Em um cenário em que tantos esforços vêm sendo feitos pelo governo, com tantos resultados para priorizar a liberdade econômica, deslizes como esse colocam em risco muito do que vem sendo feito”, afirmou.
Independente de acreditarmos que a Apple tomou uma boa decisão ou não, é importante ressaltar que ao tomar decisões arbitrárias, como essa de exigir explicações sobre práticas privadas sem que haja fraude ou lesão ao consumidor, gera-se um marketing negativo para as empresas que pode fazer com que empresários recuem em suas decisões.
“Não acho que será o que vai acontecer, porque as pessoas que estão na SENACON são super técnicas na análise das respostas que virão. Mas o que poderia acontecer, por isso é importante combater desde a origem, é que as empresas, para evitarem problemas e complicações, deixariam de criar novas alternativas para o consumidor”, explicou.
Além disso, o consumidor é tão lesado quanto a empresa com esse tipo de ação, considerando que ele deixa de ter mais uma opção de consumo no mercado e sua liberdade de escolha é retirada, já que o Estado foi quem escolheu para ele.
“O consumidor sabe o que ele prefere. O Estado não deve achar que as pessoas não sabem decidir por si só e que precisam sempre ter um Estado perguntando e vigiando, como se o governo quisesse substituir a decisão racional de pessoas maiores de idade. O mercado e as relações de troca voluntárias vão dar muito mais respostas para o sistema de preços, o sistema de inovação, de concorrência e competitividade”, finalizou.