Embora fique atrás apenas do México e da Nova Zelândia na proporção dos gastos públicos destinados à educação, o Brasil, que aplicou 17,2% de todo o orçamento no setor em 2012, está nas últimas posições quando o assunto é o valor investido anualmente por aluno. Foram US$ 3.441 por estudante da rede pública brasileira, do ensino básico ao superior, montante que corresponde a 37% da média dos 34 países que compõem a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que é de US$ 9.317.
No topo da lista está Luxemburgo (US$ 21.998) e Suíça (US$ 15.859). Atrás do Brasil, apenas México (US$ 3.233), Turquia (US$ 3.072), Colômbia (US$ 2.898) e Indonésia (US$ 1.809). Os dois últimos, assim como o Brasil, não são membros da OCDE, mas, sim, parceiros. Os dados, que fazem parte do relatório “Education at a glance 2015”, elaborado pela entidade para avaliar diversos aspectos da educação no mundo, apresenta os valores de investimento em dólar americano convertido pela metodologia de paridade do poder de compra, que equaliza as moedas via poder aquisitivo, e não pela taxa de câmbio.
Ao comentar a publicação, o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Chico Soares, afirmou que os números revelam o “esforço” do país em aumentar o investimento em educação, mas que, na comparação com nações mais ricas, é compreensível que os montantes aplicados pelo Brasil sejam menores:
— É impossível pegarmos um dado e levá-lo para o primeiro mundo. Não posso querer gastar na educação o mesmo que a Áustria gasta. E a saúde, o saneamento, o transporte, a segurança? Estamos gastando um terço (da média dos países da OCDE) porque isso corresponde à nossa situação. Em termos de esforço, estamos avançando.
Segundo a publicação, o gasto público em educação feito no Brasil, em 2012, foi de 5,6% do PIB, patamar “consideravelmente maior que a média da OCDE de 4,7% e a quinta mais alta entre todos os países e parceiros com dados disponíveis”. No entanto, a entidade ressalta uma desigualdade na aplicação do dinheiro. O ensino superior brasileiro recebe 3,4 vezes mais recursos que os anos iniciais do ensino fundamental. Na média da OCDE, esse investimento é 1,8 vez maior.
Investimento insuficiente
A coordenadora-geral do Todos Pela Educação, Alejandra Meraz Velasco, lembra que, apesar de ter um percentual maior de gasto público com educação em relação aos outros países, o Brasil tem uma economia menor ou mais alunos, se comparado com várias dessas nações. Por isso, não há uma relação direta entre esse indicador e a qualidade do ensino. Ela também deixa um alerta:
— Na edição anterior, esse percentual do gasto público era de 19%. Ou seja, o país já investiu mais.
De acordo com o coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, esse índice de investimento do PIB ainda não é suficiente. Ele afirma que o relatório da OCDE revela a necessidade de ampliar o gasto para 10% do PIB.
— O Brasil ainda tem uma demanda educacional enorme, precisamos incluir muita gente. O que significa que, se incluir mais alunos sem aumentar o investimento em relação ao PIB, o custo por estudante vai diminuir. Por isso, a luta pelos 10% do PIB para educação é importante, para que tenhamos um investimento que garanta padrão mínimo de qualidade. Qualificar esse custo por aluno é fundamental, daí a importância de implementar o CAQi (Custo Aluno-Qualidade inicial) — explicou. — Mesmo se resolvêssemos os problemas de gestão, o investimento por aluno que temos hoje não garante a educação. E, com a corrupção, isso é pior ainda.
O CAQi é um indicador que mostra qual valor deve ser investido anualmente por aluno na educação básica, considerando insumos materiais e humanos mínimos para garantir um padrão de qualidade no ensino.
Apesar de fatias do orçamento total cada vez maiores para a educação, o Brasil aparece como sexto, entre as nações avaliadas, com a mais elevada proporção de jovens de 25 a 34 anos que não concluíram o ensino médio. São 39% nessa situação. Apesar de ainda elevado, assinala a OCDE, o índice tem caído ao longo do tempo, quando se verifica que, na população brasileira de 55 a 64 anos, 72% não terminaram o antigo segundo grau.
Em alguns estados, a situação é ainda pior. Alagoas, por exemplo, registra 61% de pessoas de 25 a 34 anos sem ensino médio, mesmo índice verificado na Indonésia para a mesma faixa etária. Já no Distrito Federal, 75% da população nessa idade têm o certificado de ensino médio, panorama semelhante ao da Itália e da Islândia, segundo o estudo. Pela primeira vez, a publicação trouxe indicadores locais de alguns países para determinadas variáveis.
No ranking do ensino médio atrelado a programas de educação profissional, o Brasil vai mal, contrariando o discurso do governo de valorização da formação técnica. É o terceiro país com menos alunos nessa modalidade, perdendo apenas para Irlanda e Arábia Saudita. Cerca de 9% dos jovens de 15 a 19 anos matriculados no ensino médio frequentam o ensino profissionalizante no país, enquanto a média da OCDE é de 40%. Chico Soares, do Inep, reconhece que é preciso mudar:
— Antes, o ensino médio servia para ir para a universidade. Agora, que o ensino médio de fato é para todos, a questão da formação técnica se coloca de forma clara, na própria Base Nacional Comum (currículo nacional da educação básica em discussão) e no PNE (Plano Nacional de Educação).
Os ‘nem-nem’
Os jovens de 15 a 29 anos que não estudam nem trabalham, conhecidos como “nem-nem”, somam pouco mais de 20% no Brasil, acima da média da OCDE, de 16%. Mas Amapá e Alagoas, com índices em torno de 30%, ficam próximos de países como a Grécia, que tem 28% dos jovens fora da escola e do mercado de trabalho. Santa Catarina (12%) e Rio Grande do Sul (14%) são parecidos com Austrália (13%) e Reino Unido (14%) nesse quesito, mostra o relatório.
Para Ernesto Faria, coordenador-especialista da Fundação Lemann, o alto índice de jovens dentro desse recorte revela uma deficiência recorrente nas escolas brasileiras.
— O ensino médio brasileiro ainda não consegue preparar o jovem para a vida e para o mercado de trabalho. Ele sai da escola e não tem um norte a seguir, não tem bagagem. Se o bom aluno já tem essa dificuldade, aquele que não estava tão interessado enfrenta ainda mais obstáculos — diz. — Mudar isso passa por uma melhora não só no ensino de disciplinas básicas, como História e Português, mas em um foco maior em ensinar os estudantes a serem mais criativos e se comunicarem melhor.
No capítulo dedicado aos professores, a publicação mostrou que os docentes da rede pública, na média da OCDE, recebem 77% do valor médio pago a profissionais com escolaridade equivalente. No Brasil, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mais recente, essa proporção é de 72%. Só na Dinamarca e Luxemburgo, de acordo com o estudo, eles têm salários similares à média das outras categorias.
As dificuldades dos docentes brasileiros também foram medidas no relatório. Seis em cada dez disseram sentir “alta necessidade” de se qualificar para lidar com alunos especiais. A proporção é praticamente a mesma verificada em 2008, de 63,2%. É também elevada a quantidade de professores (27,5%) que se ressentem de treinamento para usar recursos de tecnologia em sala de aula. Pouco mais de 6% reclamam de qualificação na própria área de ensino.
O relatório engloba dados dos 34 membros da OCDE e de mais 12 parceiros da entidade. Mas nem todos têm dados disponíveis para todas as variáveis levantadas pela OCDE. Nesses casos, só são incluídas as informações comparáveis. No Brasil, o parceiro da OCDE para a publicação é o Inep.
Fonte: O Globo
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