O setor de energia foi submetido, durante os anos do PT, a uma política pública fantasiosa, em que as regras de mercado foram deixadas de lado e a tentativa de revogar a lei da oferta e da demanda era uma meta a ser alcançada. Essas fantasias acabaram trazendo inúmeras distorções, causando uma quebradeira geral de empresas estatais e privadas e punindo os consumidores com um tarifaço em 2015 pós-eleições. Mais: trouxeram também maus hábitos e concepções equivocadas que estão aparecendo agora, na medida em que passamos a ter um governo pró-mercado, que tenta restabelecer a transparência e a racionalidade econômica no setor. Um exemplo disso foram algumas interpretações equivocadas feitas sobre o cancelamento do leilão de reserva no final de 2016.
Os críticos acusam o governo de ter pela primeira vez deixado passar um ano sem realizar leilão de energias solar e eólica. Além do mais, esse leilão, pelo fato de ser de reserva (LER), deixaria estas energias de backup, e não as fósseis, no caso da necessidade de serem acionadas. O cancelamento do leilão estaria prejudicando a indústria fornecedora de bens e serviços que está sendo construída no Brasil para atender a essas energias.
Vamos aos fatos que justificam o cancelamento do leilão. Desde agosto de 2016 havia sinais de que tínhamos uma oferta de energia bem superior à demanda, o que levaria a uma necessidade técnica de contratação de baixo volume no leilão de energia de reserva.
Isso é resultado de dois fatores. Primeiro, da dura realidade econômica do País, enfrentando há alguns anos uma das piores recessões econômicas da história. Atrelada a uma menor perspectiva de crescimento econômico, a entrada de oferta contratada em leilões anteriores já causava um excesso de oferta para os próximos anos. Isso gerou a revisão de carga (divulgada em 7 de dezembro) pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) e pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), exacerbando a sobreoferta no sistema.
As novas projeções indicam redução de cerca de 3.500 MW médios na carga de energia anteriormente prevista para 2019, ano de início da entrega da energia que seria comercializada no 2.º LER de 2016, o que corresponde a cerca de 1,5 vez a garantia física de uma usina do porte de Santo Antônio ou Jirau.
Um segundo fator que contribuiu para a decisão de cancelamento é que o Ministério do Meio Ambiente e a EPE começaram a analisar a possibilidade de usar um mecanismo de mercado para permitir a redução de montantes contratados, com um leilão para descontratação de energia de reserva. A ideia é utilizar esse mecanismo de mercado para descontratar projetos que ainda não entraram em operação comercial, reduzindo o volume de sobreoferta, o que beneficiaria o consumidor.
Ou seja, o governo toma decisões corretas para cancelar o leilão e dar transparência ao processo neste momento de sobreoferta – ao contrário de repetir erros do governo do PT, que, por exemplo, enganava os consumidores fantasiando os preços da energia sem explicar que não estavam embutidos os custos de transmissão no momento da realização dos leilões.
Outro ponto: leilão não é nem nunca será instrumento de política industrial. Além do mais, com a retomada do crescimento, o governo deverá realizar leilões A-5 em 2017. Estes, sim, demandados pelo mercado.
Devemos, sim, dar atenção especial às fontes limpas e renováveis de energia, como a biomassa, a solar, a eólica e as hidrelétricas. Entretanto, não podemos vender a fantasia aos brasileiros de que a solução da oferta de energia se dará exclusivamente por meio dessas energias e deixar de lado os critérios econômicos, que, quando abandonados, afastam investidores de qualidade e acabam penalizando o consumidor e o contribuinte brasileiro.
Acerta o governo ao respeitar as regras de mercado e deixar de iludir a sociedade com fantasias. Não pode ceder. A conferir.
Fonte: O Estado de S.Paulo, 14/01/2017.
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