O mundo dá novamente sinais de desaceleração econômica. E os bancos centrais voltaram à carga. Nada muito diferente do roteiro-padrão desde a crise de 2008. EUA e China cresceram menos que o esperado no primeiro trimestre e na Europa a recessão ainda não terminou. São sinais de fraqueza, mas que não alteram significativamente a projeção de crescimento já modesto para o mundo. Enquanto isso, mais estímulos estão sendo despejados nas economias desenvolvidas, desde a enorme expansão monetária realizada pelo Banco Central do Japão (BoJ) à queda dos juros do Banco Central Europeu (BCE), passando pelo adiamento da retirada da expansão monetária pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano). Qual o efeito dessas medidas?
Há lições sendo reaprendidas: os BCs conseguem evitar o pior – a grande depressão -, mas não trazem o crescimento sustentável de volta.
De fato, os indicadores econômicos globais mostram fraqueza, apesar dos estímulos acumulados nos últimos anos. O produto interno bruto (PIB) dos EUA deve ter crescido 2,5% anualizado com ajuste sazonal no primeiro trimestre deste ano, mas espera-se crescimento abaixo de 2% em 2013. Na China, o PIB cresceu 7,7% no primeiro trimestre, abaixo da previsão de 8%. Na zona do euro, a recessão deve se estender, com queda esperada do PIB (-0,7%) em 2013.
Quais as consequências desse persistente crescimento modesto no mundo?
O cenário é desafiador. As economias emergentes têm de crescer apesar do mundo desenvolvido, e não por causa dele, como foi na década passada. Reformas e políticas direcionadas à eficiência e à produtividade terão impacto relativo maior do que no passado.
Nesse cenário de desaceleração, alguns preços das commodities têm sofrido recentemente, especialmente os das metálicas, o que pode afetar algumas economias latino-americanas. Grandes exportadores de metais tendem a um déficit um pouco maior na conta corrente e crescimento econômico menos forte, mas devem manter o bom desempenho econômico. De forma geral, o preço das commodities continua elevado, o que ainda favorece seus exportadores.
Para estimular as economias desenvolvidas debate-se usar mais intensamente a política fiscal (mais gastos e subsídios). Mas a política fiscal está limitada pelas dívidas elevadas. Empresas e consumidores reduziram as suas, mas as dívidas públicas aumentaram como consequência. A simples recomendação de mais expansão fiscal como solução esbarra na necessidade de apresentar um plano fiscal crível de longo prazo. O plano é necessário ao menos para manter os credores – os que detêm os títulos da dívida pública – confortáveis para continuarem financiando os governos endividados. Quando os credores perdem a confiança, o ajuste fiscal vira imediato e os custos, mais altos. Nesse caso, ronda o ambiente o risco de uma reestruturação forçada da dívida (vulgo calote), com a recessão que segue. A política fiscal tem claros limites, não se pode expandir demais, pelo menos sem a compensação clara de cortes no orçamento críveis no futuro. Não é coincidência que economias com dívidas muito altas tendem a ter também crescimento menor ao longo do tempo (o famoso resultado de Reinhart & Rogoff mantém-se, apesar do “erro da planilha”, como outros estudos também mostram).
Apesar das velhas lições, os bancos centrais continuam tentando. Na ausência de uma política fiscal que possa de fato estimular as economias, no curto prazo sobra pouco mais do que tentar redobrar a aposta nos estímulos monetários.
Nos EUA, o comunicado da reunião de maio do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) do Fed já mostrou que o afrouxamento quantitativo atual deve continuar por um bom tempo, no mínimo, até o último trimestre deste ano. O BoJ anunciou em abril novo e bem agressivo programa de compra de ativos com o objetivo de estimular a economia. O programa consiste, principalmente, na compra de títulos do governo japonês e, se seguido à risca, deve quase duplicar o seu balanço – um programa mais agressivo que o do próprio Fed. O BCE respondeu à nova fraqueza na atividade com uma redução da taxa básica para 0,50%, de 0,75% em maio, e provavelmente acabará expandindo o seu balanço para facilitar o acesso ao crédito de pequenas e médias empresas dos países periféricos. Ou simplesmente cortará a taxa de juros que paga nos depósitos que recebe dos bancos, atualmente em zero, para um valor negativo, se as condições piorarem. Quem disse que não existe taxa de juros nominal negativa…?
Qual a consequência para as economias emergentes dos estímulos dos bancos centrais nas economias avançadas?
A manutenção dos estímulos monetários no mundo reforça o cenário de apreciação do câmbio e queda de juros nas economias emergentes. Mas não de forma uniforme. Depende também das condições específicas de cada país. Na América Latina há exemplos distintos. No México, por exemplo, projeta-se apreciação do câmbio e queda de juros como consequência do cenário global, mas também das reformas em curso. Na Argentina, em contraste, há uma pressão para forte desvalorização do peso, apesar das condições internacionais, em função da forte depreciação dessa moeda no mercado paralelo, da queda de reservas internacionais e dos controles de preços.
No processo de tentativa e erro dos estímulos dos BCs criam-se outras dúvidas. Qual o risco da forte expansão monetária e de juros tão baixos por tanto tempo no mundo? O principal risco é o efeito colateral do remédio monetário. Em algum momento bolhas de ativos podem formar-se, caso os investidores esqueçam a crise passada e, estimulados por juros quase zero, saiam às compras não de bens de consumo, mas de ativos mais arriscados, em busca de retornos mais elevados. Seria a receita para problemas futuros.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 07/05/2013
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