Por Rodrigo Barbosa e Carlos Ary*
A noção de Estado de Direito é muito difícil de definir e, portanto, difícil de aplicar. Pietro Costa e Danilo Zolo no livro “The Rule of Law History, Theory and Criticism” afirmam que o Estado de Direito “como tal” é uma relação peculiar entre Estado e Lei, em geral, benéfica para os indivíduos. Será utilizada desta premissa para tratar do tema nas linhas que se seguem.
O Estado de Direito é o alicerce da democracia constitucional no mundo moderno. Limita pela Lei os poderes da classe política, submetendo-a a um marco jurídico supremo e sujeitando suas decisões aos procedimentos regulados por Lei e guiados pelo respeito aos direitos fundamentais.
Não obstante, seja globalmente reconhecido como um valor fundamental, nos últimos anos a potencial deterioração e retrocesso do Estado de Direito das democracias modernas fizeram soar alguns alarmes.
Em muitas outras latitudes e longitudes globais o Estado de Direito está sob ameaça. Turquia, Hungria e Polônia – e Filipinas, para não ficar só no velho continente – autocratas, e com tribunais controlados por partidos de extrema-direita nos casos citados acima, restringem o Judiciário e ignoram os direitos humanos. Mesmo em democracias maduras, como a dos Estados Unidos, o nacionalismo ufanista vem criando ou exacerbando conflitos e tensões.
Vale ressaltar que o nacionalismo surge em diferentes orientações ideológicas, seja de esquerda ou de direita. No início do século XX o nacionalismo estava vinculado sobretudo à direita. Mas nesta era moderna do século XXI, movimentos comunistas de esquerda e anti-imperialistas também aderiram ao discurso. O nacionalismo não tem ideologia política.
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Tal nacionalismo é causa direta deste retrocesso, processo desembaraçado após a crise financeira de 2008, cuja “solução” posteriormente derivou em crises social e política ao redor do mundo. Daí estruturou-se a narrativa que esboça uma linha entre “o povo” e “as elites”, que causa tensões no status quo. Os governos nacionalistas, quando se sedimentam no poder, atacam o marco jurídico nacional, impondo restrições aos poderes jurídicos e desmantelando os instrumentos legais do país.
As tensões entre o nacionalismo e o Estado de Direito não são uniformes, mas são permanentes e ambos são incompatíveis. Tais tensões em 2018 são diagnosticadas, mas com as instituições criadas em um passado que não necessitava lidar com esse desafio, mas incapazes de resolver tal conflito. O Estado de Direito adaptado e adequadamente defendido, pode domar o nacionalismo e seus entusiastas, posto que estes não podem ser subestimados – o ufanismo precisa apenas de espaço para proliferar.
O fortalecimento das bases do Estado de Direito só ocorre com adoção de medidas efetivas, dadas as tensões evidentes e comprovadas, dadas as insuficientes ferramentas disponíveis na democracia. As ferramentas disponíveis para as democracias são insuficientes quando confrontadas com tais desafios e medidas efetivas precisam ser elaboradas para fortalecer as bases do Estado de Direito e evitar uma ascensão ainda mais rápida dos nacionalismos do século XXI.
*Rodrigo Barbosa é economista e mestre em Estudos Europeus, Carlos Ary é economista.