A corrupção está no centro das atenções – e preocupações – dos brasileiros. Neste ano, milhares de manifestantes tomaram as ruas das principais capitais do país clamando pelo combate a práticas ilícitas no poder público. Seis anos atrás, pesquisa realizada pelo Ibope já anunciava que, depois da segurança, o tema seria o problema que mais mereceria a atenção da população a partir de 2008. O próximo ano já começa com o assunto em pauta: no fim de janeiro de 2014 entra em vigor a Lei 12.846, que responsabiliza empresas públicas e privadas pela prática de atos como suborno, pagamentos de propinas e outros que tanto prejudicam o país.
A Lei 12. 846, já conhecida como lei anticorrupção, incorpora o conceito de responsabilidade objetiva das empresas, que não existe nos dispositivos legais em vigor no Brasil. Pela nova regra, basta a pessoa jurídica se beneficiar do ato ilícito para que esteja sujeita às penalidades legais. “Mesmo que a empresa envolvida alegue que não houve culpa ou dolo, caso seja beneficiada será responsabilizada e responderá a processo administrativo”, explica o Secretário de Transparência e Prevenção da Corrupção da Controladoria Geral da União, Sérgio Seabra.
Segundo o advogado Luciano Timm, especialista do Instituto Millenium, nenhuma das regras vigentes no Brasil atinge as empresas como a Lei 12.846. “De maneira geral, nem o Código Penal nem as leis de Improbidade Administrativa e de Licitações vão tão longe, em termos de consequências negativas para a pessoa jurídica, ou sequer abrangem a sua responsabilização por corrupção”, afirma.
O advogado e também especialista do Imil, Sérgio Tostes, discorda. Embora reconheça que a nova regra apresenta pontos positivos, ele acredita que, na prática, não mudará o quadro atual de corrupção. “Essa lei é um avanço porque é a primeira a colocar no papel uma norma legal determinando aquilo que seria a corrupção e sua penalização. Mas também tem muitos defeitos, pois continua sendo excessivamente lacônica quanto à especificidade do ato de corrupção”, diz.
Para Tostes, a lei protege os responsáveis pelas empresas ao afirmar que “o dirigente e administrador só será responsabilizado por atos ilícitos na medida da sua culpabilidade”. “O certo seria o dirigente ser sempre responsável. Sob esse aspecto, essa lei cria um verdadeiro escudo de proteção para que os responsáveis possam se furtar a pagar pelo que foi feito”, explica, acrescentando: “Esse parágrafo é a materialização daquilo que já é usual no Brasil: ‘Eu não sabia logo não sou culpado’”.
Timm faz outra leitura da mesma lei. “Ainda que um empregado cometa um ato de corrupção sem a concordância ou o conhecimento da empresa, e tal ato tenha revertido danos à administração pública, nacional ou estrangeira, a pessoa jurídica será responsabilizada por tal conduta”, explica. Na prática, a lei 12.846 pode ser aplicada a casos de corrupção praticados por pessoas jurídicas contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
Neste sentido, a lei anticorrupção cobre uma lacuna da legislação brasileira. Atualmente, para punir uma empresa é preciso comprovar que ela teve conhecimento e obteve vantagem proveniente de algum ato ilícito cometido por um funcionário. “A criminalização ‘está muito em cima’ do servidor público e da pessoa física. A lei [12.846] inova, pois a criminalização se dará sob a pessoa jurídica”, diz Seabra, acrescentando que a norma ainda cumpre o papel de responder às cobranças da comunidade internacional pelo combate à corrupção no país. “Ela faz parte de um compromisso assumido pelo Brasil em convenções internacionais e na OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico]”.
Empresas estão se preparando para a nova lei
Penalidades duras
A nova norma será mesmo capaz de reduzir os casos de corrupção no Brasil?
Isso é um grande avanço, como a pessoa jurídica será penalizada, os donos e dirigentes “honestos” teriam de cobrar mais transparência por parte dos sócios e funcionários, no intuito de evitar práticas ilícitas que (caso descobertas) iriam prejudicar a empresa. Mas deveria haver uma cláusula que proíba empresas previamente envolvidas em “falcaruas” de particpar de licitações públicas ou de prestar serviços para o Estado.