Tramitam no Congresso Nacional dois projetos de lei, um na Câmara dos Deputados e outro no Senado. O processo legislativo na Câmara dos Deputados teve inicio em junho de 2011, quando foi apresentado pelo PT o PLC Lei nº 1572. No Senado, por intermédio de proposta oferecida por Renan Calheiros (PMDB), presidente da Casa, tramita o PLS 487/2013.
Tais projetos marcam a tentativa de se recodificar o Direito Comercial brasileiro. O objetivo é, em tese, modernizar as relações empresariais por meio de uma norma jurídica que atenda às demandas do mundo econômico contemporâneo.
Surgiram duas posições a respeito do Projeto, a saber: críticos à ideia de um novo Código afirmam que, em face do dinamismo das relações comerciais, seria mais adequada a revisão pontual da legislação. Noutro giro, há quem defenda a elaboração de novo Código, ao argumento de que se faz necessária uma ampla revisão sistemática do tema. Tal metodologia tornaria mais fácil o regramento e interpretação da matéria.
Como liberal, evidentemente que me filio à primeira posição, ou seja, sou contrário a adoção de um novo Código Comercial. Hoje, a matéria comercial se encontra espalhada em várias leis, contudo, guarda certa coesão. Mudar de uma só vez as regras jurídicas que regem os negócios, unificando-as em um Código, é algo que vejo com grande reserva. No Brasil, as mudanças costumam ser para pior. O legislador sempre inventa uma forma de intervir ainda mais. Sempre há espaço para colocar um artigo aqui ou acolá que fale em “justiça social”, “dignidade da pessoa humana” ou, ainda, “função social da propriedade”.
A edição de uma nova codificação pode parecer um avanço ao espectador mais desavisado, todavia, tal Código significa um grande volume de novas intervenções no funcionamento da economia e das sociedades comerciais, o que inevitavelmente provoca novas áreas de tensão e incerteza.
A adoção de um novo Código, trará, quero crer, mais insegurança jurídica que garantias aos empresários, empreendedores e investidores, vez que dúvidas interpretativas acerca do marco legal tendem a ampliar sobremaneira os custos de transação enfrentados pelos dos agentes econômicos.
A elevação dos riscos desestimulam as trocas comerciais e toda a atividade econômica se ressente desse tipo de acontecimento. Em verdade, a mera expectativa de um novo Código já reverbera na decisão dos agente econômicos.
Analisando os retrospectos do Código de Defesa do Consumidor (1990) e do o Código Civil (2002), verifica-se que os tribunais brasileiros precisam, em média, de oito anos para consolidar um entendimento acerca de determinado tema. Qual o custo econômico e financeiro disso? Em uma economia fragilizada como a nossa, isso é viável ou desejável? Em suma: os benefícios compensam os riscos e os custos? Parece que não.
Um novo Código Comercial certamente gerará desestímulo aos investidores, pois com ele amplia-se a trama burocrática que amarra o ambiente de negócios. Ademais, na medida em que o pensamento jurídico brasileiro, tanto acadêmico quanto judicial, é predominantemente estatizante, o nosso cenário econômico, que já é ruim, pode piorar sensivelmente.
A discussão jurídica no Brasil perdeu a racionalidade e assumiu despudoradamente tonalidades messiânicas. Tribunais e juristas não se cansam de apontar eventuais “falhas de mercado”, todavia, em uma espécie de cegueira seletiva, parecem não ver das reiteradas catástrofes geradas pela intervenção governamental.
O que faz uma boa lei comercial, ou seja, o arsenal jurídico que realmente gera prosperidade econômica é a capacidade de assegurar, da forma mais clara possível, a autonomia privada, a força obrigatória dos contratos, a livre iniciativa e a livre concorrência, a liberdade de anunciar, o respeito irrestrito pela propriedade privada, e assim sucessivamente. São, em síntese, as clássicas garantias negativas.
Entretanto, vivemos em um país semisocialista e, por força da Constituição de 1988 e de todo o processo político que se desenvolveu a partir de então, as garantias liberais são facilmente flexibilizadas, bastando sacar-se do bolso do colete do interprete algum “principio” social. O Brasil se tornou um país liberticida, pois quanto a liberdade colide com qualquer outro “princípio social”, este, invariavelmente, será privilegiado em detrimento da liberdade.
A burocracia é o grande desafio enfrentado pelos empresários que pretendem investir no Brasil. A mentalidade predominante é hostil ao lucro, é indócil com o empreendedor. Aqui tudo é difícil, o “custo Brasil” é imenso, pois a carga tributária é absurda, as obrigações trabalhistas proibitivas, as exigências consumeristas exageradas, o direito administrativo despótico, isso, sem contar nos demais fatores que inibem o progresso, como carência de infraestrutura, apagão de mão de obra, etc. Enfim, temos leis demais e prosperidade de menos, a conta não fecha.
No Brasil não se acredita que a economia seja regida pela lei da escassez. Por aqui se tem a firme convicção de que tudo se resolve por canetadas governamentais, que é possível aumentar o salários e a renda per capta por ato de vontade política, que o patamar de juros é uma questão de bondade ou maldade e, ainda, que a realidade pode ser plasmada pela lei engendrada pelo burocrata. Em suma, aqui o governo parece desconhecer a velha máxima segundo a qual “não existe almoço grátis”.
Ademais, um novo Código Comercial, quero crer, não é capaz de, sozinho, modificar nosso ambiente de negócios. Nosso problema é de mentalidade. O empreendedorismo e a meritocracia são mal vistos na cultura brasileira, regida secularmente pelo compadrio, pelos favores, pela escolha dos campeões e pelo peculiaríssimo “jeitinho” brasileiro. A desburocratização e a melhoria da vida empresarial não estão necessariamente vinculadas a edição de um Código.
Fonte: Instituto Liberal, 21/5/2014
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