O cenário político e econômico global dos últimos anos, em linhas gerais, deverá manter-se em 2018. A instabilidade política e as incertezas na economia deverão continuar a ser algumas das referências mais significativas dos formuladores de decisão em todos os países.
O Grande Oriente Médio permanecerá como um dos principais focos de atenção pelo acirramento das tensões entre Israel e palestinos em razão da decisão do governo de Washington de considerar Jerusalém a capital de Israel e pelo fim dos conflitos na Síria e no Iraque e o início da reconstrução desses países. A situação interna na Arábia Saudita, a rivalidade com o Irã e a guerra com o Iêmen, além da contestação política contra o governo de Teerã, são elementos adicionais que a qualquer momento podem perturbar nas relações internacionais.
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O programa balístico e nuclear da Coreia do Norte, contestado abertamente pela comunidade internacional liderada pelos EUA, é o único exemplo em que a eventual perda de controle da situação poderá significar uma ameaça de guerra nuclear, pela imprevisibilidade das reações de Donald Trump e Kim Jong-un.
O comportamento errático de Trump em relação à Rússia de Vladimir Putin e à China de Xi Jinping, ambos com projetos de ocupação de maiores espaços globais, acrescenta incertezas geopolíticas, sobretudo à luz da nova doutrina americana de segurança nacional, que considera esses países como inimigos. A economia dos EUA deve crescer em virtude das medidas econômicas da administração republicana, enquanto não ficar claro se o equilíbrio macroeconômico será prejudicado pela redução dos impostos e pelo prometido aumento nos gastos públicos com programas de infraestrutura.
As negociações sobre a saída do Reino Unido da União Europeia (UE), as turbulências na Espanha pelo movimento de independência na Catalunha e os primeiros sinais de contestação a Angela Merkel não deverão afetar a posição de realce da Alemanha, nem a lenta recuperação econômica no continente europeu.
A América Latina, que terá um ano político agitado, com eleições no Brasil, no México, na Colômbia, na Venezuela e na Bolívia, poderá beneficiar-se do crescimento econômico e comercial global. A Venezuela, apesar de dispor de reservas de petróleo das maiores do mundo, seguirá em crise profunda, com risco de suspender o pagamento de suas dívidas, em especial as da PDVESA, evitado até aqui pelo substancial apoio financeiro recebido da China e da Rússia. As próximas eleições acentuarão o predomínio de um partido único e o reforço do poder militar, transformando a Venezuela num regime ditatorial de modelo cubano. Dependendo dos resultados das eleições no México e no Brasil, a América Latina poderá contribuir poderosamente para as incertezas e a instabilidade do cenário global. No México, caso fracassem as negociações com os EUA e termine o acordo do Nafta, as chances de sucesso do candidato de esquerda López Obrador aumentarão, o que introduziria um elemento novo nas relações com Washington.
O fundamentalismo religioso, o terrorismo e o crescente nacionalismo, com maior intervenção do Estado, ao redor do mundo, continuarão a ser focos de instabilidade. A crise das instituições multilaterais, perdendo representatividade dada a emergência de novos polos de poder econômico e político, não esmorecerá. Banco Mundial e Fundo Monetário começam a sofrer a competição de novas organizações, como o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura e o Novo Banco de Desenvolvimento do Brics. A Organização Mundial de Comércio, contestada diretamente pelo governo norte-americano, deve sofrer mudanças profundas durante 2018, correndo o risco de perder o último de seus pilares, o órgão de apelação que dirime controvérsias comerciais entre os países-membros.
Nas negociações comerciais, consequências importantes poderão surgir diante do questionamento pelos EUA dos acordos com o México e com o Canadá no âmbito do Nafta, assim como a entrada em vigor da Parceria Transpacífica, sem os EUA, e dos mega-acordos da UE com o Japão e o Canadá. Os entendimentos do Mercosul com a UE poderão ser concluídos durante o ano, mas o acordo só deverá ser assinado depois de 2019.
Em termos da nova geopolítica global, continuarão a ter relevância os processos de globalização, de fortalecimento regional e os progressos na inovação e tecnologia. Nas três áreas, a China continuará a expandir-se e a ocupar espaços preenchidos até aqui pelos países desenvolvidos ocidentais.
Em 2018 será mantida a crescente importância dos temas globais (antigos e novos), como recursos naturais, meio ambiente, mudança de clima, democracia, envelhecimento populacional e guerra cibernética. A inovação na ciência e tecnologia (digital, robótica, biotecnologia, internet das coisas, inteligência artificial) ampliará seu papel estratégico no mundo corporativo e governamental, pelas rápidas e profundas transformações que acarretará.
O Brasil – que nos últimos 15 anos se isolou dos fluxos dinâmicos da economia internacional – continuará reativo ao que acontece no mundo, até pelo desaparecimento das fronteiras entre a agenda externa e a política interna macroeconômica, industrial e de comércio exterior, com crescente impacto na formulação dessas políticas. A recuperação gradual da economia poderá beneficiar-se do crescimento mundial de mais de 3,5%.
As eleições presidenciais neste ano representarão um divisor de águas para as próximas gerações. Se o novo presidente decidir executar uma agenda de reformas modernizantes, o País voltará a ter voz no cenário internacional e a se inserir de forma competitiva na economia e no comércio internacionais. Caso contrário, a crise fiscal adquirirá as características da Grécia. Triste destino para o Brasil.
Fonte: “Estadão”, 09/01/2018
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