Mais uma vez, alguns intervencionistas empedernidos estão querendo “reinventar” o capitalismo, com a desculpa esfarrapada de sempre: “salvá-lo” das garras dos socialistas.
O presidente Emmanuel Macron e seu ministro das Finanças, Bruno Le Maire, estão usando a Presidência da França no G-7 para argumentar que o sistema capitalista alimenta a desigualdade, destrói o planeta e é ineficaz em cumprir metas de interesse público.
Macron e Le Maire, que não por acaso encontram-se às voltas com a rebelião dos “coletes amarelos”, estão promovendo uma agenda que inclui tributação global mínima e impostos mais altos para gigantes da tecnologia, como Apple, Google, Amazon e Facebook. “Se não inventarmos um novo capitalismo, soluções econômicas absurdas vão ganhar força e nos levarão à recessão”, disse Le Maire, em entrevista no fim de fevereiro. Como exemplo, cita a ascensão de políticos esquerdistas com idéias socialistas radicais, como Alexandria Ocasio Cortez, nos Estados Unidos.
Foi Marx quem deu nome de capitalismo ao modelo de organização econômica baseado na liberdade natural, de que falava Adam Smith. Para horror de Marx, entretanto, o capitalismo não foi criado por nenhuma mente brilhante, interessada em mudar o mundo ou a natureza humana. Ao contrário, foi o resultado natural dos processos sociais de divisão do trabalho e trocas voluntárias, realizados num ambiente de liberdade até então poucas vezes visto ao longo da história.
Leia mais de João Luiz Mauad
Os números desmentem a teoria protecionista de Trump
Sobre hinos e patriotismos
O retrato de um país
Os economistas clássicos chamavam-no de laissez-faire. Nesse processo, governo era um mero coadjuvante, cujo papel limitava-se a fazer cumprir os contratos, proteger a vida e a propriedade dos cidadãos. As maiores virtudes desse modelo, na visão de Adam Smith, eram a liberdade de empreendimento e o governo limitado – este último um antídoto contra as arbitrariedades, os desmandos e as falcatruas inerentes ao poder político.
O caminho para a riqueza de uma nação é bem simples, como ensinava Smith. Dê às pessoas o incentivo para trabalhar duro, inovar e assumir riscos. Todos os países ricos – aqueles onde até mesmo as pessoas mais pobres são relativamente ricas – praticam o Estado de Direito, têm a propriedade privada segura, fronteiras relativamente abertas ao comércio e mercados relativamente livres internamente.
Os economistas clássicos e outros cientistas sociais intuíram, há bastante tempo, que a grande maioria dos humanos age prioritariamente na busca de seus próprios interesses, contando para isso com as informações que muitas vezes somente cada um detém. Esta suposição é a base de grande parte do conhecimento econômico, desde Adam Smith.
Por seu turno, os intervencionistas assumem em suas análises que eleitores e funcionários do governo, diferentemente dos demais seres humanos, são motivados exclusivamente pelo interesse público, e não por seus interesses particulares. Em outras palavras, a mesma pessoa que, no âmbito privado, agiria no sentido de buscar seu próprio bem estar, seria ungida com a sabedoria infinita no momento de votar, ou com o conhecimento enciclopédico e o desapego total pelos seus próprios interesses, quando empossado em algum cargo público.
A consequência infeliz dessa verdadeira esquizofrenia é uma ingênua e quase ilimitada confiança no governo. Ora, como quaisquer mercados sempre serão imperfeitos, os crédulos e os oportunistas, cada um ao seu modo, dedicam-se a tentar construir modelos econômicos onde o governo pode corrigir eventualmente qualquer problema.
A questão por trás dos devaneios de gente como Macron e Le Maire, é: por que tolerar uma realidade cheia de imperfeições se você pode contar com os bons préstimos de autênticos deuses, onipresentes, oniscientes e dotados de infinita sabedoria?
O problema é que, como já advertia Adam Smith, as ingerências do governo costumam produzir efeitos nefastos na economia. Quanto mais os deuses e seus ungidos interferem no mercado, desvirtuando os seus sinais e a alocação eficiente dos recursos, menos apta estará a economia para produzir riqueza real. Volumes crescentes de recursos serão desviados do seu destino natural – sejam através de novos tributos, subsídios ou outros incentivos – e alocados em maus investimentos.
Como ensinou Hayek, toda vez que os governos resolvem interferir na dinâmica complexa dos mercados, estes perdem um pouco da sua eficiência. Por mais bem elaborados, os planos governamentais costumam falhar, basicamente, porque as pessoas têm necessidades e preferências e necessidades tão diferentes quanto difusas, as quais a ninguém é dado conhecer com precisão.