A morte de Hugo Chávez ocorrida ontem, dia 05 de março, chama a atenção por diversos fatores, mas, especialmente, pelo desafio que impõe a praticamente inexistente democracia Venezuelana. Já de há muito tempo, Winston Churchill avisara que: “A democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos” [“Democracy is the worst form of government except from all those other forms that have been tried from time to time”, em 11 de novembro de 1947], contudo, também advertiu que era a forma de governo que mais demandava vigília por ser mais facilmente usurpável por déspotas esclarecidos, ou nem tanto. Triste humanidade que não consegue aprender com sua trajetória histórica.
O que mais me surpreendeu nas reações à morte de Hugo Chávez em nosso país, não foram as manchetes ou a presidente se manifestar tão condoída, afinal não é de hoje que temos conhecimento que são alinhados politicamente em nível ideológico, portanto, era lógico isso, mas foi a quantidade de “viúvos”, e, “viúvas” do líder Venezuelano em nosso país na população mesmo, e, ainda mais a insistente classificação dele como um democrata, tendo em vista haver sido eleito e reeleito “legitimamente” por seu povo. Frente a isso, impossível não lembrar de Churchill e sua advertência do quanto os mecanismos democráticos podem ser utilizados para se traírem quando mal utilizados. Voltemos, rapidamente ao início da década de trinta.
Em março de 1933 foram convocadas eleições para o “Reichstag”, o Parlamento Alemão, e, nessa ocasião o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, o Partido Nazista, obteve 44% dos votos, naquela que seria a última eleição livre da Alemanha antes da 2ª Guerra Mundial. Hitler havia assumido o cargo de Chanceler do país em 30 de janeiro de 1933 perante o “Reichstag”, e, após isso, passa a se mobilizar para tomar controle do país. Logo ele consegue a “Lei de Aprovação do Governo” que lhe confere poderes ditatoriais, passa a suprimir a oposição, passa a controlar a liberdade de expressão, controlar a imprensa, dentre outras atitudes. Com a morte do Presidente da Alemanha, Hindenburg, em 02 de agosto de 1934, Hitler funde os dois cargos, de Chanceler e Presidente, com a anuência do Parlamento pela nova legislação, e passa a se denominar “Führer” (“Líder”). Está pavimentado o caminho para tudo que foi visto na 2ª Guerra Mundial. Ele chegou ao poder pelos meios democráticos e legítimos, todavia, alguém consegue justificar, sob qualquer argumento, os atos do líder em questão?
Facilmente, alguns irão argumentar, mas o Chávez é diferente. Onde? Iniciou sua trajetória política tentando um golpe de estado em que fracassou, tendo sido preso por dois anos. Após isso, foi eleito pelas vias democráticas em 1998, democracia essa que ele simplesmente abandonou após se mostrar útil, visto que, a partir do momento que foi eleito simplesmente passou a tomar as medidas possíveis para se perpetuar no poder. De imediato gestionou para alterar a Constituição para ampliar o prazo do mandato presidencial, o que conseguiu, para seis anos.
Os embates iniciados por ele próprio fizeram com que, em 2002, o empresário Pedro Carmona se declarasse presidente em um golpe com o apoio das forças militares que forçaram a saída de Chávez do Palácio de Miraflores que recebeu o imediato reconhecimento do Governo dos Estados Unidos, e, que produz dores de cabeça e a crença de que esse país “financiou” o golpe na Venezuela. O golpe fracassou e dois dias depois Chávez estava de volta ao Palácio. Esse episódio lhe rendeu muitos dividendos políticos, tanto que conseguiu modificar a Constituição para garantir todas as reeleições que necessitou até sua morte.
Seu último ato foi justamente na pirotecnia que cercou sua morte, tendo em vista que seu último dia de vida tem alguns pontos curiosos. Afora o fato de o vice-presidente fazer a acusação de que o Governo dos Estados Unidos teria, supostamente, agido de alguma forma para provocar a doença do presidente Chávez, tem ainda a curiosa coincidência de datas com o aniversário de morte do ícone socialista Josef Stalin, visto que, nessa data, 05 de março de 2013, fizeram exatamente 60 anos da morte de Stalin. Uma morte no presente, no aniversário de morte de um ícone socialista do passado que pode comprometer o futuro de um país inteiro, preocupante isso. Costumo afirmar que o presente é o passado do futuro, pois só nossos atos agora modificam o futuro, logo me preocupa esse tipo de coincidência.
Portanto, a Venezuela se encontra em um severo desafio democrático pelos próximos dias, porque, Constitucionalmente deve convocar novas eleições em 30 dias, contudo o poder está nas mãos do Vice-Presidente Nicolás Maduro, tendo em vista que havia sido dada posse ao presidente. Pela Constituição, quem deve assumir é o presidente da Assembléia Nacional, Diosdado Cabello, entretanto, nos próximos dias, deve se pronunciar o Tribunal Supremo de Justiça. A urgência das Forças Armadas em manifestar sua lealdade ao governo é preocupante, pois existe uma ordem constitucional no país que prevê novas eleições, e, essas devem ser cumpridas. Logo, cumpre a todos que veneram o conceito de democracia lembrar das sábias palavras de Churchill do quão frágil a democracia pode ser e vigiar, pois, nesse momento ela corre tanto, ou mais risco, quanto antes.
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