Historicamente o Brasil teve um mercado de capitais pouco desenvolvido, particularmente para títulos privados, notadamente os corporativos. Inflação e juros elevados, o deslocamento dos papéis privados pelos títulos públicos, uma institucionalidade que deixava a desejar em termos de transparência e garantia dos direitos de credores e acionistas minoritários, tudo isso contribuiu para essa atrofia.
Desde meados dos anos 1990, porém, esse quadro vem mudando, com avanços notáveis em todas essas áreas problemáticas. Isso levou a uma significativa expansão do mercado de ações e, mais recentemente, no de títulos de dívida corporativa.
Em meio a essas mudanças, os dois principais provedores de serviços de infraestrutura no mercado de títulos privados, a BM&FBovespa e a Cetip, também passaram por reformas importantes: as duas se tornaram empresas, lançaram suas ações na bolsa, estabeleceram parcerias com entidades no exterior e promoveram avanços significativos nas suas plataformas de tecnologia.
Em comparação com outros setores que também passaram por mudanças profundas, as do setor de serviços de negociação e pós-negociação de títulos privados foram relativamente modestas. Compare-se, por exemplo, com o que aconteceu nos setores de infraestrutura, onde também prevaleciam estruturas verticalizadas e uma fronteira pouco clara entre o que era função regulatória e atividade comercial. Ou mesmo com os bancos públicos estaduais, também fundamentais para a saúde do sistema financeiro, e hoje quase todos privatizados. Em todos esses setores houve a clara separação do que era atividade comercial e função regulatória, a quebra vertical das atividades e a preocupação em instituir competição onde possível.
Pode-se argumentar que faz sentido as mudanças nas empresas de infraestrutura do mercado de capitais terem sido menos dramáticas. Por exemplo, por que elas já eram privadas não fazia sentido falar em privatização. Além disso, elas prestam algumas atividades de natureza semi-pública que são importantes para a solidez do sistema financeiro nacional e algumas de suas operações têm características de monopólio natural. Tudo isso gera um trade off entre os ganhos de eficiência que podem ser obtidos com a concorrência e os riscos que esta cria.
Até que ponto, porém, é possível e desejável avançar mais nas reformas desse setor e, em especial, aumentar a competição nesse mercado? Essa questão foi colocada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), no contexto do mercado de ações, para estudo da Oxford Economic Research Associates (Oxera).
O estudo chegou a três conclusões principais. Primeiro, o mercado brasileiro já é maduro o suficiente para que possa haver mais competição na provisão desses serviços, especialmente de plataformas de negociação. Não obstante, não é claro se a simples autorização para outros provedores de serviços entrarem no mercado será suficiente para estabelecer essa concorrência, especialmente se esses não desenvolverem as atividades de negociação e pós-negociação de forma integrada.
Segundo, os grandes ganhadores seriam os investidores que usam esses serviços e o principal perdedor a BM&FBovespa. Os corretores e a própria CVM também incorreriam em custos adicionais que, pode supor-se, seriam transferidos aos investidores, reduzindo seu ganho. No todo, porém, o ganho de uns é a perda dos outros, de forma que o ganho líquido é nulo ou pequeno. Não obstante, há grande incerteza sobre essas estimativas, que dependem significativamente das premissas adotadas.
Terceiro, alguns dos benefícios que poderiam ser gerados com o aumento da concorrência seriam alcançáveis com mudanças regulatórias. Isso, porém, é mais fácil de conceber na teoria do que realizar na prática.
No todo, portanto, o estudo da Oxera, apesar de muito informativo, joga a questão de volta para a CVM. Esta vem tendo uma saudável atitude de questionar se as atuais estruturas de mercado são as melhores para o país, mas dificilmente se animará a provocar mudanças radicais com base nas análises disponíveis.
A inércia, porém, também não é uma possibilidade. O mercado brasileiro de títulos corporativos vai crescer em ritmo acelerado nos próximos anos, com a queda dos juros, a expansão da economia e o lançamento de ações e títulos de dívida por um número crescente de empresas. A atratividade desse mercado se revela no preço das ações da BM&FBovespa e da Cetip, mas também no interesse de outras empresas em nele entrarem.
Assim, duas bolsas estrangeiras, a Direct Edge e a BATS, já deram os primeiros passos nesse sentido. A Cetip também já solicitou à CVM autorização para funcionar como contraparte central, de forma a operar como bolsa de derivativos. Com isso torna-se uma aquisição cada vez mais atraente para uma bolsa estrangeira que queira aqui instalar-se. Numa raia mais modesta, mas não menos sintomática, está em instalação a Bolsa Verde do Rio de Janeiro, que negociará ativos ambientais, para o que também precisará de autorização da CVM. Esse tema continuará em pauta.
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2012
Certamente está mais do que na hora de instalar uma concorrente para Bovespa, acredito que a mesma já não suporta o aumento gradativo de abertura de capital que veem acontecendo, diante disso aceitaria muito se constitui-se uma bolsa para os minoritários, fazendo com que não existisse mais a deslealdade como veem acontecendo.