Entre 2005 e 2012, a economia mundial vivenciou um importante boom de commodities, gerado pelas elevadas taxas de crescimento econômico da China, que, no período, atingiu 12,5% ao ano. Os preços das commodities dispararam no mercado internacional (carne, soja, minério de ferro, petróleo, etc.). Sendo o Brasil um dos maiores produtores mundiais desses bens, foi um dos principais beneficiários deste processo.
O aumento dos preços dos bens produzidos e exportados pelo País resultou em aumento da renda dos setores exportadores, que se espalhou por outros setores da economia via aumento da demanda por bens e serviços produzidos e consumidos internamente. Com o aumento da demanda, caiu a taxa de desemprego e o rendimento real do conjunto dos trabalhadores aumentou.
Esse processo foi acompanhado por uma política de aumento do salário mínimo real, que teve início com a estabilização, em 1994, foi aprofundada a partir de 2008 e transformada em lei em 2011. Segundo esta lei, que expirou no início de 2019, o reajuste do salário mínimo não poderia ser inferior à taxa de inflação do ano anterior mais a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes, desde que positiva. Entre 1994 e 2018 o salário mínimo real quase triplicou (aumentou 165%).
Leia mais de José Márcio Camargo
Herança maldita
Racionalidade no gasto com justiça social
Existe uma regra básica em Economia que diz que uma empresa somente contrata um trabalhador se o valor do produto por ele gerado for igual ou maior que o custo de contratá-lo. O valor do produto gerado pelo trabalhador é igual a quanto ele produz por unidade de tempo (a produtividade), multiplicado pelo preço do produto. Já o custo de contratá-lo é igual ao salário pago mais os encargos sociais incidentes sobre este salário. Caso desrespeite essa lei, a empresa caminhará para a falência.
Enquanto o aumento dos preços das commodities e da renda do setor exportador fazia com que o valor do produto gerado pelos trabalhadores menos qualificados e menos experientes (os jovens) se mantivesse acima do valor do salário mínimo – o que economistas denominam um deslocamento da curva de demanda por trabalho –, o aumento do salário mínimo real teve pouco efeito sobre o mercado de trabalho.
A crise financeira de 2008, a desaceleração da economia mundial, em especial da economia chinesa (cujo crescimento caiu para 6,5% ao ano), gerou redução nos preços das commodities e do valor do produto gerado pelos trabalhadores destes setores. Da mesma forma que ocorreu durante o boom, mas em sentido contrário, este movimento gerou forte diminuição da renda e da demanda internas.
A tentativa de contrabalançar este processo por meio do aumento do déficit público gerou uma explosão da dívida pública, levou o País à beira da insolvência e forçou um ajuste fiscal que gerou a pior recessão da história. O desemprego passou de 6,7% para 13,7% da força de trabalho.
+ Odemiro Fonseca: O desafio previdenciário
Com o aumento do salário mínimo real e a queda dos preços das exportações, o valor do produto gerado pelos trabalhadores menos qualificados e pelos mais jovens e inexperientes caiu abaixo do salário mínimo, forçando as empresas a reduzir as remunerações desses trabalhadores ou demiti-los.
Atualmente, quase 50% dos trabalhadores ocupados têm remuneração menor que o mínimo. Não apenas a taxa de desemprego e a proporção de empregos sem carteira assinada nestes grupos é muito maior que a média do País, assim como, na retomada, estes trabalhadores ou permanecerão por mais tempo desempregados ou somente conseguirão empregos sem carteira assinada, com salário menor que o mínimo e que não pagam encargos sociais. Revogar a lei do salário mínimo não vai resolver, mas, pelo menos, para de piorar.
Fonte: “Estadão”, 11/05/2019