A satisfação faz com que pobres tornem-se ricos, mas a insatisfação faz com que ricos sejam miseráveis. Glenio Paranaguá, “A oliveira enflorada”.
Sob o nome de “distribuir Justiça” na relação de trabalho, o Estado brasileiro acaba por semear cobiça – um combustível humano perverso. Há diferença entre cobiça e ambição. Esta é legítima e aceitável porque civilizada e aparentemente governável, enquanto aquela não. É civilizado o mecanismo estrutural de uma lei – portanto ético, que faça emulação social para a conquista pelo trabalho – alcançam-se mais riquezas e satisfação social. O animus da cobiça, tão precioso para sua lei e para o corporativismo estatal e sindical, é o que mais se aproxima da “corrupção”, e a atrai. Esta é uma guerra tola – porque interna –, divide a sociedade e retém o País historicamente “assolado”, esperando um futuro que não chega. “Todo o reino, dividido contra si mesmo, será assolado; e a casa, dividida contra si mesma, cairá.” (Lucas)
Montesquieu explicou que a lei deriva da natureza das coisas. Em certo momento da História, a natureza da relação de trabalho era escravocrata, e em outro era conflituosa. No Século XXI ela é necessariamente convergente. “Essa é uma contradição que somente pode ser plenamente compreendida quando tomamos consciência de que o capitalismo é portador de uma vigorosa virtude – a virtude da transformação”, reconhece o Ministro Eros Grau, ainda chamando de “capitalismo” esta coisa tão em desuso quanto socialismo. De qualquer modo, o espírito da lei trabalhista está desatualizado, definitivamente. E “as leis realizam pouco sem o espírito das leis.”
A Constituição tem estas idiossincrasias caipiras, “queijos” que devem ser mexidos (numa referência ao livro de Spencer Johnson – “Quem Mexeu no meu Queijo”) para uma necessária mudança das mentes estereotipadas dos brasileiros, e também para melhorar o ambiente de negócios e o conceito de progresso no Brasil. Não é a “justiça trabalhista” quem fará este avanço. Mas é ela quem faz o atraso. É preciso que os “trabalhistas” entendam, ousem pensar no conceito global de stakeholder – em tradução livre, “titular de uma participação” no empreendimento, como contraponto ao tradicional funcionário-oponente potencial – este o estimulado e cativo “mercado” dela. Suas premissas estão superadas – as de que o trabalhador é alguém juridicamente incapaz de contratar e por isso precisa ser tutelado. Agora já passou da hora de dar ao “trabalhador” brasileiro a autonomia da cidadania e liberá-lo desta “proteção” maniqueísta e pernóstica. Afinal, ele é um atuante partícipe da empresa, para que sejam ele e ela bem sucedidos, ou mero oportunista? Colaborador ou permanente fronteiriço entre a servidão e a rebelião?
O “judiciário trabalhista” é a “superestrutura jurídica e política” de que fala Marx em seu Manifesto – “… o sistema moral predominante, em oposição ao sistema legal, não imposto, mas sancionado por uma ideologia criada e controlada pelas classes dirigentes.” E isto não tem mais lugar em um País que quer ser desenvolvido. É este o espelho da oposição explícita e frontal do Brasil à paz e agregação social, ao desenvolvimento humano e ao empreendedorismo. “De acordo com Marx, o estado é um órgão de dominação de classe, um órgão para opressão de uma classe pela outra; seu alvo é a criação de uma ‘ordem que legalize e perpetue essa opressão’… afirmou Lênin. Popper tem andado com razão ultimamente.
Este tempo já passou, mas segue sendo uma bandeira fincada no território brasileiro, anunciando o padrão de entendimento nacional quanto à iniciativa privada, à empresa, ao espontâneo espírito empreendedor que acompanha a juventude; ao capital produtivo e às demais equações primárias que impulsionam a civilidade, inclusive esta – a relação entre as pessoas que pagam salário e as que recebem, por trabalhar.
No Brasil nós fazemos discriminação entre pessoas por imposição do Estado e da lei. Inobstante, as “classes” já entenderam que é necessário confluir, que o emprego é um desejo natural – promover, quem o possa, e obter, quem o alcance. Que não é produto artificial do corporativismo, mas resultado natural da liberdade econômica. “O corporativismo social está positivamente relacionado a uma série de recursos de proteção social, mas é o principal mecanismo institucional potencialmente negativo que embota os impactos o bem-estar no processo de internacionalização.” (Swank)
Este artigo coloca o Poder Judiciário “trabalhista” como o grande obstáculo à evolução da cidadania e, por isso, certamente será duramente atacado por quem o ler. Mas a opção agora é falar, reclamar, não mais conformar-se, tampouco sair – a “opção econômica”, na expressão de Dahrendorf. Reclamar como cidadãos brasileiros a partir do ideário da liberdade, dos padrões de evolução da nação brasileira e dos padrões internacionais de democracia e de mercado. Não sair e evitar que outros saiam e levem seu dinheiro; sobretudo hoje, tentar evitar que outros não venham nem tragam seu dinheiro.
Qualquer observador percebe a grande anomalia e a contradição dos números aqui apontados – dados “trabalhistas” x dados econômicos. Um País cuja população é de 190 milhões de habitantes e menos da metade economicamente ativa, crescimento econômico histórico médio abaixo de 2% ao ano, PIB constante e proporcionalmente baixo, renda per capita histórica baixíssima e 113ª posição (e piorando) no ranking mundial de liberdades econômicas, e simultaneamente contabilizando seis milhões de ações trabalhistas em curso por ano, tem algo de muito errado. Há uma guerra civil dissimulada e covarde por aqui, patrocinada pela máquina estatal e pelas minorias corporativas.
Se a mãe da corrupção é a burocracia, no Brasil o Poder Judiciário “trabalhista” é o seu pai (a instituição). Não se trata de seus membros ou da corrupção banal, mas desta monstruosa máquina destruidora de valores fundamentais para a sociedade, tais como a verdade, a justiça e a cidadania – no sentido da plenitude da capacidade civil de contratar. É a única do mundo com tamanha infra-estrutura para fiscalizar a atividade humana mais nobre – o trabalho. Proporcionalmente é maior que as forças de segurança do País. É uma corporação exótica sob qualquer ponto de vista cultural – na América, na Europa ou na Ásia. Aqui mesmo já é anacrônica, desnecessária e perniciosa, tal como se apresenta. É o emblema do tributo inútil – de tudo o que impede o Brasil e os brasileiros de crescerem muito mais e melhor.
Toda corporação enxerga pelo viés corporativo de seu interesse. Mas é da reforma do Estado que precisamos agora, e nesta fila de reformas é preciso reconhecer que o Poder Judiciário “trabalhista” brasileiro é uma das maiores excentricidades conceituais do Estado brasileiro. O Chile fez isso e hoje é o melhor País da América do Sul (10º no índice de liberdades econômicas).
A questão trabalhista pode ser maior que o a do peso tributário e do engessamento burocrático para os negócios – ambos enormes e também perniciosos. Simultaneamente, ela oferece 100% de certeza de algum sucesso em juízo – uma cobiça quase insuportável, não importa quanto justa ou injusta seja a iniciativa. E ainda garante impunidade, em caso de um improvável insucesso.
O ambiente hostil do Poder Judiciário “trabalhista” gosta dos termos em desuso “classes”, “patrão” e “trabalhador”, e os opõe de forma quase mandatória. É um mecanismo legal que estimula o conceito da oposição, de adversários nos trabalho. Portanto não confluentes, como desejável numa relação construtiva.
É preciso retirar da equação econômica o dado constante de que certamente haverá uma guerra no futuro da relação trabalhista, induzida pela lei e pelo Estado brasileiro. Nesta guerra oficial, ambas as “classes” podem se utilizar de todas as artimanhas disponíveis à natureza humana – inclusive as antiéticas. Mas o julgador, homologando acordo ou decidindo, estatisticamente, permite o sucesso da quase unanimidade das reclamações trabalhistas. Na prática, 100% das vezes o “reclamante” leva alguma vantagem, algum “êxito”.
Este texto é fruto de um ideário de liberdade, e de quem não pensou sempre assim a respeito desta “justiça”. É fruto de reflexões sobre as transformações havidas no mundo nos últimos vinte anos e das reconsiderações já feitas por outros países. É a pontuação sobre o Brasil, daquilo que em todos os lugares se busca – a liberdade econômica. Liberdade não precisa ter sobrenome e também não pode mais ser proselitismo exclusivo e oportunista da chamada esquerda.
Os brasileiros precisam derrubar este “Muro de Berlim Brasileiro”, em cujas pedras se encontram um cidadão, uma empresa e uma atividade humana chamada trabalho – algumas das “cláusulas pétreas” constitucionais. É preciso reinventar para o Estado e para cidadão brasileiro o conceito sobre negócios, sobre empreendedor, sobre mercado e sobre o Estado frente aos negócios. Um destes negócios é trabalhar mediante um contrato que vale para os dois lados. É preciso reinventar a segurança jurídica do contrato de trabalho e retirar do Estado o poder de polícia de quebrá-la. É preciso desfazer o Poder Judiciário “trabalhista”.
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