O ministro revisor do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, já condenou vários políticos, de diferentes legendas partidárias, por crime de corrupção passiva, o que pressupõe que ele tenha um culpado, ou culpados, do crime de corrupção ativa que será julgado em seguida, pegando o núcleo político do caso, composto pelo ex-ministro José Dirceu, o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro petista Delúbio Soares.
Ao contrário do que fez em relação ao deputado João Paulo Cunha, a quem absolveu de todos os crimes imputados a ele — corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro —, no voto deste item o ministro Lewandowski condenou
vários réus políticos por corrupção passiva, o que deixa pouca margem para a aceitação da tese de caixa dois. No caso do deputado petista, o ministro alegou, em conversa comigo depois da votação, que ele poderia caracterizar “um outro crime que não está na denúncia”, deixando no ar se seria crime eleitoral ou até mesmo tributário.
Se, no entanto, insistir na teoria que já esboçou anteriormente ao julgar o deputado João Paulo Cunha, de que o que houve foi um crime eleitoral de financiamento de caixa dois de campanha, estará diante de uma impossibilidade na visão do ministro Marco Aurélio Mello, que tem interpretações bastante próprias, e quase sempre apropriadas, dos textos legais e do regimento interno do Supremo Tribunal Federal. Para ele, se a linha de acusação for a da defesa, não é possível condenar os réus do mensalão por corrupção passiva, pois “os institutos não se confundem”.
O ministro relator Joaquim Barbosa, mesmo acreditando que não é necessário o “ato de ofício” para caracterizar corrupção passiva, assume a acusação de os réus terem se vendido em troca de apoio político ao governo federal.
Para Lewandowski, a corrupção passiva exige apenas a demonstração de recebimento ou oferecimento da vantagem ilegal ao parlamentar ou servidor. Já Marco Aurélio Mello diz que o caixa dois é um crime regido pelo Código Eleitoral, que não se mistura com um crime regido pelo Código Penal. Por isso, lembra Marco Aurélio, os advogados admitiram da tribuna o crime eleitoral, porque já estariam prescritos.
Nesse caso, não seria possível dar as penas aos acusados por corrupção passiva se a maioria do plenário do STF seguir o revisor e considerar que o que houve foi mesmo um crime eleitoral.
Saberemos apenas no voto do ministro revisor sobre a atuação do núcleo político qual a sua interpretação para os fatos que estão sendo julgados.
Caberá aos ministros do STF, na votação que deve começar amanhã, encaminhar a decisão do Supremo para uma conexão de causa e efeito entre a corrupção passiva e a compra de apoio político ao governo no Congresso, ou enveredar pelo caminho nebuloso do financiamento eleitoral através do caixa dois, que parece cada vez mais estreito e improvável, e que poderá provocar o conflito enxergado por Marco Aurélio.
Outro conflito que o ministro antevê é sobre a possibilidade de o novo ministro, Teori Zavascki, pedir vista do processo ao assumir seu posto no Supremo Tribunal Federal, atrasando assim o julgamento do mensalão.
Para Marco Aurélio, ele pode participar das sessões do julgamento do mensalão depois de aprovado pelo Senado, mas não poderá pedir vista, porque, na sua interpretação, se se considerar “apto” a participar do julgamento, como exige o Regimento Interno, não poderia alegar desconhecimento do processo.
Essa seria uma contradição insanável, na visão de Marco Aurélio, mas é uma interpretação bastante estrita da letra do regimento, que provavelmente será superada pelo entendimento majoritário do plenário, que considera que o novo ministro tem o direito de pedir vista, mas terá que arrostar as consequências de seu ato perante a opinião pública.
Quem o conhece acha que ele não atuaria para atrasar o julgamento, embora tenha o direito de participar dele nos itens em que Cezar Peluso, a quem substitui, não votou.
Caso a sabatina se realize mesmo hoje, no entanto, o ministro indicado Teori Zavascki estaria disposto a anunciar, se perguntado, que não pretende participar do julgamento.
Fonte: O Globo, 25/09/2012
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