O mercado financeiro voltou a temer a possibilidade de um duplo mergulho na economia americana. Alguns dados recentes alimentam esse medo, ainda que de forma tímida por enquanto. Um dos indicadores que mais tem preocupado é o nível de desemprego, que permanece em patamares muito elevados, próximo de 10%. O S&P 500, índice das principais empresas americanas, não conseguiu se sustentar acima dos 1.200 pontos, apesar dos enormes estímulos do governo, e já esboça voltar aos 1.000 pontos.
Várias poderiam ser as causas por trás desse novo desânimo, colocando em risco a recuperação da maior economia do mundo. O grau de alavancagem que o setor privado atingiu nos Estados Unidos, naquilo que ficou conhecido como o “super ciclo de endividamento”, encontrou seu provável limite. O estouro da bolha de crédito acaba gerando um ciclo vicioso, uma espiral recessiva que nem sempre pode ser contida por ações do governo. De fato, boa parte da injeção de liquidez que o Fed realizou nos bancos foi parar nos próprios títulos do Tesouro. Os bancos ainda estão muito receosos para emprestar novamente.
Com isso, os títulos de 10 anos do governo americano sofreram um rali, e seu “yield” está abaixo de 3% ao ano. A mensagem que isso passa é que os grandes investidores ainda estão muito cautelosos, com medo de uma recessão prolongada, como ocorreu no Japão. Os “vigilantes dos bonds” demonstram que temem mais a deflação que a inflação, a despeito da acelerada expansão monetária. Se o Fed tenta inflar artificialmente a economia com forte impressão de moeda, o processo de desalavancagem do setor privado, por outro lado, pressiona os ativos para baixo. Qual será o resultado desse cabo de guerra ninguém sabe ainda.
Mas uma coisa é certa: a maior incerteza, criada pelo próprio governo com novas e complexas leis de regulação, não ajuda nada. Se o objetivo é que a economia retome sua normalidade, com bancos mais capitalizados emprestando novamente para o setor produtivo investir, então as atitudes recentes do governo parecem ir à contramão do desejado. O Congresso americano aprovou uma abrangente reforma do setor financeiro, representando a maior expansão do poder público sobre os bancos desde a Grande Depressão.
O projeto, que aumenta os poderes da burocracia, possui mais de 2.300 páginas! Quantos congressistas devem ter lido o documento na íntegra? Isso tudo gera novas dúvidas no setor, mais incerteza pelo risco de medidas arbitrárias à frente. Não custa lembrar que a crise atual não foi causada por falta de poder de regulação do governo, pois isso existia, e muito. Pode-se falar em incompetência dos reguladores, em captura dos agentes pelo setor financeiro, em conflito de interesses, já que o próprio governo desejava estimular o endividamento imobiliário. Mas não faz sentido falar em ausência de instrumentos para conter os excessos do setor financeiro.
Entre inúmeros erros do governo durante a crise dos anos 1930, merece destaque justamente a sua excessiva hiperatividade. Eis uma pequena amostra de medidas adotadas no meio da crise: Farm Credit Act, Banking Act, National Industry Recovery Act, Farm Mortgage Refinancing Act, Home Owners Loan Act, Securities and Exchange Act, National Housing Act, Emergency Relief Appropriation Act, Fair Labor Standards Act, Social Security Act e Revenue Act. É ato até não acabar mais! O começo do governo Roosevelt ficou conhecido como “os cem dias”, um período frenético de medidas estatais experimentais. Em um ano, algo como 10 mil páginas de leis foram criadas, quase quatro vezes a quantidade que constituía o estatuto federal até então.
A máquina de gastos públicos estava ligada a todo vapor, mas a economia se negava a melhorar. Para o governo gastar, ignora-se que ele precisa extrair recursos do próprio setor privado. Os gastos federais em 1935 eram o dobro do patamar de 1930. Mas quase 12 milhões de americanos estavam sem emprego ainda. O índice de ações Dow Jones só iria retornar ao patamar de 1929 no final de 1954, quase uma década após a morte de Roosevelt. Em 1937, ocorreu uma grave recessão dentro da Grande Depressão, e o índice chegou a cair mais de 40%. O desemprego em 1938 ainda estava acima de 17%.
De qualquer ângulo observado, o “New Deal” fracassou. Em vez de recuperar a economia, ele criou mais barreiras aos negócios, gerou mais incertezas e afastou investimentos produtivos, postergando a recuperação. O governo Obama deveria aprender mais com esta lição histórica.
Fonte: Jornal “Valor Econômico” – 21/07/10
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