Comandante de um dos maiores grupos privados do setor elétrico, Wilson Ferreira Junior, diretor-presidente da CPFL Energia, acredita que só a implementação de uma agenda de reformas conseguirá tirar o Brasil da crise em que se encontra. Para ele, que está à frente da empresa desde 2000, o país está capturando as consequências do que foi feito e do que não foi feito na economia. Com oito distribuidoras de energia, 6 hidrelétricas e 34 parques eólicos, a CPFL detém na sua composição acionária os principais fundos de pensão do país, Petros (dos funcionários da Petrobras) e Previ (do Banco do Brasil), além de Camargo Corrêa. A seguir trechos da entrevista:
O Estado de S. Paulo: Como o sr. vê o atual momento da economia brasileira?
Wilson Ferreira Junior: Toda crise tem uma origem. No início do governo da presidente Dilma, o diagnóstico era convergente. Sabíamos que o câmbio era um impeditivo ao crescimento das indústrias, que os juros altos atrapalhavam, que a desoneração de tributos era necessária e que o preço da energia elétrica precisava cair. O que ocorreu é que algumas coisas foram além do que podia ser feito. A política de dar crédito para as pessoas consumirem também saturou. O cenário mudou. Tínhamos uma política que funcionava com a economia a todo vapor. Ela não poderia parar. Agora a economia está capturando os efeitos da aposta num cenário que não se confirmou.
O Estado de S. Paulo: Como se recuperar?
Ferreira Junior: É difícil para qualquer um administrar um superávit fiscal só podendo trabalhar com parte das despesas. Hoje o único instrumento de gestão do superávit representa 10% ou 15% do orçamento. O resto não pode mexer porque tem vínculo. É um trabalho difícil. Não dá para enfrentar uma crise, com queda na arrecadação, mexendo só em 15% do orçamento.
O Estado de S. Paulo: Mas, então, qual é o caminho?
Ferreira Junior: Precisamos arrumar a casa. Só vamos resolver o problema se fizermos uma agenda de reforma que permita mexer nos 85% do orçamento. Temos de mexer no tema da previdência, da tributação e das despesas vinculadas. É preciso ter mais racionalidade nos gastos. No Brasil, se investe 12% em educação. Na China, esse número é de 5% e eles têm mais registro de patentes e o nível de escolaridade é maior.
O Estado de S. Paulo: Mas esse tipo de reforma só se faz com força política. Esse governo tem liderança para isso?
Ferreira Junior: É um governo eleito. Então tem. O próprio partido do vice-presidente (Michel Temer) propôs algumas medidas que caminham numa boa direção. A maior despesa que temos aqui no Brasil é a despesa previdenciária. Temos um problema a enfrentar. As pessoas estão vivendo mais. Será que é coincidência que um dos países que mais se aposenta mais cedo seja a Grécia.
O Estado de S. Paulo: Os diagnósticos estavam certos, mas o governo não se perdeu em algumas medidas, como foi o caso da energia?
Ferreira Junior: Havia um consenso de que se deveria usar a renovação das concessões para reduzir o preço da energia. Só acho que se tivesse mais conversa, talvez o resultado poderia ter sido melhor, uma vez que era preciso ter a adesão de 100% dos agentes. O problema é que 30% não aceitaram as condições estabelecidas e isso coincidiu com a crise hídrica. Virou a crise que vemos hoje. Se o governo aceitasse elevar o preço de R$ 30 o MWh para R$ 40 ou R$ 45, talvez a adesão fosse maior.
O Estado de S. Paulo: Podemos ter esperança de que a tarifa vai cair?
Ferreira Junior: Uma parte do aumento da tarifa é a bandeira tarifária. Tendo uma melhora do cenário hidrológico, o nível dos reservatórios sobe, as térmicas são desligadas, a bandeira é revisada e a tarifa diminui. Há uma outra parte que refere-se à energia de Itaipu, em dólar, e Contribuição do Desenvolvimento Econômico (CDE). Isso vai continuar. Vamos levar uns três a quatro anos para reduzir estruturalmente a tarifa.
O Estado de S. Paulo: Com essa crise, as empresas têm enfrentado problemas de crédito e de confiança. Como tem sido para aprovar investimentos?
Ferreira Junior: Esse momento requer cuidado. Temos um rating muito bom, mas o mercado está mais caro e mais curto. A gente olha anualmente cinco anos pra frente e nós debatemos com o conselho sobre novos investimentos. Agora o mercado está menor, portanto, tem menos investimento. Se o mercado não demanda isso, a gente investe menos. Num momento como esse, a viabilidade dos projetos exige uma taxa maior de retorno por causa do aumento de custo de capital do acionista, mas também acompanha o aumento da taxa de juros, seja a TJLP (usada pelo BNDES) ou os juros de uma debênture.
O Estado de S. Paulo: O fato de um dos sócios (a Camargo Corrêa) estar envolvido na Lava Jato trouxe mudança para a empresa? Há informações de que ele quer vender a participação na CPFL.
Ferreira Junior: Não. Como presidente da empresa nunca recebi uma comunicação formal, seja de uma intenção ou decisão de venda da participação na empresa. Acompanho pelos jornais as notícias e os desmentidos.
O Estado de S. Paulo: Há um pessimismo exagerado entre os empresários?
Ferreira Junior: Estamos no meio de uma crise. Todo mundo está tendo faturamento menor e estoque maior. Talvez a gente não tenha uma convergência de como sair da crise. Na CPFL, temos tido prudência nos investimentos. Mas trabalhamos muito a questão das despesas também. Hoje temos uma despesa recorrente quase 25% menor que há quatro anos em termos reais. A empresa é mais produtiva hoje. No país, estamos capturando um pouco das consequências do que fizemos e do que não fizemos na economia. Há uma agenda a cumprir para sair da crise. Mas às vezes acho que temos a esperança de uma solução de super homem para sair da crise. Isso só acontece com inteligência, sacrifício, trabalho e com propostas.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 15/11/2015
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