A Política Nacional de Participação Social, recentemente criada, é uma das medidas mais ousadas adotadas pelo PT em todo o seu governo. A nova legislação tem como objetivo fortalecer a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil, definida como “o cidadão, os coletivos, os movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”.
A medida legal determina que os ministérios, autarquias, empresas estatais e até agências reguladoras devem considerar as diretrizes da política de participação social na formulação, na execução, no monitoramento e na avaliação de programas e políticas públicas. Foram criados conselhos e comissões de políticas públicas, conferências nacionais, ouvidorias, mesas de diálogo, audiências e consulta públicas e ambiente virtual de participação social. Os conselhos de políticas públicas têm competência para “participar no processo decisório e na gestão de políticas públicas”; a conferência nacional “pode interferir na formulação e na avaliação” dessas políticas.
A Secretaria-Geral da Presidência presidirá um novo órgão da administração, a mesa de monitoramento das demandas sociais, responsável pela coordenação e encaminhamento de pautas dos movimentos sociais e pelo monitoramento de suas respostas. Essa competência parece chocar-se com a disposição constitucional que dá atribuição exclusiva aos ministros de Estado para coordenar os demais órgãos e entidades da administração pública federal em sua área de competência.
A Constituição prescreve que a soberania popular se exerce pelo voto, com igual valor para todos. O controle partidário dos movimentos sociais fará com que as plataformas políticas do partido sejam necessariamente examinadas por todos os ministérios e entes públicos, com profundas repercussões na vida diária das empresas e dos cidadãos.
O Legislativo, que, segundo a constituição, tem a atribuição de exercer o acompanhamento e a fiscalização dos atos do Executivo, terá de competir com os movimentos sociais, visto que, na realidade, estará sendo substituído por um poder paralelo com funções mais amplas.
Ninguém pode ser contra audiências e consultas públicas, como vem ocorrendo no âmbito do Congresso, com ampla participação da sociedade civil. A grande novidade é a possibilidade de interferência dos movimentos sociais na formulação e no processo decisório de políticas públicas.
O assembleísmo deverá tornar o país muito mais burocrático do que já é. Questionam-se as motivações do governo. O uso da expressão mesa de negociação, inexistente em português, mas corrente nos países bolivarianos, pode dar uma pista…
Não conheço país algum onde os movimentos sociais participam das decisões e interferem na formulação de políticas no executivo, a não ser países como a China, a Venezuela e outros em que o Executivo é submetido ao domínio do partido único, que diz atuar em nome da sociedade civil.
Esse é um dos temas mais relevantes da atualidade, pois tem tudo a ver com a democracia e a representação.
Fonte: O Globo, 10/06/2014.
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