RIO – O Brasil tem uma grande oportunidade de assumir posição de destaque no mercado mundial de biocombustíveis e petróleo, principalmente após a eleição de Joe Biden, que vai aumentar a pressão por uma economia de baixo carbono no mundo. A avaliação é do vice-presidente sênior da IHS Markit e ex-embaixador dos Estados Unidos, Carlos Pascual, que vê chances para uma vida mais longeva para o petróleo, mesmo com menor demanda, mas apenas para produtores com baixo custo e baixa emissão, como é o caso brasileiro.
“Com a volta dos Estados Unidos (ao Acordo de Paris), dois terços dos países estarão com esse compromisso de reduzir carbono. Isso vai introduzir uma dinâmica muito importante para os produtores de petróleo e energia, vai ter vantagem quem produzir com preços mais baixos e com emissões mais baixas”, avalia Pascual, um dos palestrantes da Rio&Oil&Gas 2020, que começa nesta terça-feira, dia 1º.
A expectativa de Pascual é de que a volta de um grande ator ao jogo aumente a pressão sobre os países não comprometidos com a redução de emissões de dióxido de carbono (CO²) na atmosfera, ajudando a equilibrar os preços do mercado. Com os EUA, as emissões do mundo que estarão comprometidas com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) do Acordo de Paris, de 2016, pulam de 54% para 66%, diz o executivo da IHS.
“Se alguns fazem esforços (para reduzir emissões) e outros não, e estão com custos menores porque não estão fazendo esforços, eventualmente vamos ver sanções em produtos e energia dos que não estão tomando o compromisso”, afirma. “Em uma década vamos ver movimento nessa direção, porque não necessariamente vai começar amanhã, mas os Estados Unidos estão nessa direção.”
Pascual vê o Brasil bem posicionado, mas questões como o desmatamento terão de entrar nas negociações com países que buscam a meta de zero emissão entre 2050 e 2060. “Há preocupação de emissões do Brasil em relação a emissões a desmatamento, e creio que sim, vai ser um assunto para o Brasil, vai ter de negociar com outros países para o futuro”, alerta.
Em biocombustíveis, Pascual vê uma oportunidade muito grande para o futuro na expansão no mercado da Índia, que, assim como o Brasil, está no Acordo de Paris, mas não terá condições de embarcar na mobilidade elétrica, como está acontecendo com grande velocidade no norte da Europa. “Para fazer uma mudança completa para veículos elétricos vai ser um investimento em infraestrutura enorme para um país como a Índia, mas já tem infraestrutura que pode utilizar para biocombustíveis, e creio que, para um país como o Brasil, pode haver muitas possibilidades no mercado internacional nesse setor”, afirmou.
Espaço para petróleo
Mas as oportunidades para o petróleo brasileiro também são grandes, diz. Apesar de ver o pico do consumo do petróleo em 2035, com queda gradual após essa data, Pascual observa que algumas projeções avaliam que o pico já aconteceu antes da pandemia do covid-19, e que nunca mais voltará ao normal. E outra questão que precisa ser investigada é o quanto a tecnologia para reduzir o dióxido de carbono dos combustíveis fósseis irá evoluir, o que poderá garantir uma vida mais longa para o petróleo do que se vem estimando.
“Não me surpreenderia que, com todos os investimentos que estão fazendo em distintas formas de captura de carbono, poderíamos ver mais tempo para o uso de petróleo, é uma coisa que temos de acompanhar”, afirma, citando a Petrobrás como um expoente dessa tecnologia.
“Aqui temos a Petrobrás focando na eficiência da produção, reduzindo custos para poder ser competitiva globalmente, com produção de gás associado, que vai ter custo muito barato porque vem com o petróleo”, avalia o executivo. “Pode ser competitivo e complementar à energia eólica e solar para uso de eletricidade no País.”
Para ele, a criação de uma gerência de Mudanças Climáticas na Petrobrás e o compromisso das parceiras da estatal – Shell, BP, Total, Equinor – com as metas de redução devem garantir vida longa também para os negócios da companhia brasileira, em um momento em que os investidores têm buscado aplicações em energia sustentável.
Ele observa que o setor financeiro, mesmo antes da pandemia, já privilegiava investimentos em energia limpa, pelo temor do mercado de investir bilhões de dólares em ativos que poderiam ter potencial de duração de apenas mais 15 anos. Outra mudança, avalia, é que após a pandemia a tendência é de que os recursos fiquem nos próprios países, e por isso a disputa pelos investimentos se tornará ainda mais acirrada.
“Os Estados Unidos terão 20% a 25% do seu Produto Interno Bruto (PIB) para se recuperar da pandemia, e quando mais vai ter um investimento deste para se recuperar? Por isso, tem de fazer esses investimentos de uma maneira melhor, porque não vai fazer isso sempre”, explica.
Fonte: “Estadão”, 30/11/2020
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