Líderes políticos que terminaram seus mandatos com altos índices de popularidade se preparam para voltar ao poder no Chile, Colômbia, Uruguai e Brasil
Houve um tempo, não muito distante, em que eles eram destituídos por incapacidade mental, apresentavam sua renúncia de um país tão longínquo quanto o Japão ou escapavam de helicóptero em meio a violentos protestos. As saídas pouco honrosas dos presidentes latino-americanos no final do século passado e no início deste século estavam na ordem do dia. E ninguém se atrevia a imaginar o regresso de algum deles ao poder.
Hoje, um fenômeno inverso percorre a região: após deixar o poder com altos níveis de popularidade, vários ex-presidentes se preparam para voltar aos respectivos palácios de governo. E, a julgar pelas pesquisas de opinião, a vitória para muitos deles parece garantida.
Entre o final deste ano e o do próximo, haverá eleições presidenciais em Chile, Colômbia, Uruguai e Brasil. E, nos quatro casos, a corrida eleitoral gira em torno da presença – ou da poderosa sombra – de um ex-presidente.
O primeiro e mais provável regresso ao grande cenário político é o de Michelle Bachelet, favorita indiscutível para que a Concertação, coalizão de centro-esquerda chilena, recupere o Palácio de La Moneda. A ex-presidente deixou o poder em março de 2010 com um nível de aprovação de 84%, o mais alto na História do Chile. E, embora os anos seguintes tenham sido de uma discrição absoluta (entre 2010 e 2013 foi secretária-geral da ONU-Mulheres, em Nova York), seu nome sempre figurou no topo da lista dos políticos mais populares do país. Razão para sua candidatura nas eleições de 17 de novembro.
Um mês atrás, também o ex-presidente uruguaio Tabaré Vázquez, que governou o país de 2005 a 2010, disse que voltaria, fazendo os dirigentes da coalizão governista Frente ampla respirarem aliviados. Em outubro de 2011, Vázquez anunciara sua saída da atividade política pública. E embora muitos estivessem convencidos de que buscaria um segundo mandato nas próximas eleições presidenciais, em outubro de 2014, ele havia se mantido em silêncio, como Bachelet.
Embora o Uruguai ainda tenha que realizar as primárias para definir os candidatos, a coalizão de governo sabe que tem um trunfo: Tabaré deixou o poder com 75% de aprovação, algo inédito no país, e essa popularidade nunca o abandonou. Segundo pesquisas recentes, ele é hoje o político mais popular do país, com 62% de apoio.
No Brasil, o futuro é menos claro. Como no Uruguai, em outubro do próximo ano se realizam as eleições presidenciais. E a grande incerteza parece ser quem será o candidato do Partido dos Trabalhadores: a presidente Dilma Rousseff ou seu mentor, Luiz Inácio Lula da Silva?
Até poucos meses, a reeleição de Dilma parecia garantida. Mas num piscar de olhos o panorama mudou: em junho, os brasileiros foram às ruas pedindo melhoras sociais, a popularidade da chefe de Estado caiu e todos os olhos se voltaram para Lula. E, embora o ex-presidente insista que será o maior defensor da candidatura de Dilma em 2014, as peças ainda estão soltas.
Embora a pesquisa Datafolha indique que Dilma ganharia hoje de qualquer candidato, o único político que conseguiria se impor no primeiro turno seria Lula, já completamente recuperado de um câncer detectado em 2011. Um dado menor, pese a recente filiação de Marina Silva, segunda nas pesquisas depois da presidente, ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), da oposição – o que poderia complicar uma possível reeleição.
No caso colombiano, assim como Lula, o ex-presidente Álvaro Uribe (2002-2010) deixou o cargo com um índice de popularidade altíssimo e, desde então, se manteve mais presente e público do que nunca, atirando, em sua conta no Twitter, contra o presidente Juan Manuel Santos, ex-chefe que virou seu inimigo.
Ainda que ele desse qualquer coisa para ser candidato presidencial nas eleições de maio de 2014, a Constituição colombiana não permite. O que não impede que Uribe encontre um caminho alternativo para a Casa de Nariño. E nisso ele está: de acordo com jornais locais, Uribe teria anunciado que será candidato a senador no ano que vem, tentando recuperar a presidência através de um candidato “incondicional”.
Com esses prognósticos de fundo, e a provável reeleição de Evo Morales na Bolívia – tal como aconteceu com Rafael Correa, no Equador, no começo do ano -, a América latina poderia voltar a ser liderada em 2015 pelos mesmos chefes de Estado de cinco anos atrás.
Como nunca antes, em uma região onde as instituições são fracas e as lideranças fortes, a falta de renovação de rostos políticos está más vigente que nunca.
“É complexo encontrar as razões para esta tendência. Mas, sem exagerar, vivemos o pior momento nos últimos 50 anos em termos de liderança. Existe um enorme vazio, que é péssimo para o funcionamento da democracia”, explicou ao jornal “La Nación”, o brasileiro Marco Antonio Villa, sociólogo e professor de Historia da Universidade Federal de São Carlos.
Para Ignacio Zuasnabar, diretor da consultora uruguaia Equipos Mori, o panorama é resultado da “década de crescimento econômico sustentável e contínuo na região, que favoreceu e ainda favorece a continuidade dos projetos políticos”. “Agora, se as condições econômicas variarem na próxima década, deveríamos esperar uma frequência maior de alternâncias no governo”.
Fonte: O Globo
No Comment! Be the first one.