É embaraçoso para o governo Dilma: como dizer que o automóvel particular a gasolina agora é o bandido, depois de ter passado anos dando-lhe tratamento de rei?
Não é modo de dizer. Os carros tiveram seus preços abatidos, via redução de impostos, e as montadoras locais foram apoiadas com proteção e financiamento subsidiado para aumentar a produção. Os compradores também foram brindados com enorme ampliação do crédito — nada menos que R$ 52 bilhões concedidos nos últimos dois anos. De presente extra, a gasolina com o preço congelado e contido, para segurar a inflação e evitar a bronca dos motorizados.
Agradecidos, os brasileiros, especialmente os da nova classe média, foram à luta, quer dizer, aos bancos e concessionárias, e cumpriram sua obrigação de apoiar o crescimento do PIB. Saíram de carro por aí.
Infelizmente, a Petrobras não conseguiu entrar na festa. Sua produção de petróleo estagnou, as refinarias não deram conta da demanda, as novas refinarias estão atrasadas, de modo que a estatal precisou importar cada vez mais gasolina. E a preços não brasileiros, claro.
Não é de estranhar que o resultado tenho saído muito errado. A inflação continuou elevada e o crescimento permaneceu muito baixo. Sempre se pode dizer que tudo teria sido pior com a gasolina e os carros mais caros. Mas pior comparado com o quê? De todo modo, o fato é que muitas outras coisas também deram errado. A Petrobras, perdendo receita, sendo obrigada a vender gasolina mais barato do que importa, teve que se endividar. E as ruas ficaram congestionadas, pois não se investiu na infraestrutura necessária para acolher os carros e abrir caminhos para o transporte coletivo.
Como consertar isso, considerando ainda mais que a Petrobras precisa de dinheiro, muito dinheiro, para o pré-sal? E lembrando que o dólar caro veio para ficar?
Claro, precisa aumentar o preço da gasolina para turbinar as receitas da estatal. Quanto? Se for apenas para equilibrar o preço atual, pelo menos 20%. Se for para recuperar perdas passadas, uns 30%.
Mas isso jogaria a inflação de novo para cima do teto da meta — 6,5% — e provocaria uma justa bronca na classe média. Qual é? Não era para comprar carro?
Que tal, então, um aumento moderado para a gasolina e para o diesel? Ruim também. Talvez pior. Provocaria inflação de qualquer jeito — pois o índice está rodando em torno do teto —, não resolveria o caixa da Petrobras e deixaria todo mundo aborrecido.
E, para complicar, tem mais essa proposta do prefeito de São Paulo, Fernando Hadad, de colocar um imposto de 50 centavos por litro de gasoloina e usar todo o dinheiro para subsidiar e reduzir tarifas de ônibus. Para efeitos de índice de inflação, a redução da tarifa compensaria a alta da gasolina, mas vá explicar para o pessoal que está tudo bem com a gasolina a R$ 4,20.
Imaginem o impacto psicolólogico e social, pois a gasolina subiria em dose dupla, uma para a Petrobras, outra para os ônibus. E, como estes passam a ter prioridade, os brasileiros que micaram com os carros pagarão mais caro para ficar em congestionamento mais demorado.
Como o governo pode ter se equivocado tanto?
Seria uma pergunta cabível se o resto estivesse funcionando. Mas considerem apenas o que tem saído na imprensa nos últimos dias.
As usinas de Jirau e Santo Antonio, em construção no Rio Madeira, vão gerar uma carga de energia que não pode ser levada pela linha de transmissão projetada. Simplesmente queimaria tudo. A linha é insuficiente. Sabe-se disse desde 2010 — e ainda estão discutindo para descobrir de quem é a culpa.
Mas deve estar sobrando energia, não é mesmo? Usinas eólicas estão prontas e paradas há um ano, por falta de linhas de transmissão.
Há uma guerra judicial no setor elétrico, com o governo tentando empurrar para empresas a conta da energia produzida nas usinas térmicas.
Há milho para ser estocado, uma superprodução, e armazéns da Conab fechados por falta de manutenção ou porque estocam milho… velho.
Na política econômica, o Brasil é o único país importante que está subindo juros. É também o único emergente de peso que não pode se aproveitar do momento internacional para deixar a moeda local se desvalorizar o tanto necessário para dar muita competitividade às exportações.
Uma ironia: a “nova matriz” do governo, alardeada pela presidente Dilma, se baseava em juro baixo e dólar caro, para ter crescimento elevado. Pois, no momento em que o dólar sobe sozinho, por conta dos EUA, o BC brasileiro tem que elevar os juros e tentar segurar o dólar para controlar a inflação. E lá se vai o PIB.
Uma ironia pedagógica, se é que conseguem aprender com tantos equívocos.
Fonte: O Globo, 15/08/2013
Se tivessemos aprovado o PL166 que isenta as bicicletas e acessórios do mesmo IPI, teríamos inundado as cidades de bicicletas, de pessoas com mais saúde, diminuído os congestionamentos, a poluição. A petrobras não estaria passando o que esta por esse motivo em questão, mas não necessariamente teria solucionado algum rombo em outro lugar. O projeto que falo, esta desde 2009 na CAE – Comissão de Assuntos Econômicos, nem mesmo aprovado na comissão, ja possui 3 projetos apensados a ele e com certeza ainda tera mais outros que foram apresentadas na Câmara. É uma pena que ciclista não faz lobby.
Mas é obvio que nao vao aprender. Estão com a cartilha do Vargas de 1930 ainda (na melhor das hipoteses).
Subdesenvolvimento é isso: a incapacidade de acumular experiências….
Por que nao um congelamento de preços? Pode ser que funcione, vamos tentar!
Análise clara e perfeita. Como pode ocorrer tantos equívocos? E com isto só quem sofre é a sociedade. Que em um primeiro momento acreditou neste crescimento a base de estímulo ao crédito. E o próximo passo: altos níveis de inadimplência. E a história se repete.
Prezado Sardenberg: Falta agora um artigo sobre como pode falhar tão flagorosamente o sistema de representação democrática ao colocar no poder tantas pessoas incompetentes por tanto tempo, causando um dano histórico ao país…
(parabéns pelos comentários e artigos)
Muito boa a análise. Esse é o resultado de tantos políticos mal preparados e desinteressados no poder.