O chavismo, com Nicolás Maduro no timão, à primeira vista sobreviveu relativamente bem às eleições municipais de domingo na Venezuela. Obteve 49,3% dos votos para prefeitos e vereadores, contra 42,7% da oposição, confirmando a divisão do país. De modo geral, o governo manteve o domínio em amplas áreas do interior e municípios menores, enquanto a oposição triunfou nas maiores cidades e, simbolicamente, pela primeira vez em Barinas, berço e feudo da família Chávez. Mas é preciso levar em conta que o governo lançou mão de um rolo compressor ainda mais impressionante que o usado por Chávez. O resto de liberdade de expressão foi amplamente pisoteado. Os sete canais públicos de TV terminaram convertidos em canais privados do chavismo; as duas grandes redes privadas mostraram temor ante o Palácio Miraflores; e a Globovisión, outrora o único canal crítico, já havia sido vendida e somou-se à causa bolivariana. Ontem, Maduro propôs boicote ao jornal “El Nacional”, do Grupo de Diários América (GDA), de que faz parte O GLOBO, alegadamente por “mentir sobre o resultado do pleito”.
Uma pesquisa da ONG Monitoreo Ciudadano mostra que Maduro ordenou 156 cadeias obrigatórias de rádio e TV desde a posse, em março — média diária de 30 minutos. Na mídia estatal, a pressão foi mais intensa: 93 minutos por dia. Durante a campanha, os números passaram para 49 minutos e 108 minutos, respectivamente. Já Henrique Capriles, líder da oposição, teve somente uma participação ao vivo na TV.
Apesar de toda a pressão oficial, o comparecimento foi baixo para os padrões dos últimos pleitos, com 58,9% (o voto não é obrigatório no país), num sinal de cansaço do eleitorado diante da retórica “salvacionista” do chavismo e de descrédito na capacidade do governo de atacar com sucesso a grave crise, em que despontam inflação anual de 54%, escassez de produtos de consumo e violência recorde. Com o estado precário das finanças públicas, analistas estimam que Maduro terá de recorrer a uma desvalorização do bolívar, que, por um lado, aumentaria a receita do Estado com a exportação do petróleo; por outro, alimentaria a inflação via encarecimento das importações — e a Venezuela hoje importa praticamente tudo. É um dilema para o qual não parece não haver saída.
Nada indica que Maduro pretenda alterar sua política de radicalização do chavismo, uma forma talvez de compensar a ausência física de Chávez. Só que isto aumenta a ineficiência — o governo intervém hoje em todas as esferas da vida econômica —, com a consequente ampliação do desabastecimento e risco de a insatisfação popular se traduzir em saques e violência nas ruas. Para evitar o quadro, o presidente teria de conter a intervenção estatal e passar a descomprimir a iniciativa privada, para que os empresários voltassem a acreditar que vale a pena fazer negócios na Venezuela. Mas nada disto parece estar na agenda do Palácio Miraflores.
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