Depois de anos de estudos sobre a área de inteligência e espionagem e ministrar diversos cursos pelo Brasil e pelo exterior, além de desenvolver consultorias sobre inteligência e cenários estratégicos na África e também escrever dois livros sobre o tema, particularmente, acredito que o caso Snowden [Edward Joseph Snowden, ex-analista de inteligência norte-americano que divulgou detalhes confidenciais de programas de vigilância eletrônica dos governos dos Estados Unidos e do Reino Unido] sobre a espionagem americana no mundo, tem muito a acrescentar, principalmente em aprendizagem para o governo brasileiro sobre os temas contraespionagem e segurança internacional.
Muitos brasileiros devem pensar que o caso de Snowden, e de seus parceiros, o norte-americano Gleen Greenwald e o brasileiro David Miranda, nada tem a acrescentar à nossa corriqueira vida brasileira, já cheia de problemas. Mas o caso, em si, além de não ser nada novo para a comunidade de inteligência brasileira e mundial, na verdade, trouxe alguns questionamentos sobre a segurança do Brasil, que vai além da segurança de dados e telefonia.
Um país que tem um serviço de inteligência enfraquecido, na verdade, tem fronteiras desguarnecidas, um sistema de decisão lento e com níveis de riscos alarmantes, uma infraestrutura de informações de política externa piegas (veja o caso Itamaraty Bolívia) e faltam informações estratégicas de inovação – o Brasil tem uma das piores posições neste quesito segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Além disso, o país não consegue controlar efetivamente as grandes ameaças internacionais do narcotráfico e do contrabando de armas, além do terrorismo. Essa lista ainda é ampliada, se falamos em questões comerciais.
O caso Snowden, além de escancarar a espionagem americana ao mundo, ou melhor, a política externa de obtenção de informações que serviam aos interesses americanos, expõe o problema de atuação e política do serviço secreto brasileiro, representado pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin), circunscrita ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Em momento algum, a contraespionagem da Abin teve o direito de se expressar para falar sobre o caso Snowden. Assim, a sociedade questiona se a mesma atuou ou desenvolve, de alguma forma, ações efetivas de contraespionagem no país, considerando inclusive os diversos problemas de bioespionagem que acontecem na Amazônia, os próximos eventos esportivos e o crescimento do terrorismo no mundo.
Outro ponto importante: o caso Snowden demonstrou como as instituições brasileiras deixam os dados dos brasileiros vulneráveis. Lembre-se do caso da Serasa e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ou também da abertura de dados de usuários brasileiros no Facebook para o governo federal. Pergunto-me se deveria estar preocupado com a espionagem americana ou com a fragilidade na condução de dados dos brasileiros.
O caso Snowden nos permite aprender que devemos potencializar sim nossa inteligência para o exterior, ampliar nossas defesas em contraespionagem, e tratar o tema já no século XXI, e não em cima de resquícios do passado, achando que espionagem é “porão” e que a Abin ainda é o Serviço Nacional de Informações (SNI). Na Abin, existem inúmeros profissionais altamente capacitados, e o governo desperdiça valores em políticas pouco acertadas na defesa do país. Depois, não reclame das drogas e armas que adentram o país, e também não reclame de pagar royalties sobre remédios com base medicinal 100% brasileira para as indústrias internacionais que buscam medicamentos em nossas florestas.
Muito bom artigo.
HS.
Excelente artigo, por sinal, o professor Fábio Ribeiro é um dos maiores especialista no tema de espionagem internacional.