“Não importa quantos cisnes brancos você veja ao longo da vida; isso nunca lhe dará certeza de que cisnes negros não existem.” (Karl Popper)
Antes da descoberta da Austrália, as pessoas do Velho Mundo estavam convencidas de que todos os cisnes eram brancos, crença corroborada pela evidência empírica. No entanto, bastou verificar-se a existência de um cisne negro para derrubar essa crença. Isso ilustra os limites de nosso aprendizado por observações e impõe muita humildade àqueles que vivem de antecipar o futuro. Os recentes eventos no mundo árabe mostram uma vez mais que de onde menos se espera pode aparecer um “cisne negro”.
Estrategistas atentos aos riscos do superaquecimento chinês, do elevado endividamento europeu ou da retomada do aperto monetário americano não faziam ideia de que o risco do momento viria de jovens egípcios rebeldes, cansados do regime autoritário de seu país. A região sempre foi um barril de pólvora, mas o Egito era visto como estável pela maioria dos especialistas. E foi justamente ali que a insegurança institucional se alastrou, gerando medo nos investidores do mundo todo.
O livro “A lógica do cisne negro”, de Nassim Taleb, trata justamente desse tema. É um livro sobre a incerteza, sobre os raros eventos que mudam o rumo das coisas sem aviso prévio e sem que os modelos estatísticos possam antecipá-los. A ideia central de Taleb está relacionada à cegueira em relação ao fator randômico das diferentes áreas da vida. Cada um pode observar sua própria história de vida para verificar quanto os fatos ocorridos divergiram dos planos traçados anteriormente.
Aquilo que não sabemos pode ser algo muito mais relevante do que aquilo que sabemos. Os “pontos fora da curva” ocorrem com muito mais frequência do que antecipamos, e nossa incapacidade de prevê-los é nossa incapacidade de prever o curso da história. Basta verificar os erros grosseiros das previsões passadas para se ter mais humildade em relação às previsões do futuro. É preciso deixar um espaço enorme para os eventos imprevisíveis.
Taleb chama atenção para o “tripé da opacidade”: a ilusão de compreensão, com todos achando que sabem o que se passa num mundo que é bem mais complexo do que percebem; a distorção retrospectiva, que transforma a história mais clara após os fatos, organizando-os de forma bem mais simplista do que a realidade; a sobrevalorização da informação factual. Em retrospecto, chegamos a questionar como outros foram capazes de ignorar o que estava para acontecer. Taleb conclui que nossas mentes são brilhantes máquinas para explicar os fenômenos ocorridos, mas geralmente incapazes de aceitar a ideia da imprevisibilidade acerca do futuro.
Um exemplo citado por Taleb é a alimentação de um peru desde o seu nascimento até o Dia de Ação de Graças. Supondo que ele recebeu certa quantidade de comida a cada dia, por mil dias, o gráfico de seu peso ou tamanho no tempo será praticamente uma reta, com pouca variância. De fato, a confiança em relação ao futuro, com base nos dados passados, aumenta a cada dia, ainda que ele esteja cada vez mais próximo da morte. Algo funcionou por vários dias de forma bastante regular, até que, de repente, deixa de funcionar de forma inesperada. O uso ingênuo de observações passadas como representativo do futuro é a causa de nossa incapacidade de compreensão do “cisne negro”.
Em 1907, o capitão do Titanic afirmou que jamais estivera envolvido em qualquer acidente. Até que algo deu errado em 1912, e o navio afundou. Quanto realmente os dados passados podem ser utilizados para prever o futuro? Em 1982, os grandes bancos americanos perderam praticamente todo o ganho acumulado anteriormente. Tudo que fora gerado na história desses bancos foi perdido em um único ano! Eles haviam emprestado grandes somas para países da América Latina, e esses países deram o calote na mesma época. Um “evento excepcionalmente raro”, conforme as estatísticas. No entanto, ocorreu.
O crash de 1987 nas bolsas é outro exemplo, ou então a bancarrota do LTCM em 1998, criado por “gênios” que encaravam as finanças como algo pertencente ao mundo “normal”. O mundo é bem mais complexo do que pensamos ou modelamos. Deveríamos ser bem mais céticos com os “profetas”, analisando sua taxa passada de erros. O conhecimento humano pode nos mostrar justamente os limites desse conhecimento, de nossa capacidade de prever o futuro. E isso, para investidores, deve significar uma postura bastante humilde diante dos mercados, com uma sólida política de controle de riscos (leia-se “stops”).
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