Novas resoluções editadas pelo governo determina que mercado de resseguros do Brasil retenha 40% dos resseguros, sem repassar nada para o exterior
As resoluções 224 e 225 de 2010, do Conselho Nacional de Seguros Privados, têm curiosidades interessantes. Por exemplo, foram baixadas duas resoluções tratando da mesma matéria para modificar a Resolução 168/07, que regulamenta a Lei Complementar 126/07. Por que não foi baixada uma única resolução, como seria lógico?
Uma resposta seria que o governo, ou pelo menos o funcionário responsável por elas, maquiavelicamente, fez isso de propósito, já pensando numa moeda de troca com o mercado, que, evidentemente, não aceitaria as disposições das duas resoluções, por serem absolutamente contrárias aos interesses do País e da atividade.
Uma das resoluções determina que as resseguradoras locais não podem ceder o que ultrapassar sua capacidade de retenção para empresas do mesmo grupo no exterior. A outra determina que as seguradoras em operação no Brasil devem contratar obrigatoriamente 40% de cada cessão de resseguro com resseguradora local.
Como se vê, as matérias são complementares, mas foram baixadas duas resoluções para modificar o que foi corretamente disposto, ainda em 2007, através da Resolução 168, para normatizar a Lei Complementar 126/07, que acabou com o monopólio do resseguro.
Atualmente, as resseguradoras locais detêm 47% dos resseguros gerados pelo Brasil, o que mostra que a capacidade técnica e profissional dessas empresas tem lhes garantido um percentual de mercado maior do que o previsto na lei, justamente para protegê-las.
Onde a coisa pega é que o IRB Brasil Resseguros, que até 2008 tinha mais de 80% dos resseguros brasileiros, por razões que não precisam ser analisadas aqui, viu sua participação cair para algo em torno de 25%. E o IRB é controlado pelo governo, que sabe que a tendência é ele continuar perdendo participação.
Pretender que o mercado ressegurador brasileiro retenha 40% dos resseguros gerados no País, sem repassar o excesso de capacidade para o exterior, é não ter noção do que isso significa ou, pelo menos, não conhecer o funcionamento da atividade resseguradora.
Como escrevi no artigo da semana passada, só as grandes obras previstas para os próximos anos significam investimentos de mais de R$ 300 bilhões. Ou seja, com a regra acima, o mercado brasileiro necessitaria, numa conta muito simples, capital para reter 120 bilhões no País, o que não existe, nem vai acontecer.
A título de comparação, a soma dos patrimônios líquidos do Bradesco e do Itaú, os dois maiores bancos privados brasileiros, não seriam suficientes para dar conta do recado. Imaginar que os grandes grupos internacionais farão esses aportes é acreditar em fadas, não conhecer o setor de resseguros ou criar uma moeda de troca para tentar salvar o IRB.
Eu não tenho bola de cristal para saber o que levou à edição dessas duas resoluções. Mas eu sei que a atividade seguradora, através do resseguro e da retrocessão, é uma atividade globalizada e de capital intensivo. Assim não há a menor necessidade desse dinheiro ser trazido para o Brasil.
De outro lado, as regras de transparência e controle de seguradoras adotadas pela maioria dos países sede das grandes corporações, faz com que a cessão de negócios para empresas do próprio grupo seja, em verdade, uma prova de confiança na operação da subsidiária que fez a cessão, já que estas regras exigem o comprometimento de grande quantidade de capital próprio para garantir os riscos assumidos por ela.
Dentro da ideia de moeda de troca para salvar o IRB, seria lógico supor que o mercado prefere que seja permitida a cessão de negócios para empresas do mesmo grupo instaladas no exterior. Então, revogue-se essa, mas deixe a outra. Onde a conta não fecha é que isso não salvará o IRB. O que o IRB precisa é um choque de gestão. Sem isso, continuará a perder competitividade, tanto faz o que o governo faça. E se ele fizer mais do que deve, como é o caso agora, quem corre o risco de pagar o preço é a sociedade brasileira, que pode não encontrar proteção para parte de seus riscos.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 17/01/2011
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