Em julho, durante debate comigo pela TV, Marcio Pochmann, pináculo do keynesianismo de quermesse, argumentou que a política monetária não conseguiria reduzir a inflação. A evidência era risível: a inflação dos meses anteriores registrara 0,78% e 0,35%, enquanto em agosto de 2015 chegara a apenas 0,22%.
À parte o erro crasso de comparar o incomparável (a inflação mensal tem padrão sazonal bem definido: costuma ter picos no primeiro trimestre e atingir seu menor valor no terceiro), não consigo deixar de pensar qual seria sua ginástica mental para explicar a inflação de 0,08% em setembro deste ano. Desconfio de que, como o número não apoiaria sua tese, provavelmente esqueceria seu argumento anterior e, agora sim, se lembraria da sazonalidade favorável do período.
Fato é que a inflação caiu, embora não à velocidade desejada. De acordo com a mais recente medida disponível, o IPCA medido em 12 meses (portanto livre da flutuação sazonal) atingiu 8,3%, comparado a 10,7% no final do ano passado, redução de 2,4 pontos percentuais, ainda aquém do necessário para nos trazer de volta à meta (apesar da promessa da antiga diretoria do BC), mas em queda de toda forma.
É bem verdade que parte disso reflete o fim do ajuste dos preços administrados, após o irresponsável controle de 2012 a 2014; já há evidência, porém, de que a inflação de preços livres vem cedendo, ainda que lentamente. Após atingir pico superior a 9% no começo deste ano, registra agora pouco menos de 8,5%.
Ainda mais revelador, o núcleo da inflação de serviços, segmento que o BC tem sublinhado em sua comunicação precisamente por ser o mais sensível à atividade econômica e, consequentemente, à política monetária, mostra queda de 2,7 pontos percentuais entre seu pico (9,6% em outubro do ano passado) e a última observação (6,9% em setembro deste ano).
O curioso é que o canal do câmbio, ao qual quermesseiros de vários matizes atribuem poderes quase miraculosos de redução da inflação, não revela a mesma força. A inflação dos produtos “comercializáveis” (isto é, aqueles cujo preço local tende a seguir mais de perto os preços externos e a taxa de câmbio) acelerou ao longo do ano todo, caindo apenas nos últimos dois meses, de 10% para 9% (era 8,5% no final do ano passado).
Se havia dúvidas, pois, quanto à capacidade do instrumento para reduzir a inflação, estas deveriam ter se dissipado, ao menos para analistas que conservam hábitos antiquados, como conferir o que dizem os números.
Obviamente não há o menor risco de keynesianos de quermesse prestarem atenção a dados que não confirmem suas crenças a priori, de modo que devem continuar argumentando –contra toda evidência– que a política monetária não funciona.
Isto dito, houve, claro, custos de desinflação. Teriam sido menores se as contas públicas estivessem em melhor forma e a diretoria anterior do BC tivesse sido séria quanto ao controle da inflação. Não teríamos sofrido o risco de dominância fiscal, e a inércia inflacionária seria bem mais baixa, dois fatores que levaram à maior resistência da inflação.
Já pagamos, porém, esse custo. Olhando à frente, é imperativo transformar a promessa de ajuste fiscal em realidade, permitindo ao BC reduzir mais fortemente os juros e assim contribuir para a recuperação da economia.
Fonte: Folha de S.Paulo, 09/11/2016.
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