A Polícia Federal avança em busca da verdade disparando Aletheia, a mais nova e politicamente complexa fase da Operação Lava-Jato. Lubrificadas pela delação premiada de Delcídio Amaral, as investigações exigiam o depoimento do ex-presidente Lula, o que foi previamente assegurado por eventual condução coercitiva autorizada pelo juiz federal Sergio Moro. A delação de Delcídio embola os governos Lula e Dilma em uma engrenagem única em sinistra associação com piratas privados e criaturas do pântano político para a apropriação indébita de recursos públicos e para a permanência no poder. O mensalão e o petrolão seriam duas faces do mesmo fenômeno. E a autorização da condução coercitiva por Sergio Moro irritou o ex-presidente e inflamou a militância que o esperava na sede do PT após o depoimento.
Olívio Dutra, um dos fundadores do PT, diz que quem mudou foi o partido, e não seus adversários, atribuindo práticas degeneradas à política do pragmatismo, o “enorme guarda-chuva aberto por Lula”. O líder maior de seus adversários, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, parece concordar com essa avaliação: “É preciso abrir o jogo: não se trata só de Dilma ou do PT, mas da exaustão do atual arranjo político brasileiro.” Compreendem os leitores o profundo silêncio das oposições? Entendem por que a defesa da República depende agora da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário?
Seremos testados nos próximos meses. Não apenas nossas instituições mas também o próprio Lula. Sua biografia não é a de Chávez, e o Brasil não é a Venezuela. Lula prestará um desserviço ao país, desmerecendo sua luta pela redemocratização, se incitar militantes à violência, em vez de enfrentar serenamente uma avaliação de suas responsabilidades perante a Justiça. Seria desesperada e temerária qualquer ameaça de convocar camisas negras, pardas ou vermelhas, “o exército de Stédile” e militantes de organizações sociais para brigar nas ruas. Seria uma provocação ao Exército de Caxias. Nossa democracia dispensa tanto a violência de milícias partidárias quanto as práticas transgressoras de bandos políticos, em que a cumplicidade e o silêncio solidário com os malfeitos colidem com a transparência e a integridade exigidas no trato da coisa pública.
Fonte: O Globo, 07/03/2016.
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