As sanções que os EUA e a União Europeia aplicaram à Rússia por conta da anexação da Crimeia podem levar a Europa a um embate no setor energético e traz a tona um tema que iremos ver com frequência enquanto as sanções estiverem sendo aplicadas, que é a promissora fonte de energia proveniente da queima do xisto.
O xisto é uma rocha sedimentar rica em material orgânico que, quando aquecida a altas temperaturas, gera dois subprodutos, o óleo e o gás de xisto. Estima-se que os EUA possuam 73% das reservas de xisto em óleo do planeta, o que poderia produzir, segundo estimativas, algo em torno de cinco trilhões de barris de óleo de xisto (óleo esse que é um substituto do petróleo para obtenção de gasolina e outros derivados). Em relação ao gás xisto, atualmente apenas os EUA e o Canadá extraem esse gás em formato industrial (a Petrobras também extrai gás xisto, mas em quantidade bem menor). Estudos mostram que China, Argentina, Argélia e Rússia podem possuir, respectivamente, as maiores reservas mundiais desse gás — EUA e Canadá viriam logo a seguir nesse ranking. O ponto negativo é que o xisto sempre é contestado por conta das variáveis ambientais referentes a sua extração.
Voltando à Rússia, comentei em meu artigo anterior (Sanções à Rússia podem prejudicar a todos) que o calcanhar de Aquiles russo é o setor energético, pois 1/3 da energia russa é comprada pelo bloco europeu. E, trabalhando com um cenário onde a Rússia avança em novos territórios e as sanções e retaliações aumentem, abre-se espaço para uma quebra no fornecimento de energia de fontes russas para o restante da Europa. Independentemente de quem decida pela quebra no fornecimento (Rússia ou UE), isso causaria um aumento de preços significativo na Europa Ocidental, por conta da escassez de energia, e um prejuízo enorme às contas russas, devido à perda das divisas provenientes desse fornecimento.
Eis que países do leste europeu já estão de olho nos EUA para a compra de gás xisto, buscando com isso assegurar uma fonte alternativa de fornecimento, busca essa intensificada justamente após a crise na Ucrânia. O grupo de países composto por Hungria, Lituânia, Estônia e Bósnia-Herzegovina, que terão seus contratos encerrados ano que vem com a Gazprom (maior fornecedora russa), veem na intensificação do debate sobre exportação de gás dos EUA uma nova oportunidade, pois como a Gazprom praticamente detém o monopólio no fornecimento de gás para aquela região, uma possível entrada de fornecedores de gás dos EUA no mercado europeu supriria a baixa proveniente das fontes russas ou, no melhor dos cenários, abriria espaço para competição, garantindo preço abaixo do praticado atualmente. Uma entrada americana no mercado europeu de energia também garantiria aos países do leste maior independência em outras negociações com a Rússia.
No momento, a exportação do gás produzido nos EUA não é vista com bons olhos pela administração Obama, pois como ainda não há um excedente significativo, haveria pressão inflacionária sobre o preço do gás, que poria em risco empregos na indústria. Mas na contramão desse fato, seis contratos já foram firmados pelos EUA para exportação de gás a ser iniciado em 2015, com destino a países da Ásia, o que abre um precedente a favor dos países vizinhos à Rússia. Basta apenas que os terminais fiquem prontos e as operações de exportação poderão ser iniciadas — o prazo de conclusão dos terminais está estimado para o segundo semestre de 2015.
Com os EUA iniciando as operações de exportação de gás teremos início a o que vem sendo chamado de “o mercado global de gás”. Obviamente quem sai na dianteira são os EUA por conta do investimento que vem sendo feito nesse sentido, e trará como recompensa um grandioso mercado, ávido por alternativas de fornecimento. Outra benesse desse mercado é o seu produto principal possuir valor de mercado bem inferior aos atualmente praticados, o que será fundamental no momento de decidir pela troca de fornecedores. Ponto para Obama!
Termino com uma pergunta: estaria o petróleo deixando de ser tão fundamental em nossas vidas?
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