A partir de 2012, por conta das barbeiragens na política do setor elétrico decorrente da MP n° 579, da falta de chuvas, bem como do atraso de obras, tornou-se necessário o maior acionamento das usinas termelétricas, para assegurar o fornecimento de eletricidade ao país. A partir de então, a geração térmica vem aumentando sua participação na matriz elétrica brasileira. Embora a geração hidrelétrica seja ainda predominante, com 71% do total, as demais fontes vêm ganhando espaço crescente. Em 2015, as usinas termelétricas atingiram uma participação de 23% da geração do país, enquanto em 2011 essa participação fora de apenas 5%. A participação das usinas eólicas, apesar de ainda ser pequena, vem também crescendo rapidamente, alcançando 3,6% da geração de eletricidade em 2015.
Em fevereiro de 2016, o Comité de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), visando reduzir o custo da geração, decidiu desligar as térmicas com Custo Variável Unitário (CVTJ) acima de RS 420/MWh, a partir de março. Serão desligadas do despacho na base sete usinas, com capacidade instalada de cerca de 2 mil MWmédios. Essa é a segunda vez que o governo decide pelo desligamento de térmicas mais caras. Em agosto de 2015, decidiu-se desligar 21 térmicas, com CVU superior a RS 600/MWh, trazendo redução 2 mil MWmédios na geração desta fonte. O desligamento das térmicas já era esperado em função da redução do consumo de eletricidade decorrente da combinação do tarifaço com o fraco desempenho econômico.
O consumo de energia elétrica no Brasil em 2015 foi 2,1% menor em relação a 2014. Todas as classes de consumo, com exceção do comercial, apresentaram queda com relação a 2014. Comparando o acumulado de 2015 com 2014, verifica-se que o setor comercial teve um leve crescimento no consumo de 0,6%, enquanto o setor residencial, pela primeira vez nos últimos anos, teve redução de 0,7%. A indústria manteve um comportamento semelhante ao dos últimos anos, com queda de 5,3%
Na Região Nordeste, entretanto, os níveis abaixo dos recordes históricos dos reservatórios das hidrelétricas permaneceram preocupantes e o desligamento das termelétricas foi compensado pelo avanço da geração eólica. Porém, por se tratar de uma fonte intermitente, em função do comportamento do vento, a geração eólica perdeu força no início de 2016, requerendo o retorno das térmicas.
O que tem se notado nos últimos anos é a falta de um planejamento que considere o legítimo papel que cada fonte primária de energia pode desempenhar na matriz elétrica brasileira. Com isto, as políticas praticadas no setor elétrico não maximizam a utilização das diferentes fontes para a geração de energia elétrica, desperdiçando a vantagem comparativa da diversidade energética existente no país, bem como a localização das diversas fontes.
Por exemplo, a atual metodologia dos leilões de energia elétrica não leva em conta as características de cada fonte e muito menos a sua localização. Isto mascara o real preço de cada fonte de energia. O governo precisa entender que os benefícios trazidos pela realização de leilões nacionais, com as diferentes fontes de energia concorrendo entre si, já se esgotaram. Está na hora de se promover leilões regionais e por fontes que, entre outras vantagens, reduziriam o preço da transmissão de energia.
E preciso entender que o Brasil é um país de dimensões continentais. Não tem sentido a construção de uma usina eólica no Nordeste para transportar a energia para o Sudeste, enquanto esta última região dispõe de grande oferta de biomassa. O que diferencia o Brasil de outros países emergentes é essa diversidade energética e a sua dispersão regional. Temos muita água e gás natural no Norte, vento no Nordeste, biomassa no Sudeste e Centro-Oeste, gás natural no Sudeste, vento e carvão no Sul, potencial para a construção de usinas nucleares e sol no país inteiro.
O grande desafio é promover uma política energética que transforme essa vantagem comparativa que a natureza nos deu numa vantagem competitiva. Não faz nenhum sentido um país com essa diversidade energética ter uma das energias mais caras do mundo e, ao mesmo tempo, ficar todos os anos preocupado se vai haver apagâo ou não. A energia no Brasil não deve nem pode ser um entrave ao crescimento econômico.
Outro ponto que precisa de uma discussão mais cuidadosa, para que seja melhor entendido, é o papel das termelétricas a gás natural. Com uma preocupação até justa de não se querer sujar a matriz elétrica brasileira, tem se colocado na imprensa afirmações equivocadas e mesmo erradas sobre qual o papel que o gás natural deve desempenhar na matriz elétrica brasileira.
As usinas a gás natural vão desempenhar daqui para frente três papéis fundamentais para o bom funcionamento do setor elétrico brasileiro. O primeiro é o de regulação do sistema elétrico, na medida em que o governo passou a só autorizar a construção de usinas hidrelétricas a fio d’água. O segundo é o de gerar energia reduzindo os custos de transmissão, especialmente no maior centro de carga do país que é a região Sudeste. O terceiro é prover backup para as fontes intermitentes, como é o caso da eólica, da solar e da biomassa. E para as fontes sazonais, como no caso das hidrelétricas.
Se o país optar por ter uma participação crescente de energias renováveis intermitentes, será necessário aumentar também a participação das térmicas a gás natural, inclusive na base do sistema. Mas isto não será possível sem a implantação de uma política e uma regulação que reduzam as dificuldades quanto à garantia do suprimento do gás, já que nos últimos anos a Petrobras tem sempre alegado não ter disponibilidade do combustível.
Não existe fonte de energia melhor ou pior, mas, sim, um planejamento ruim. Cada fonte de energia tem um papel diferenciado no setor elétrico. O importante é ter térmicas mais limpas e com tecnologias mais eficientes. Este seria o papel das usinas a gás natural e não de térmicas a óleo diesel e combustível. Se no futuro quisermos evitar problemas de oferta de energia, a melhor solução é diversificar a matriz energética, respeitando as características e a localização de cada fonte.
Fonte: Valor Econômico, 16/02/2016.
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