Continuamos no olho do furacão. Não dá para baixar a guarda. A crise política ainda paralisa os agentes, sem perspectivas de reversão, e no front do ajuste fiscal e do monitoramento dos principais indicadores econômicos a situação também requer atenção redobrada.
Na semana passada, iniciamos aliviados pelo comunicado da Standard and Poor’s, confirmando a nota de rating soberano, BBB- com perspectiva estável, mas logo depois nos confrontamos com a deteriorada relação entre a presidente Dilma e o PMDB em dois eventos. No primeiro, ela conseguiu aprovar a correção do salário mínimo pela média do PIB nos últimos dois anos e a inflação do ano anterior; no segundo, no entanto, acabou não conseguindo bloquear o envio da Medida Complementar que altera o indexador das dívidas dos estados e municípios. Isto acabará por representar algum impacto fiscal, o que mobilizou Joaquim Levy, em negociação permanente com os parlamentares. Isto, aliás, é fato. O ministro se transformou no principal articulador político do governo para a aprovação das medidas de ajuste fiscal.
Outros fatos econômicos também foram destaque nesta semana, como o fim da estratégia cambial, baseada na venda de contratos de swap no mercado futuro. Lembremos que esta foi criada em agosto de 2013, devido ao anúncio do fim da política de estímulos nos EUA (QE), com a previsibilidade de “rações diárias” de US$ 500 milhões e veio num decrescente, até chegar aos atuais US$ 500 milhões semanais. Agora, o governo pretende rolar os contratos que forem vencendo, mas não mais colocar novos.
Com isto, o dólar, que chegou a recuar a R$ 3,10 na terça-feira, com o comunicado do S&P, voltou a se valorizar, para algo em torno de R$ 3,20, ainda mais depois dos dados externos de fevereiro, melhores na margem, mas ainda em elevado déficit. Façamos então uma análise destes dados até fevereiro e suas perspectivas futuras, incluindo aqui, também, a taxa de câmbio, ao nosso ver a principal variável de ajuste neste ano.
Dados externos – O saldo em conta corrente, depois de fechar negativo em US$ 91 bilhões em 2014, esboçou uma suave reação neste início de 2015, em 12 meses até fevereiro registrando déficit de US$ 89,9 bilhões (4,2% do PIB), no primeiro bimestre recuando 7,9% contra o mesmo período do ano passado. Contribuiu para isto o recuo das despesas com Serviços (-5,9%) e com Rendas (-14,3%). Nas primeiras, destaque para o recuo das despesas com viagens internacionais, diante do dólar mais valorizado o que encareceu as viagens da classe média, e com transportes (ambos recuando 7,1%). Nas segundas, chamou atenção a redução das remessas de lucros e dividendos (-36%) e a elevação das despesas com juros (15,4%), que devem levar esta conta a se manter em alta neste ano.
A balança comercial pouco melhorou (déficit de US$ 6 bilhões até fevereiro), dado o recuo de 19,4% das exportações impactadas pelo recuo das commodities no mercado internacional, maior do que o das importações (-16,8%), impactadas pelo menor crescimento da economia doméstica.
No que se refere aos investimentos externos diretos chamou atenção a perda de dinamismo no primeiro bimestre do ano (-27%), recuando a US$ 6,7 bilhões, contra US$ 9,2 bilhões no mesmo período de 2014.
Perspectivas – Para o ano confiamos numa recuperação, dada a depreciação cambial em curso (cerca de 20% até março), o aumento da produção doméstica de petróleo, com menos importações, o crescimento menor da economia (projeções de queda de 1% do PIB neste ano) e a recuperação da economia norte-americana, impulsionando, na margem, as exportações de manufaturados. O BACEN projeta a balança comercial positiva em US$ 4 bilhões e saldo em conta corrente negativo em US$ 80 bilhões. A Consultoria Lopes Filho, mais cautelosa, projeta a balança comercial com superávit de US$ 1 bilhão e o saldo em conta corrente em torno de US$ 87 bilhões (3,8% do PIB).
Consideramos como importantes variáveis de ajuste a taxa de câmbio depreciada, que neste ano deve oscilar entre R$ 3 e R$ 3,20 (ou mais), a lenta recuperação da economia mundial e a economia em recessão, o que deve reforçar ainda mais no recuo das importações (além do efeito câmbio). No que se refere às outras variáveis componentes do saldo em conta corrente, a maioria sinaliza queda em relação a 2014.
Sobre o fluxo de capitais, neste ano acreditamos no ingresso líquido de investimentos externos diretos (IED) em torno de US$ 60 bilhões, menor do que em 2014, que foram de US$ 66 bilhões. Boa parte destes investimentos deve ingressar sob a forma de participação, em torno de US$ 50 bilhões, dado o barateamento dos ativos brasileiros em dólar pelo efeito cambial. Os outros US$ 10 bilhões ingressarão sob a forma de Operações Intercompanhias. No fechamento do ano, o ingresso líquido de IED deve equivaler a algo em torno de 69% do déficit em conta corrente previsto (US$ 87 bilhões). Para cobrir esta diferença (31%), acreditamos no ingresso líquido de investimentos em carteira, ainda mais atraídos pelo diferencial entre juros interno e externo. No primeiro bimestre, estes aumentaram 131% contra o mesmo período de 2014.
Sobre a taxa de rolagem das fontes de financiamento (dívidas), ou seja, a relação entre desembolsos e amortizações de curto e médio prazos, no primeiro bimestre deste ano ficou em torno de 106%, evidenciando um cenário confortável em termos de liquidez e de acesso ao mercado internacional neste ano, mesmo com os ajustes relevantes na área macro. Em 2014, esta taxa de rolagem fechou em 154%.
Ressaltemos as nossas reservas cambiais, em patamar ainda confortável, em torno de US$ 372 bilhões, equivalendo a 21 meses de importações ou cinco vezes as amortizações vincendas nos próximos doze meses. No entanto, com o fim da política de swap, é possível que sofram algum impacto, recuando a US$ 360 bilhões ao fim deste ano, caso o BACEN seja obrigado a atuar vendendo no mercado à vista, mas nada que preocupe.
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