Apps como Easy Taxi e ClickBus agregam milhares de usuários em países da Europa, América Latina e Ásia
Em 2012, Vivek Wadhwa, vice-presidente de Inovação e Pesquisas da Singularity University e colunista do “Washington Post”, escreveu artigo prevendo que “até o fim da década, nós veremos alguns Mark Zuckerbergs emergindo das favelas de São Paulo”. Ele pode estar certo. A cada dia o ecossistema nacional de start-ups se torna mais maduro e, hoje, são poucas as pendências que nos separam de grandes centros de inovação, como Israel, Chile e o próprio Vale do Silício. Por problemas que vão das diferenças culturais, passam por questões tributárias e deficiências dos próprios empreendedores, contudo, são poucos os que conseguem internacionalizar seus negócios — ponto central no mercado de tecnologia.
— O empreendedor deve pensar de forma global. Ele deve pensar em adicionar cem usuários ou centenas de milhões de usuários? Eles precisam resolver grandes problemas que afetam grande número de pessoas — diz Amir Shevat, diretor global de relacionamento com start-ups do Google, em recente visita ao Brasil.
O app Easy Taxi é um dos raros exemplos de start-ups brasileiras que conseguiram ultrapassar as fronteiras nacionais e, hoje, pouco mais de dois anos após o lançamento da ferramenta, atua em 32 países e possui mais de dez milhões de usuários em todo o mundo, com frota de aproximadamente 200 mil taxistas cadastrados. São 1,4 mil funcionários espalhados nos escritórios locais. Em vez de mirar grandes mercados, como o americano e de países europeus, a estratégia adotada foi expandir na América Latina, África, Oriente Médio e Ásia, onde os custos de implantação são menores.
Apoio de aceleradora e investimentos
Em quatro rodadas de investimentos, a start-up recebeu aporte total de R$ 145 milhões, sendo que o primeiro, de R$ 15 milhões, foi feito pela Rocket Internet, aceleradora com sede em Berlim bastante criticada no meio por financiar ferramentas que copiam sucessos americanos. Para o Easy Taxi a parceria foi boa.
— Hoje nosso aplicativo é copiado em vários países — diz Tallis Gomes, fundador e codiretor executivo da empresa. — O apoio da Rocket foi fundamental para expandir o negócio. Como eles atuam em vários países, foi mais fácil resolver questões legais para nossa entrada — conta.
Com apenas 27 anos, Gomes é um personagem que se aproxima da previsão de Wadhwa. Nascido em uma família pobre de Carangola, cidade mineira com pouco mais de 30 mil habitantes, ele começou a empreender aos 14 anos, comprando celulares baratos no Mercado Livre e revendendo, com pequena margem de lucro, aos moradores locais. Antes de fundar o Easy Taxi, criou outras duas empresas: uma de criação de jogos em redes sociais e outra, de prestação de serviços on-line.
Para abrir a empresa, o jovem largou o emprego, vendeu seu carro e teve como maior desafio convencer os taxistas a investir na compra de um smartphone para utilizar o serviço.
— Ser empreendedor não é glamour. Eu sou vegetariano, mas fui a churrascos de taxistas para vender a ideia — lembra Gomes. — Joguei futebol com eles, percorri os pontos da cidade tentando convencê-los.
A persistência e as solas de sapato gastas deram resultado. Segundo Gomes, o Easy Taxi está perto de se tornar a primeira start-up brasileira a cruzar a barreira de R$ 1 bilhão em valorização. E o sucesso está intimamente ligado ao projeto internacional da companhia.
— Eu sempre sonhei grande. O nome foi pensado para o mercado internacional. Easy, todo mundo entende, e Taxi, também — diz Gomes. — O empreendedor brasileiro precisa perceber que existe um mundo fora do eixo Rio-São Paulo. Aqui, nós somos educados para passar no vestibular e prestar concurso público. Isso precisa mudar — acredita.
Fernando Prado está seguindo esse caminho. Seu produto de venda de passagens de ônibus pela internet, lançado em agosto do ano passado, se chamava “Busão”, mas de olho em outros mercados, foi rebatizado para ClickBus. Assim como o Easy Taxi, a start-up recebeu investimento da Rocket Internet e já opera em seis países estrangeiros: México, Alemanha, Polônia, Tailândia, Turquia e Paquistão.
— O Brasil é muito grande e, por isso, os empreendedores ficam focados em explorar as possibilidades internas. Mas, com a internet, é possível ir para outros mercados — diz Prado, cofundador e codiretor executivo da ClickBus.
Fernando Prado criou o “Busão”, que depois virou ClickBus para o mercado internacional – Divulgação
E internacionalizar não é um processo simples. É preciso contratar uma equipe local e legalizar as atividades antes de sair em busca de parceiros e clientes. Mas o resultado pode compensar. A ClickBus vende em média 60 mil passagens por mês, e o Brasil responde apenas por metade do volume.
Na Vtex, start-up que vende plataformas de comércio eletrônico, o faturamento em outros países da América Latina cresceu de praticamente zero no ano passado para 10% do total.
— Para a start-up, o importante é crescer — recomenda Geraldo Thomaz, cofundador da empresa. — Para empresas de software como a nossa, o Brasil é pequeno para as possibilidades. Nossas start-ups precisam de mais ambição.
O início da expansão internacional se deu por países do Mercosul. O motivo, explica Thomaz, é o acordo assinado entre os países membros que eliminou a bitributação. O primeiro escritório fora foi aberto no ano passado e, hoje, a empresa está presente em cinco países, além do Brasil: Argentina, Chile, Colômbia, México e Portugal.
Já Fernando Okumura, cofundador e diretor executivo do Kekanto, defende a consolidação das empresas no mercado nacional antes de aventuras no exterior. Criado em 2010, o guia de cidades atua em mais de 15 países e possui equipes próprias no Brasil, Argentina, Colômbia, Peru e México. Mas a internacionalização, diz o empreendedor, depende do plano de negócios traçado.
— No nosso caso, fez sentido. A nossa ambição sempre foi ser uma companhia latino-americana — explica Okumura. — Mas isso não é regra. É mais fácil operar no Brasil. Nós não temos a barreira de língua, entendemos melhor o nosso mercado.
Escalar para outros mercados, aliás, não precisa ser uma regra. O Brasil é um país continental, com mais de 200 milhões de habitantes e muito espaço para crescer. Okumura aponta que o ecossistema brasileiro amadureceu bastante nos últimos anos e, agora, falta apenas uma presença maior de investidores:
— Nós precisamos de casos de sucesso. Nenhuma start-up brasileira abriu capital na Bolsa. Isso é um dos fatores que contribuem para o receio de entrar no Brasil.
Um brasileiro que vem ganhando espaço e reconhecimento no exterior é Marco Gomes, fundador da boo-box. No ano passado, ele venceu o prêmio World Technology Awards na categoria Marketing e entrou para um seleto grupo que inclui Larry Page e Sergey Brin, do Google, e Mark Zuckerberg, do Facebook:
— É um prêmio muito importante para o mercado brasileiro, mostra que tem gente fazendo coisas legais aqui.
A boo-box tem escritório apenas no Brasil, mas metade da carteira de clientes é de empresas estrangeiras. Nascido na periferia de Brasília, Gomes é exemplo de empreendedor que apostou na internet e alcançou o sucesso. Hoje, sua empresa de venda de publicidade compete com gigantes como Google e Facebook e, mesmo assim, consegue seu espaço. A plataforma está presente em 500 mil sites e é acessada por 60 milhões de internautas no país.
— A empresa tem 40 pessoas em São Paulo e compete com os maiores gigantes do mundo. Foi a internet que possibilitou isso — diz Gomes.
Fonte: O Globo
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