Por muitos anos, companhias no Brasil e no mundo têm emitido títulos de dívida (bonds) com selo de sustentabilidade ambiental, os greenbonds, sem obter qualquer vantagem financeira, ou seja, redução no custo dessas operações em relação às emissões de bonds tradicionais. Em outras palavras, os investidores nunca premiaram as companhias com o fato de direcionarem os recursos captados com os chamados greenbonds para projetos sustentáveis.
Além do selo
Agora, um outro tipo de título começou a trazer uma nova perspectiva. Os chamados Sustaintability Linked Bonds (SLB) carregam algo além do que o compromisso com um único projeto, levando as companhias a assumirem metas de “comportamento” em seu negócio como um todo, alinhadas com princípios de responsabilidade ambiental, social e de governança. Os SLBs, ao contrário dos greenbonds, têm permitido que as companhias captem a um custo menor e feito com que esses papéis, quando negociados no mercado secundário, tenham um desempenho ainda melhor, graças a procura deles pelos investidores.
Vale ressaltar que os greenbonds são papéis igualmente sérios, bem estruturados, de modo que os projetos sejam previamente avaliados para verificação da elegibilidade ao selo verde por agências certificadoras, que também rastreiam o destino dos recursos. Mas os especialistas dizem que o mercado de capitais conta, atualmente, com um grupo crescente de investidores que está em busca de compromissos mais amplos das companhias. Os SLBs têm medidas e punições caso haja descumprimento dos compromissos, o que não existe nos greenbonds normalmente.
“Houve uma evolução no mercado com a presença de um investidor mais maduro e que oferece prêmio para aquelas emissões que têm compromissos mais arrojados”, diz o responsável por mercado de renda fixa do Bradesco BBI, Philip Searson. O especialista lembra ainda que nas emissões de SLB, a companhia tem metas a cumprir dentro de um prazo, avaliadas antes do vencimento do papel e que se não forem atingidas elevam o custo da emissão.
“A taxa de juro paga anualmente ao investidor sobe normalmente em 0,25 ponto porcentual e isso faz com que a companhia tenha um compromisso real”, diz. Isso, acrescenta, motiva os investidores a aceitarem uma taxa mais baixa do que os papéis tradicionais ou os greenbonds como retorno.
Mas não é somente na oferta inicial do papel que o benefício aparece. O interesse dos investidores no SLB tem valorizado o preço dos papéis também no mercado secundário. “O efeito positivo de iniciativas que envolvam toda a companhia já é visível”, diz o executivo responsável por mercado de capitais de dívida internacional do Itaú BBA, Pedro Frade Rodrigues.
Modelo
Ele cita que a Suzano, primeira empresa do setor de papel e celulose a emitir bond nesse modelo no mundo, em setembro do ano passado, é o maior exemplo disso. A taxa de juro paga pela companhia para os SLBs emitidos, além de já sair reduzida na largada da operação, segue caindo nas negociações do mercado secundário. De acordo com Frade, essa taxa está atualmente cerca de 0,35 ponto porcentual abaixo de outros bonds tradicionais da Suzano.
“Temos visto nas emissões com selo verde e sustentáveis vários grandes investidores de bolsos específicos participando dessas emissões, que são mais estáveis na construção da demanda, ou seja, menos sensível a aperto de preço, e que, por isso, trazem qualidade para a emissão”, nota Frade. Segundo ele, as companhias que tem buscado os papéis verdes e sustentáveis também tem identificação com os propósitos e não feito emissões apenas atrás de uma vantagem de taxa.
Em janeiro, das 14 emissões de bonds feitas por empresas e bancos brasileiros, quatro foram de SLB e três de greenbonds. Optaram pelos SLB, a Movida, Simpar, a Klabin e a FSBioenergia, que juntas levantaram US$ 1,675 bilhão. O BTG Pactual, o Itaú Unibanco e a Amaggi emitiram outros US$ 1,750 bilhão em greenbonds.
O Bank of America Merrill Lynch (BoFa) destaca que até o momento existe apenas US$ 15,8 bilhões em SLB emitidos globalmente, mas lembra que, além de terem se transformado em um grande tema, têm perspectivas promissoras, permitindo que empresas menores encontrem a possibilidade de acessarem recursos a partir dos compromissos ESG, o que talvez não seria possível por meio de um greenbond. O primeiro SLB emitido foi da Enel, que captou US$ 4,9 bilhões em 2019.
Se for considerado tudo o que foi emitido em bonds relacionados ao tema ESG no mundo em 2020, o total sobe para US$ 500 bilhões, pela primeira vez, de acordo com o BoFa e representando um aumento de 66% frente a 2019. Ainda, os greenbonds dominam, tendo sido responsáveis por 60% dessas operações feitas por empresas e bancos. A expectativa do BoFa é de que este ano, sejam emitidos US$ 600 bilhões em bonds ESG no mundo.
Fonte: “Estadão”, 17/02/2021
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