Tivemos uma trégua na semana passada, diante do bom comportamento da inflação no Brasil. No exterior, também observamos avanços, com a economia norte-americana apresentando bom ritmo de recuperação e a China divulgando indicadores favoráveis, mostrando capacidade de compatibilizar, por enquanto, crescimento e inflação e afastando o risco de hard landing, ou seja, de uma desaceleração mais abrupta da sua economia.
Diante disto, façamos, então, uma breve análise destes dois países, no momento os que mais capitalizam as atenções do mercado no cenário internacional. No caso dos EUA, pela consolidação do seu ritmo de crescimento e pelo possível desmonte da política de estímulos monetários, o chamado Quantitative Easing 3. No caso da China, pela desaceleração da sua economia dadas as mudanças estruturais do seu modelo, agora mais focado em consumo e menos nos investimentos. Ao fim, alguns efeitos destas mudanças sobre a economia brasileira.
Sobre os EUA, as atenções se voltam agora para o desmonte da política de estímulo do Federal Reserve (Fed), baseada na compra de ativos que somam US$ 85 bilhões por mês (mais de US$ 3,4 trilhões em quatro anos). Como já comentei em artigo anterior, com o desemprego recuando a 6,4% da população economicamente ativa (PEA) e a inflação se aproximando dos 2%, em algum momento esta política será alterada, mesmo que de forma gradual, evitando qualquer ruptura (ou estouro de bolha) e a manutenção do ritmo de recuperação da economia norte-americana. Pelos dados mais recentes, a taxa de desemprego encontrava-se, em junho, em 7,4% da PEA e a inflação (CPI), em cerca de 1,1%, pelo anualizado.
Muitos consideram já haver espaço para esse início de mudança da política monetária em setembro. Aguardemos, no entanto, os dados de mercado de trabalho (payroll e a taxa de desemprego), que saem no dia 6 de setembro, para depois buscarmos saber como atuará o Fed no dia 17, mas é possível que este processo só tenha início quando as melhorias do mercado de trabalho se consolidarem e a inflação se aproximar dos 2%, refletindo um real reaquecimento da economia. Em uma primeira análise, o crescimento da economia dos EUA este ano está projetado em 1,9%, e a taxa de desemprego, em torno de 6,6% da PEA. Assim sendo, não será surpresa se este início da reversão da política de compra de ativos ocorra até dezembro deste ano.
O fato é que a trajetória dos T-Bonds (gráfico a seguir) já sinaliza essa mudança da política de afrouxamento e maior aperto, com as taxas de juros de dez anos a 2,6% anuais, neste caso, mirando a demanda por bens duráveis, como carros, e a de 30 anos a 3,7%, mirando o mercado de hipotecas imobiliárias. Cabe ressaltar que a possibilidade de uma elevação do juro, próxima etapa dessa revisão de política monetária, só deve começar no transcurso de 2015.
Falando da China, tudo o que acontece por lá é fruto de um planejamento cioso, estrito e racional. Depois de um boom de crescimento forte nos anos passados, dada a poupança alta, em torno de 40% do Produto Interno Bruto (PIB), e investimentos concentrados em infraestrutura, assim como grande potencial exportador, agora o país muda o seu modelo e começa a se voltar mais para dentro, para o consumo de uma classe média que ascende nos grandes centros urbanos. Neste contexto, o crescimento esperado não pode mais ser de 10%, mas sim próximo a 7%.
Mas quais os reflexos destas mudanças nos EUA e na China sobre o Brasil?
No caso dos EUA, em um primeiro momento teremos o dólar deslizando para um patamar mais alto, acima até dos R$ 2,30 atuais, dada a migração de recursos para um mercado mais seguro, a redução da liquidez global e também pelos desencontros e erros da nossa política econômica. Por outro lado, pelos movimentos recentes, com a conquista de maior autonomia do Banco Central (Bacen), diante da ameaça inflacionária, o juro será elevado, o que deve mitigar essa fuga de recursos para os EUA.
No caso da China, poderemos perder um pouco nas exportações de commodities minerais, mais voltadas para as obras de infraestrutura, mas é possível prever algum ganho nas exportações de commodities agrícolas e proteína, dado o aumento da renda das grandes cidades e do mercado de consumo. Este processo, no entanto, será longo e gradual. Em complemento, mesmo com a desaceleração da China, outros mercados, como o norte-americano, o Japão e, em um segundo momento, a União Europeia, devem acelerar seus crescimentos, o que demandará mais produtos do Brasil, compensando, em parte, eventuais perdas com a desaceleração da China.
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