*com Felipe Salto
O governo enviou ao Congresso proposta de emenda à Constituição para limitar o crescimento do gasto. O objetivo é recolocar as contas públicas em ordem, tarefa árdua depois dos erros do PT. A percepção geral, correta, é que chegou a hora de mudar.
Os gastos federais (sem contar os juros) encerraram 2015 em R$ 1,2 trilhão. O crescimento sobre 2014 foi de quase um ponto percentual acima da inflação.
Nos últimos quatro mandatos presidenciais, as médias anuais de crescimento real da despesa foram: 3,3% (FHC-II); 7,5% (Lula-I); 9,4% (Lula-II) e 3,8% (Dilma-I).
Como se vê, Lula mais do que dobrou a variação das despesas. Em seu segundo mandato, imprimiu ao gasto federal taxa ainda maior, que só se sustentou por causa do transitório crescimento econômico, fruto do aumento dos preços de commodities.
Nada foi feito para reduzir o grau de rigidez do orçamento no período das vacas gordas. Ao contrário, os compromissos do governo só cresceram. Receitas temporárias se transformaram em gastos permanentes.
A dívida pública poderá atingir 100% do PIB em 2020. Mal comparando, trata-se de um transatlântico. As manobras precisam ser iniciadas com muita antecedência. Não dá para dar uma virada como se pilotasse uma jangada.
O ministro da Fazenda tem um desafio bem maior do que seu antecessor. Nestes quase 20 meses, transcorridos desde o início do segundo mandato, as coisas só pioraram: o PIB exibe queda estimada de 8% no acumulado de 2015 e 2016; a massa de salários real vai cair cerca de 11% e a indústria de transformação representará 10% do PIB, mesmo nível de 1947. Uma regressão sem precedentes.
Com a atividade econômica em baixa, a receita cai, o que exige cortes crescentes da despesa. Por essa razão, o mais importante é ter um plano de voo e, em paralelo, tomar medidas mais emergenciais, que concedam ao país o tempo necessário para restaurar inteiramente a seriedade na gestão fiscal.
O teto para o crescimento dos gastos é bem-vindo, mas insuficiente. Em 2015, o avanço inferior à média histórica só foi possível graças à contenção de gastos, mesmo incorporando pagamento de pedaladas.
Os dispêndios com a folha salarial apresentaram queda real de 3,1%. Neste ano, já estamos começando com reajustes salariais. O investimento público, em 2015, despencou 35%, isso sem mencionar a postergação do pagamento do abono salarial.
A verdade é que 14 rubricas do gasto estão sujeitas a regras de vinculação ou indexação. O sucesso do teto para o gasto depende do enfrentamento desse problema estrutural. Não basta dizer que o crescimento da despesa ficará limitado à inflação passada. Isso nunca ocorreu nos últimos 20 anos.
Do lado das receitas, a elevação da Cide e a cessão de direitos creditórios da União (a chamada securitização da dívida ativa) precisam ser consideradas. Vender esses direitos renderia R$ 55 bilhões ao país, nos moldes do projeto de lei nº 204/2016, do então senador, hoje ministro das Relações Exteriores, José Serra.
No campo estrutural, é preciso fixar idade mínima para aposentadoria, desindexar os benefícios sociais do reajuste do salário mínimo, cortar substancialmente os subsídios e as subvenções, interromper os reajustes salariais e as admissões de pessoal.
Sem medidas duras, não sairemos do fundo do poço. O governo precisa deixar claro seu compromisso inarredável com o ajuste. “Jamais ceder, exceto a convicções de honra e bom senso” era o lema de Winston Churchill. Que seja esse o compromisso de Michel Temer.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 17 de agosto de 2016.
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