Morreu nesta terça-feira (28) Ahmed Kathrada, importante ativista na luta contra o apartheid na África do Sul, preso por cerca de 20 anos junto com Nelson Mandela. Neste mesmo dia, estive com um grupo de 20 universitários daquele país, ansiosos por conhecer nosso sistema de educação e pensar em saídas para os desafios que vivem.
Comentei a notícia e se mostraram surpresos em saber que ela fora publicada em jornais brasileiros e, mais ainda, quando lhes disse que muitas escolas e ruas no Brasil receberam o nome de Nelson Mandela. Contei-lhes da vinda do Madiba ao Brasil, no final dos anos 1990.
Na discussão que se seguiu, falamos dos desafios que partilhamos: uma educação básica que tenta progredir, a despeito de limitações na formação inicial e na atratividade da carreira de professores, um ensino médio restrito a poucos alunos e alta taxa de abandono e uma aprendizagem claramente insuficiente.
À medida que apresentava a eles nossa realidade educacional, eles se entreolhavam e partilhavam com exclamações seus próprios problemas. Fizeram muitas perguntas sobre o Enem, que lhes pareceu, numa rápida troca de experiências, um exame mais adequado para acesso ao sistema universitário e gostaram do Enade. Tiveram dúvidas sobre o sistema brasileiro de financiamento do aluno na educação superior privada e pareceram gostar do Prouni.
Mas o que nos pôs realmente em conexão foram os desafios de aprendizagem. Os alunos estão nas escolas, mas não aprendem a ler e interpretar textos, a redigir, a raciocinar matematicamente ou a desenvolver uma mente investigativa, problema presente, em maior ou menor proporção, nos dois países.
Aprendemos muito, os brasileiros presentes e os sul-africanos. Não estávamos analisando os melhores sistemas do mundo ou copiando soluções prontas, mas verdadeiramente nos debruçando sobre o que deve ser resolvido. Em certo momento, eles perguntaram: como vocês estão enfrentando a herança colonial?
Tive que ser franca: não temos o direito de culpar o colonizador por nossos principais problemas, nós construímos em cima dos erros feitos por eles e os agravamos. Independentes desde 1822, já poderíamos ter superado mazelas causadas por um sistema que se fez excludente e continua dando mais oportunidades a quem delas não precisa.
Construímos um sistema educacional desigual, em que há mais vagas em creches para os mais ricos, a escola pública não recebe o investimento de que necessita, a profissão de professor não é valorizada e ainda poucos têm acesso ao ensino técnico e à universidade, que recebe maiores recursos. Isso é o que nos une e deveria nos impelir à ação!
Fonte: ” Folha de S. Paulo”, 31 de março de 2017.
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