Agora é encontrar logo um novo presidente, para fazer exatamente a mesma coisa que Temer fazia — sem os encontros com Joesley
O processo de recuperação da economia brasileira consiste na saída da recessão, já obtida, e na volta do crescimento, ainda por vir. Esse movimento se baseia, no essencial, em cinco políticas.
A primeira é monetária: a forte redução dos juros posta em prática pelo Banco Central.
A segunda se faz pela votação das reformas trabalhista e da Previdência.
A terceira trata do ajuste de contas de União, estados e municípios, já encaminhada com a aprovação do teto de gastos públicos, mas dependente da reforma da Previdência e da lei de recuperação dos governos estaduais.
A quarta perna do processo está nas concessões e privatizações, principal via para a retomada dos investimentos.
O quinto movimento é a reorganização e saneamento da administração pública, incluindo as estatais e bancos públicos. Exemplo maior: a recuperação da Petrobras.
Tudo isso depende de uma complexa combinação de fatores econômicos, políticos e da confiança dos agentes, dos grandes operadores no mercado financeiro até o pequeno empresário.
(E cito este exemplo porque, na última quinta, quando estourava o caso Temer/JBS, eu tratava de uma compra com o proprietário de um comércio de móveis. Ele estava desolado, triste mesmo. Dizia: “Justo agora, parecia que estava melhorando, eu acabo de alugar uma nova loja”.)
E se a crise permanecer por muito tempo? Isso quer dizer o seguinte: e se Michel Temer, abatido politicamente, conseguir resistir nos tribunais e manter-se no Planalto por alguns meses? O que acontece com as cinco políticas listadas acima?
A inflação muito baixa autoriza o Banco Central a continuar derrubando juros. Mas a desconfiança na continuidade da política econômica significa desconfiança na capacidade do governo de equilibrar as contas públicas. Assim, a perspectiva passa a ser de piora do déficit e da dívida do governo. Consequência: sobe a taxa de juros no mercado. Devedores duvidosos pagam juros mais caros. Gastando mais com juros, as contas do governo pioram ainda mais e lá se vai a coisa. Isso reduz o espaço para o BC reduzir juros.
Nem é preciso falar da votação das reformas. O atraso ou, no limite pior, o cancelamento tem o mesmo efeito de gerar descrença no equilíbrio do setor público, sem o qual nada avança.
Idem para o ajuste dos estados, que depende da votação de lei de recuperação no Congresso.
Os leilões de concessões e privatizações não precisam do Congresso. Já existem as regras básicas, que podem ser ajustadas pela administração. Aliás, já foram feitos leilões bem-sucedidos de concessão de linhas de transmissão de energia elétrica.
Ocorre que o sucesso aqui depende da boa participação do capital estrangeiro, já que o nacional anda escasso ou enrolado na Lava-Jato. E a vinda de capital estrangeiro depende, primeiro, da oferta de boas oportunidades e, segundo, da manutenção das regras do jogo. Há oportunidades. Já a confiança no jogo…
A quinta política, reorganização da administração pública, também não depende do Congresso, mas de um governo forte e atuante. Claro que não se aplica ao governo Temer.
Tudo considerado, as forças políticas unidas em torno daquelas cinco políticas — simplificando, o pessoal das reformas e ajuste das contas públicas — precisa de um duplo arranjo. Primeiro, manter de pé a agenda de reformas. Pode atrasar o cronograma de votações, o que, aliás, é inevitável, mas precisa ter algumas datas marcadas. E segundo, claro, encontrar um novo presidente. Isto feito, o pessoal arranja um jeito de substituir Temer, certamente pela via da eleição indireta no Congresso.
Não é fácil, mas há claros movimentos nessa direção. Quando PSDB, DEM e agregados se uniram em torno de Temer e seu PMDB, não estavam aderindo a Michel Temer, mas a uma oportunidade de encaminhar reformas e ajustes, tirar o país da recessão e apresentar-se na eleição de 2018 com a carta da volta do crescimento.
Ora, o objetivo continua o mesmo. O jogo político também — criar condições para o avanço das reformas no Congresso —, mas as cartas foram misturadas de novo. O lance agora é encontrar um novo presidente o mais rapidamente possível, para fazer exatamente a mesma coisa que Temer fazia — sem os encontros com Joesley, sem assessores que, vira e mexe, correm com malas de dinheiro e vão em cana.
Não é simples, mas não há outra saída para as forças políticas que entraram na agenda das reformas. Ou conseguem organizar isso ou a tsunami arrasta todos eles, uma vez que não podem simplesmente aderir ao Fora Temer, Fora reformas. Esse campo já está ocupado.
Portanto, só lhes resta o mote: Reformas, sem Temer.
Os políticos agem mais por necessidade do que por virtude.
Fonte: “O Globo”, 25/05/2017
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