O ambiente internacional é um importante elemento para permitir a travessia do Brasil sem maiores sobressaltos até a aprovação de reformas estruturais e a volta do crescimento econômico. A estagnação da economia torna o País mais vulnerável a ventos de proa do cenário mundial. Basta lembrar as consequências da alta do dólar e dos derivados de petróleo no ano passado, que culminaram na grave paralisação dos caminhoneiros.
Em dezembro do ano passado, discuti que 2019 seria, provavelmente, mais um ano de desaceleração do crescimento mundial. Retorno ao tema, pois novos elementos estão presentes. Alguns mais preocupantes e outros até positivos.
O ritmo de desaceleração global ganhou ímpeto nos últimos meses. Pior, os sinais recentes são de quase estagnação na produção industrial e no comércio mundial, tanto em economias avançadas, como emergentes, cuja performance atual nem de longe lembra a do passado. Não restam dúvidas que a guerra comercial EUA-China e as decisões equivocadas de Donald Trump de isolar os EUA dos parceiros comerciais cobram seu preço. Enquanto isso, a Europa, com escassez de lideranças fortes, não consegue fazer o contraponto.
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A fraqueza do comércio mundial é preocupante porque, aliada às incertezas globais, implica menos investimentos e inovação e, portanto, menor potencial de crescimento do mundo.
A desaceleração na China segue, apesar das várias políticas de estímulo – monetária, creditícia, fiscal, regulatória – conduzidas desde meados do ano passado. A cada rodada de indicadores econômicos mais fracos, novos estímulos são anunciados.
Ainda que essas medidas venham a ser bem-sucedidas em compensar o impacto da guerra comercial, que penaliza as exportações chinesas (20% do PIB), não se pode desconsiderar que fatores estruturais e duradouros também produzem a desaceleração econômica, como a demografia (envelhecimento da população), o menor êxodo rural e a mudança paulatina de modelo econômico.
De quebra, a China enfrenta a chamada armadilha da renda média. Atingir patamares mais elevados de renda per capita exigirá reformas estruturais pró-mercado, reduzindo a intervenção estatal.
Importante ponderar que um acordo para pôr fim à guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo talvez não ocorra tão cedo e quando ocorrer, talvez seja em etapas, enquanto a disputa tecnológica veio para ficar. Mesmo que Trump não se reeleja, o fato é que se trata de uma agenda de Estado, não de governo, ainda que o presidente norte-americano dificulte bastante o diálogo.
Os EUA também dão alguns sinais de desaceleração. Não está claro o quanto ela é provocada pelo aperto monetário promovido pelo Federal Reserve, que deve ter seu impacto máximo na economia este ano, ou pelo fato de a economia estar operando em seu pleno potencial, o que naturalmente limita o avanço. A taxa de desemprego está nas mínimas históricas e, assim, o custo da mão de obra começa a subir, ainda que sem pressionar a inflação.
Talvez o Fed decida cortar a taxa de juros por conta do efeito da guerra comercial sobre a demanda (consumo e investimentos). Difícil, porém, enxergar grande espaço para corte, pois o conflito comercial provocará também pressão de custos e menor potencial de crescimento. Bloquear importações chinesas produz ineficiências.
A inflação baixa e a existência de instrumentos para tentar conter a desaceleração mundial tem sido um alento aos investidores. Bom mesmo seria se isso não fosse necessário. De qualquer forma, este quadro tem proporcionado baixa volatilidade nos mercados globais, o que poupa os mercados e a economia brasileira de maiores solavancos.
Avalio que os mercados estão excessivamente otimistas quanto ao espaço para políticas anticíclicas nos países e, também, quanto à sua eficácia. Isso não ficará claro tão cedo. Como o horizonte temporal dos mercados é curto, de alguns meses, preserva-se a baixa volatilidade dos mercados, o que, por ora, ajuda em nossa travessia. Não convém, porém, contar com a sorte.
Fonte: “Estadão”, 13/06/2019