O próximo dia 27, uma terça-feira, pode ser decisivo para a sobrevivência da Operação Lava-Jato. Nesse dia estão marcados dois julgamentos cruciais, um no Supremo Tribunal Federal, outro no Conselho Nacional do Ministério Público.
A Segunda Turma do STF vai retomar o julgamento do habeas-corpus do ex-presidente Lula, que já tem dois votos contrários, os dos ministros Edson Facchin e Carmem Lucia. O voto do decano Celso de Melo deve ser o de desempate, pois o mais provável é que Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski votem a favor do habeas-corpus.
No Conselho Nacional do Ministério Público, haverá julgamento da tentativa de reabrir um processo contra o coordenador dos procuradores de Curitiba, Deltan Dallagnol.
A coincidência dos dois julgamentos pode ser explosiva, caso os resultados sejam percebidos pela opinião pública como uma tentativa de freio na Operação Lava-Jato.
Mas há também a coincidência por trás dos dois julgamentos, as mensagens trocadas entre Moro e Dallagnol, e entre este e seus colegas procuradores. Conseguidas ilegalmente, através de hackeamento, cujos suspeitos de autoria estão presos, e pelo menos um confessou.
No julgamento do habeas-corpus de Lula, a base é a suposta parcialidade do então Juiz Sérgio Moro. Começou antes da divulgação pelo site Intercept Brasil dos diálogos, e não usa as reproduções como prova, por serem ilegais.
A defesa fez apenas um apensamento dos diálogos aos autos do processo, como a lembrar aos juízes que eles existem. Mas, como foram obtidos de maneira ilegal e não foram periciados, não é possível alegá-los como razão para a anulação do julgamento que condenou Lula. Se não estão nos autos, não estão no mundo, diz-se nos meios jurídicos.
Mesmo assim, eles pairam sobre a cabeça dos juízes como almas do outro mundo, que não existem, mas assustam. Como elementos a pesar no julgamento, mas que, ao mesmo tempo, podem contaminar as decisões.
O caso do Conselho Nacional do Ministério Público é mais grave. A representação formulada contra Dallagnol pelos conselheiro Leonardo Accioly, Eric Venâncio, Luiz Fernando Bandeira de Mello e Gustavo Rocha se baseia nos diálogos publicados, e foi arquivada monocraticamente pelo corregedor Rochadel exatamente por serem inaproveitáveis.
Pois ontem, dois deles, Accioly e Venâncio, pediram a reabertura do caso, para que o plenário decida. Foi escolhido um relator, e no dia 27 ele dará seu parecer, que será votado. O Conselho é formado por 12 membros, sendo que seis são do Ministério Público.
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Por enquanto, tudo indica que não há maioria para punir Dallagnol. Mas alguns membros do Conselho terão que se submeter ao Senado para renovação dos mandatos, e esse pode ser um fator de pressão ponderável, já que neste momento estão unidos para conter Lava-Jato o Congresso, a OAB, o STF, todos com representantes no Conselho.
Mesmo os membros do Ministério Público decidirão submetidos a esse estresse. Punições de processos disciplinares vão de advertência à expulsão do Ministério Público, mas todos os a que Dallagnol responde podem, no máximo, provocar uma advertência, segundo a avaliação de especialistas.
Interessante é que, nessa divulgação de trocas de mensagens entre Dallagnol e seus companheiros de Curitiba, ele ressalta a importância do apoio da opinião pública à Lava-Jato, para frear a ação de ministros do STF e de políticos.
Pois para o dia 25, um domingo, está sendo convocada uma manifestação nacional de apoio a Sérgio Moro e a Dallagnol, e contra a libertação de Lula. Ao mesmo tempo, há um movimento no Senado para abrir uma CPI já apelidada de Lava-Toga.
Como só os senadores podem processar os ministros do Supremo, essa é uma reação política para contrabalançar a pressão contra Moro e os procuradores de Curitiba. Moro continua o ministro mais popular do governo Bolsonaro, e Dallagnol, embora considerado pelo presidente “um esquerdista tipo PSOL”, tem apoio até de seus seguidores para ser indicado como Procurador-Geral da República.
Fonte: O Globo, 14/08/2019