Em discussão no Congresso, a retomada da possibilidade de prisão após condenação em segunda instância tem apoio da maioria dos parlamentares. Placar do jornal O Estado de São Paulo aponta 51 senadores e 290 deputados favoráveis à tese – 341, de um total de 594 representantes. No Senado, já há aval declarado para a aprovação de uma proposta de emenda à Constituição, enquanto que na Câmara dos Deputados faltariam apenas 18 votos para alcançar o mínimo exigido, sempre em dois turnos.
O total de parlamentares que não quiseram responder indica que uma PEC sobre o tema tem chances de receber o aval do Congresso. São 119 deputados e 21 senadores nesse grupo. Outros 56 se declaram publicamente contra em ambas as Casas.
Em debate no Legislativo desde fevereiro, quando o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, apresentou seu pacote anticrime, a proposta de estabelecer em lei a prisão após condenação em segunda instância ganhou relevância após o Supremo Tribunal Federal vetar essa possibilidade antes do trânsito em julgado (quando esgotados todos os recursos). No dia 7, em um julgamento apertado, a Corte mudou o entendimento em vigor desde 2016 e abriu caminho para a libertação, entre outros, de presos por corrupção, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
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Como reação, congressistas entusiastas da Operação Lava Jato passaram a pressionar os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para pautar propostas que estabeleçam uma regra definitiva sobre o tema. Mais avançada, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou uma PEC, na semana passada, nesse sentido. De autoria do deputado Alex Manente (Cidadania-SP), a proposta altera os artigos 102 e 105 para reduzir a possibilidade de recursos.
Versão atual da PEC é mais palatável, diz autor da proposta
O texto foi o segundo proposto por Manente. O primeiro, que mexia no artigo 5.º da Constituição – o que trata sobre a “presunção de inocência”, considerada por parte da classe jurídica como cláusula pétrea -, foi descartado pelo risco de nova judicialização.
“Essa PEC é mais palatável aos deputados. Prevê que o trânsito em julgado se dê já na segunda instância. Dessa forma, as cortes superiores, como o Superior Tribunal de Justiça e STF, só poderiam analisar ações revisionais e não mais recursos especiais”, disse Manente. O placar na comissão foi folgado: 50 a favor e 12 contra.
A avaliação, no entanto, de que a alternativa não fere a Constituição não é consenso. Para o líder do PCdoB, Daniel Almeida (BA), a nova PEC de Manente é um “atalho”. “Estão querendo discutir atalhos perigosos. Isso é cláusula pétrea”, afirmou Almeida.
O partido é um dos autores da ação que levou o Supremo a mudar de posição. Além do PCdoB, as bancadas do PT e do PSOL também são majoritariamente contrárias. Líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS) disse que todos no partido votariam de forma contrária, mesmo que parte não tenha respondido ao Estado.
Do outro lado, alguns partidos favoráveis à tese da possibilidade de prisão após condenação em segunda instância fecharam questão. É o caso do Novo, do Patriota e do PV, cuja líder, deputada Leandre (PR), se disse preocupada apenas com a escolha do “ordenamento jurídico” adequado. “Temos de ver qual artigo da Constituição podemos alterar sem ferir os direitos individuais. Essa sensação de impunidade que as pessoas começaram a sentir de novo, após a decisão do Supremo, merece ser abordada”, disse a parlamentar do PV.
Para o cientista político Marco Antonio Teixeira, da FGV-SP, a soltura do ex-presidente Lula esquentou o debate. “Há uma pressão enorme da sociedade e dos grupos favoráveis. O Congresso tende a dar uma resposta. Isso (resultado do placar) significa que essa pressão está funcionando”, disse o professor, que esperava uma Câmara dividida. “Essa posição majoritária a favor está mais alta do que eu imaginava”, afirmou.
+ Debate sobre prisão em segunda instância reforça necessidade de melhorar legislação
No Senado, opção é por mudança no Código Penal
No Senado, a CCJ cogita votar outra opção: uma mudança no Código de Processo Penal para disciplinar a execução da pena após a condenação em segunda instância. Por se tratar de um projeto de lei, a matéria pode ser aprovada no plenário da Casa com maioria simples (41 votos), enquanto uma PEC exigiria aval de 49 senadores.
O senador Cid Gomes (PDT-CE) se mostrou favorável, desde que a mudança se dê por uma mudança no Código de Processo Penal. “Algo que definisse por tipificação de crime quando se daria o trânsito em julgado. Quando for julgamento de júri, por exemplo, o trânsito em julgado já se daria em primeira instância.”
Na avaliação do cientista político Marco Aurélio Nogueira, da Unesp, o formato do texto deve ser levado em consideração. “Uma PEC mexe com preceitos constitucionais. É provável que ela entre numa dinâmica de apreciação jurídica e volte para o Supremo”, afirmou Nogueira. “O placar é significativo, mas, se a dinâmica for só de jogar para a plateia, de agradar a opinião pública, não vai ter efetividade”, avaliou.
Fonte: “EXAME”