Por que está o Brasil condenado ao mais longo esforço anti-inflacionário da História universal? Por que esta saga nacional de duas ou três décadas, uma luta heroica de um povo por sua moeda, se planos de estabilização bem-sucedidos se consolidam em apenas dois ou três anos? Por que permanecem obscenamente altas as taxas de juros brasileiras?
A resposta é simples: por falta de sólidos fundamentos fiscais. A essência de uma estabilização rápida e com pouco sacrifício da produção e do emprego é a fulminante reversão das expectativas inflacionárias. Um novo regime fiscal, robusto e sustentável, reequilibra a economia a uma taxa real de juros substancialmente mais baixa, facilitando o trabalho do banco central. O desabamento simultâneo das expectativas de inflação e dos juros reais de equilíbrio permite ao BC praticar também juros nominais dramaticamente mais baixos dois ou três anos após o disparo do programa de estabilização.
Nada disso ocorreu no Brasil. O Antigo Regime já afundava em crise inflacionária. E as pressões de uma democracia emergente por maiores gastos sociais exigiam, além da descentralização de recursos fiscais, ajustes na hipertrofiada engrenagem administrativa federal. Em síntese, uma reforma do Estado. Um enfrentamento de interesses e privilégios do Antigo Regime pela Nova República. Coisa que políticos despreparados em matéria econômica e economistas embriagados por assuntos políticos jamais fariam.
O que ocorreu foi uma bem brasileira simbiose entre a social-democracia e o conservadorismo. Disparou a “inclusão orçamentária”: não apenas a inclusão social dos mais pobres, mas também a acomodação de novos grupos de interesse nos orçamentos públicos, sem a exclusão de antigos privilégios. Tudo em nome da “governabilidade”. Os gastos públicos vão de pouco mais de 20% para quase 40% do PIB desde a redemocratização. Em meio ao descontrole de gastos, torna-se o Banco Central de Gustavo Franco, Armínio Fraga e Henrique Meirelles o verdadeiro herói da saga anti-inflacionária brasileira.
Esse é o pano de fundo para a recente controvérsia sobre o controle de gastos anunciado pelo Ministério da Fazenda e o cavalo de pau que o BC deu nos juros. Se vamos mesmo mudar o rumo em direção a melhores fundamentos fiscais e menor aperto monetário, melhor seria um cavalo de pau nos gastos públicos e alguma prudência na redução dos juros.
Fonte: O Globo, 12/09/2011
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