A única coisa que cresce mesmo no Brasil é a arrecadação de impostos
Estão dizendo, governo e bancos, públicos e privados, que nada mudou com a poupança. Mudou, sim. E para pior, do ponto de vista do poupador. Dizem que mudou “apenas” a fórmula de cálculo dos rendimentos para poupanças novas. Pois é, só que a nova fórmula dará um resultado menor para o poupador, sempre que a taxa básica de juros for de 8,5% para baixo.
A melhor verdade, digamos assim, seria dizer que a nova fórmula é positiva para o conjunto da economia, pois a regra velha estabelecia um piso informal para a taxa geral de juros. Esta não poderia cair abaixo de 8,5%, pois isto tornaria a poupança muito mais rentável que outros investimentos, desequilibrando o sistema. Com a alteração, a taxa geral pode ir mais baixo, beneficiando toda a economia.
Mas derrubar aquele piso significa, necessariamente, reduzir o rendimento da poupança. O que foi feito. Só para os novos depósitos, certo. Mas para o pequeno poupador, sobretudo, justamente agora quando a poupança ia pagar mais que as outras aplicações, não vai mais.
TORCIDA DO FLAMENGO?
O dólar vai a R$ 2, e o ministro Mantega diz que ele e a torcida do Flamengo estão satisfeitos com isso.
No mesmo dia, a Petrobras divulga seu balanço – com queda no lucro e sem alcançar metas de produção – e diz que o dólar a R$ 2 prejudica a estatal.
A empresa tem uma dívida líquida em dólares – US$ 76 bilhões – a uma taxa de câmbio flutuante. Ou seja, com o dólar mais alto, a dívida medida em reais fica mais cara. A Petrobras precisa agora de mais reais para pagar as prestações.
Além disso, a empresa mais importa do que exporta. Logo, vai pagar mais caro também nessas compras externas.
Alguém poderia dizer que a Petrobras não faz parte da torcida do Flamengo. Mas faz. É patrocinadora, até.
Outro detalhe: Mantega é o presidente do Conselho da Petrobras e voltou a dizer que o preço da gasolina não vai aumentar. Já diretores da estatal dizem que estão amargando prejuízos e que o preço precisaria aumentar.
Também não devem ser flamenguistas os brasileiros que viajam para o exterior, especialmente as novas classes médias que se beneficiavam da tal “bolsa Miami”.
Certo, o ministro tem uma meia verdade quando diz que o dólar caro beneficia uma parte da indústria brasileira, pois os importados ficarão mais caros e o produto local – que já era mais caro – fica mais competitivo. Sim, mas todos, nacionais e importados, vão sair mais caros para os consumidores, flamenguistas ou vascaínos.
Por outro lado, espera-se que o dólar mais caro turbine as exportações industriais brasileiras. Mas: o mundo está crescendo menos e, pois, comprando menos; a indústria brasileira continua não competitiva por conta do custo Brasil (impostos e infraestrutura); o governo brasileiro não consegue (nem quer) fazer acordos de livre comércio com nenhum país.
Periga a gente ficar mais com o lado negativo do dólar caro.
Resumo até aqui: tudo em economia tem verso e reverso. Pode-se dizer que mudança na poupança e no dólar têm efeitos positivos neste ou naquele setor. Mas é falso, muito falso, dizer que é bom para todo mundo.
CRÉDITO?
O argumento parece simples: com taxas de juros menores, os consumidores tomarão mais dinheiro emprestado, comprarão mais, e isso movimentará a economia.
Dados da Serasa Experian, entretanto, mostram que em abril último diminuiu o número de pessoas que procuraram crédito e aumentou a inadimplência. Explicação: famílias já muito endividadas estão mais preocupadas em colocar os carnês em dia.
BAIXANDO A BOLA
Não faz muito tempo, o governo garantia que o país cresceria 4,5% neste ano, com inflação a 4,5% (a meta oficial), e tudo isso com o dólar mais caro e os juros mais baixos.
Agora, o ministro Mantega diz que um “piso” de crescimento de 2,7% (resultado do ano passado) já está muito bom num mundo difícil.
E o presidente do BC, Alexandre Tombini, lembra, en passant , que a inflação ficou abaixo dos 5% em apenas três anos.
Combine os dois comentários, e o que se segue? Estão preparando o ambiente para menos crescimento e mais inflação, como no ano passado. E, de novo, a culpa é dos gringos, claro.
A única coisa que cresce mesmo no Brasil é a arrecadação de impostos. Ano bom, ano ruim, e a receita do governo sempre sobe acima da inflação.
A presidente Dilma reconhece que temos um problema de impostos altos, como na energia, por exemplo. Promete reformas pontuais, mas não propriamente uma redução da carga, pois há compromissos com gastos públicos maiores.
Fonte: O Globo, 17/05/2012
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