Passado um ano da eclosão da crise, com a quebra do Lehman Brothers, já é possível uma reflexão sobre as principais lições tiradas e algumas observações sobre como se dá a retomada da economia global e, em especial, da brasileira.
* A tese de que “banco grande não quebrava” perdeu um pouco a credibilidade, depois que o Lehman quebrou, gerando uma crise sistêmica nos setores bancários dos países ricos. Mesmo assim, a pronta atuação das autoridades no mundo se mostrou acertada, com o restabelecimento lento dos canais de crédito, além de medidas de estímulo fiscal contra cíclico, mesmo que às custas de um forte endividamento público. O que se questiona nos mercados, no entanto, é saber como será a reação das economias depois que estas medidas começarem a perder o efeito.
* Esta crise no ensinou de que a estreita regulação nos sistemas bancários deve ser uma regra essencial para a saúde das economias. Além disto, não existe política monetária, ou ciclo de crédito, que dure para sempre (como muitos chegaram a imaginar), sempre devendo haver uma postura cautelosa das autoridades monetárias. No caso norte-americano, as pressões inflacionárias, geradas pela demanda mundial aquecida e a alta do petróleo – foi a US$ 140 em meados do ano passado -, acabaram como um estopim para o aperto monetário posterior e o desabamento do “castelo de cartas”, criado com os empréstimos subprime.
* A retomada da economia norte-americana segue lenta com o consumo ainda de lado pela profundidade da recessão ocorrida. Entre o terceiro trimestre do ano passado e o segundo deste ano, esta economia despencou mais de 4% no seu PIB trimestral, estando, portanto, ainda em recessão. Dados recentes mostram alguma reação, mas o desemprego continua como um problema, com a taxa ameaçando passar de 10% da PEA, assim como a pouca confiança dos consumidores, mais preocupados neste momento em fazer um colchão de segurança diante das inseguranças do futuro. Para Ben Bernanke, contudo, o fim da recessão se aproxima, mas é preciso atenção na necessidade de uma reforma financeira profunda, com maior controle sobre a contabilidade dos bancos e nas remunerações dos executivos.
* Sem dúvida que os emergentes devem liderar esta retomada, com a China devendo crescer mais de 8% neste ano, seguida pela Índia (6%), mas ambos os países precisam estimular mais os seus mercados internos, dependendo menos da demanda externa e do grande volume de investimentos públicos em infraestrutura. Mesmo assim, um receio surgido por estas semanas deriva da ameaça de uma nova onda protecionista por parte dos países ricos, com o surgimento do imbróglio entre China e EUA. Neste caso, os norte-americanos querem taxar os baratos produtos chineses em 35%, bem acima dos 4% atuais, em função da maior pressão dos sindicatos, receosos com as perdas contínuas de emprego industrial com a crise e a invasão dos chineses.
* Falando da retomada, no caso brasileiro, o PIB avançando 1,9% no segundo trimestre contra o anterior colocou fim à tão temida recessão e sua intensidade. Este crescimento veio impulsionado pelo consumo das famílias e a indústria, ambos crescendo 2,1%, em muito, estimulados pelas medidas de isenção fiscal adotadas, com a redução das alíquotas do IPI para eletrodomésticos e automóveis. Atenção, no entanto, deve ser dada ao desempenho do segundo semestre, já que o consumo até vem reagindo, mas os investimentos se mantiveram retraídos neste período. Contra o trimestre anterior, a Formação Bruta de Capital Fixo se manteve estável, recuando 17% contra o segundo trimestre do ano passado e acumulando uma queda de 15,6% no ano. Nesta base de comparação, o tombo da indústria ainda é alto, recuando 8,6%, com o PIB geral recuando 1,5% no acumulado.
* Isto nos leva a constatar que a recessão por aqui foi curta, um surto, com o segmento industrial como o mais impactado. Agora, na retomada, este vem se recuperando, mesmo que lentamente. No calor da crise entre setembro e dezembro do ano passado, a indústria se viu com excesso de estoques, diante de uma programação de vendas que acabou não se confirmando, além da retração das exportações, diante da seca do crédito. No acumulado ao ano, até julho, as vendas externas recuaram 12%, com os bens manufaturados despencando 27%, confirmando este impacto na indústria. Nesta retomada, no entanto, decisivo vem sendo o escoamento para o mercado interno, com o consumo não tão castigado, além das exportações de commodities para a China. As exportações de básicos avançaram 6,5% na mesma base de comparação anterior. O comércio varejista não foi tão impactado, pela preservação das políticas de transferência de renda do governo, os reajustes aos servidores e do salário mínimo, o esforço de manter o crédito fluindo, assim pela forte queima de estoques do primeiro semestre.
* Isto nos leva a crer que a economia brasileira acabou se saindo melhor do que outros países nesta crise, até porque manteve seu sistema bancário preservado e pouco alavancado, assim como suas políticas de renda. Preocupa, no entanto, o baixo volume de investimentos, já que a Utilização da Capacidade Instalada segue num patamar baixo, se comparada a setembro do ano passado, tendo recuado de 85% para 81% no mês passado, mas poderia evoluir rapidamente diante de uma demanda crescente. Sendo assim, o fantasma da inflação voltaria a assombrar, já que a demanda responde mais rapidamente aos estímulos monetários e fiscais do que a oferta. Por isto, em algum momento, o Banco Central terá que dar uma freada de arrumação no ritmo da economia, voltando a elevar o juro. Com a deterioração fiscal sendo fato, fruto do aumento dos gastos com custeio, não restará a autoridade monetária outra saída a não ser fazer isto no ano que vem. Aqui na Lopes Filho, acreditamos numa taxa de juros a 9,5% ao fim de 2010. Lembremos que o corte foi de cinco pontos percentuais, de 13,75% para 8,75% entre janeiro e meados deste ano.
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