Semana passada, comentei declaração do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que, aludindo à taxa de juros praticada no cartão de crédito, afirmou serem eles “escorchantes e injustificáveis”. Dois dias depois, jornais noticiaram que o Bradesco cortara-os em mais de 50% e o juro que era de 14,9% ficaria reduzido para 6,9% ao mês. Como dou ao caso a maior importância, prossigo hoje as considerações da semana finda. Pelo que li, unicamente as palavras ministeriais estampadas no jornal tiveram a virtude de mover a casamata financeira, uma vez que só um dos maiores bancos que atuam entre nós reduziu o montante das taxas a menos de 50%, como foi divulgado. Diante de exemplo tão significativo, imaginava eu que os demais bancos seguiriam a trilha aberta pelo Bradesco, mas até o momento em que escrevo não tive notícia de que outros o tenham imitado. Parece que estão a estudar ou coisa parecida. Mas, vamos aos fatos.
A primeira observação diz respeito à taxa de 14,9%, coisa que vinha de anos, sob os olhos compassivos do Banco Central, e no entanto as poucas palavras do ministro, só elas, foram bastantes para provocar a redução a 6,9%. Nada mais foi necessário para que o milagre se desse. Decorre daí que, se o banco satisfaz-se com juros de 6,9% ao mês, é de deduzir-se estes lhe são suficientes.
Nesta altura, não importa questionar se a redução em mais de 50% no valor das taxas derivou da generosidade do banco fixando-as em 6,9% quando eram de 14,9%.
As observações até aqui deduzidas estão a evidenciar que não faltavam razões ao ministro da Fazenda ao afirmar que os juros observados no cartão de crédito eram escorchantes e injustificáveis, 14,9% ao mês eram a usura mais usurária que se poderia conceber. E a prova disso está no fato de que um dos nossos grandes bancos reduziu-a em 50%, caindo de 14,9% para 6,9% ao mês, valha a insistência, sem receio de sofrer abalo algum.
O que importa é que ao ano, conforme o caso, o juro ultrapassava de 100% e de 200% o que excede todos os limites do abuso do direito e, não obstante, foi praticado sem qualquer censura do Banco Central. Mas não só dele, também o ministro da Fazenda, que só agora, em setembro, foi capaz de ver que os juros no cartão de crédito eram escorchantes e injustificáveis.
Faz mais de 300 anos, no sermão da Primeira Dominga do Advento, em 1650, disse o Padre Vieira que “são as omissões os mais perigosos de todos os pecados”, chamados “pecados do tempo” e seus autores de “ladrões do tempo”.
Para concluir, com esses juros não há competitividade possível.
Fonte: Zero Hora, 01/10/2012
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