Boas leis contribuem para que alguns países tenham um desempenho melhor que outros, consigam maiores taxas de crescimento em suas economias, inflação mais baixa e distribuição de renda equalitária. É o que defende o livro “O Direito como instrumento de política econômica – propostas para um Brasil melhor”, organizado pelo economista Roberto Luis Troster e as juízas Carolina Rossi e Valeria Lagrasta. A obra reúne 40 ideias de profissionais da área jurídica que, se implantadas, poderiam aprimorar a legislação brasileira e ampliar o bem-estar da população.
Os artigos, escritos pelos organizadores e alunos do mestrado profissional do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social (Cedes) no primeiro semestre de 2021, cobrem áreas diversas. Vão da reciclagem do lixo eletrônico ao abuso dos preços nas passagens aéreas, passando pela cobrança de impostos e o acesso à saúde.
“O Brasil está preso a um quadro institucional que apresenta falhas”, diz Troster ao Valor. Um exemplo é a guerra fiscal em que cada estado e município fixa regras tributárias dificultando o trabalho das empresas, afirma. “Um imposto de valor adicionado único, com poucas alíquotas e uniformes em todo o território, ajudaria muito.”
Troster, que foi economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e é professor titular do Cedes, considerado um think tank de soluções para questões sociais, também assina artigo sobre política bancária. No texto, diz que o Sistema Financeiro Nacional é disfuncional, e o que poderia ser um acelerador da economia acaba sendo um freio.
O Brasil é o único país do mundo que tributa dívidas, justifica. “A transparência é outra ‘jabuticaba’, com taxa mês, ano, dias úteis, dias corridos e custo efetivo.”
Ainda na lista de temas atuais, a obra inclui trabalho da juíza Juliana Maria Finati sobre a fixação de um preço máximo para as passagens aéreas. “No dia 10 de agosto, um tíquete de São Paulo para o Rio de Janeiro, dependendo do horário e da companhia, pode custar até R$ 2,4 mil”, destaca Troster. “É mais caro do que ir para Manaus, no mesmo dia.”
Isso indica, diz o economista, que na rota mais concorrida as empresas abusam do usuário. A solução à mesa é colocar um parâmetro entre o valor máximo e o mínimo, defende. “Algo como uma liberdade de preços, mas o máximo não pode ser mais do que o dobro do mínimo.”
O livro também avança em questões atuais ou em formação, caso do mercado de criptomoedas e a tributação sobre robôs. Os planos para taxar máquinas inteligentes já fazem parte de debates tributários na academia e em outros países, diz Troster. “É uma forma de obter recursos para políticas de compensação do desemprego, causado pela tecnologia.”
Já em relação às criptomoedas, o estudioso argumenta que deveriam ser tributadas da mesma forma que os demais ativos. “Não há uma razão lógica para que não seja assim.” De acordo com relatório da Visa, a movimentação de criptomoedas atingiu cerca de US$ 1 bilhão em todo o mundo, nos primeiros seis meses do ano.
Entre as propostas reunidas no livro, sendo que quase metade versa sobre mudanças no judiciário, Troster afirma que as medidas para tornar o sistema de leis brasileiro mais eficiente deveriam ser prioridade. “O judiciário tem mostrado uma proatividade em se adequar, quando aparecem oportunidades”, afirma.
Além de mais projetos sobre regras tributárias, o organizador diz que a obra poderia ter ainda sugestões sobre a distribuição dos recursos da União para estados e municípios. “Que deveria ser em função do número de habitantes das unidades e dar mais flexibilidade a cada ente, na alocação do dinheiro.”
Como professor da primeira turma de mestrado profissional do Cedes – em que mais de 50% dos alunos são juízes -, Troster diz que ficou impressionado com o interesse do grupo em economia e com a vontade de transformar novas decisões sobre temas de impacto.
A primeira palestra da Aula Magna, já disponível para assinantes do Clube Millenium, é com o economista Roberto Troster, sobre “Como funciona a Inflação”. Confira!
Em uma das últimas aulas, sobre a recessão, falou-se da crise de inadimplência no Brasil, lembra. “São mais de 5 milhões de empresas e 60 milhões de cidadãos ‘negativados’.” A discussão já motivou a criação de um grupo de trabalho que investiga o assunto e deve originar um novo livro de sugestões, previsto para setembro.
“Serão propostas que podem ajudar bancos, empresários, governo e cidadãos a diminuir a inadimplência e suas consequências”, afirma Roberto Luis Troster. “Mudando as regras, melhora o jogo.”
Fonte: “Valor Econômico”, 27/08/2021
Foto: Luis Ushirobira/Valor