A OAB Nacional ajuizou no Supremo Tribunal Federal a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 44) em razão da falta de regulamentação do artigo 37, inciso V, da Constituição Federal. O dispositivo disciplina as condições e os percentuais mínimos dos cargos de confiança ou em comissão no âmbito da Administração Pública que devem ser ocupados por servidores de carreira. A propositura da ação foi aprovada pelo Conselho Pleno em setembro.
O presidente nacional da OAB, Claudio Lamachia, destaca que a ação vai ao encontro da permanente defesa que a entidade faz pelo uso racional do dinheiro público, de modo a diminuir o inchaço dos chamados “cargos de confiança”.
“No momento em que faltam recursos para a prestação de serviços básicos à sociedade, como educação, segurança, saúde e justiça, cabe aos gestores o comedimento na nomeação de cargos que muitas vezes são supridos apenas para satisfazer os acordos políticos, sem que o interesse coletivo seja levado em consideração”, asseverou Lamachia.
A proposta, nascida por sugestão elaborada no Colégio de Presidentes de Seccionais da Ordem realizado em Florianópolis (SC), em março de 2015, teve como relatora a conselheira federal por Pernambuco Adriana Coutinho. Em seu voto, Adriana lembrou que a ausência de norma regulamentadora impede a plena vontade exposta na Constituição Federal.
“O próprio Supremo Tribunal Federal, ao enfrentar tema idêntico, decidiu que deve haver uma relação clara e suportável financeiramente. Países populosos como os Estados Unidos, com 300 milhões de habitantes, possuem apenas 7 mil cargos em comissão, enquanto o Brasil, com 198 milhões de habitantes, tem a soma impressionante de 600 mil cargos em comissão”, contabilizou a relatora em seu voto.
A OAB argumenta que a Constituição veda a possibilidade de ocupação desses cargos indistintamente por particulares, com base nos princípios do concurso público, da moralidade administrativa, da isonomia, do interesse público, da proporcionalidade e republicano. Acrescenta que passados quase 20 anos da promulgação da Emenda Constitucional n. 19/1998 – que atribuiu a atual redação ao inciso V do artigo 37 – ainda não há lei ordinária para regulamentar o dispositivo.
“À luz da isonomia, a Constituição Federal determinou que a investidura em cargo público depende de aprovação em concurso. O objetivo da norma é dispensar tratamento igualitário para todos os cidadãos brasileiros, garantindo igual oportunidade de ingresso em uma carreira pública. Contudo, o art. 37, inc. V, da CF atribuiu ao legislador ordinário a competência para regulamentar as condições e o percentual mínimo dos cargos comissionados que devem ser ocupados por servidores efetivos”, afirma a OAB na ação.
Para a OAB, tal regulamentação já foi objeto de várias leis estaduais, muitas delas julgadas inconstitucionais pelo STF e salienta que a jurisprudência do Tribunal entende que a exigência de concurso público seja implementada com maior rigor, de forma a restringir a ocupação de tais cargos por não concursados.
“Tramita, desde 2014, no Senado Federal o Projeto de Lei n. 257 de autoria do senador Cássio Cunha Lima com o escopo de normatizar a quantificação dos cargos em comissão. A proposta sugere que 50% desses postos sejam ocupados por servidores de carreira. Ainda quanto à atuação legislativa, há no Senado Federal, desde 2015, a Proposta de Emenda Constitucional n. 110 que visa alterar o atual art. 37. Ela pretende restringir a quantidade de cargos em comissão na administração pública, os quais não poderão superar 1/10 dos cargos efetivos de cada órgão, reservando-se a metade aos servidores de carreira e, quanto aos demais, o ingresso se sujeitará a processo seletivo”, exemplifica a OAB.
“Após a análise do tema pela CCJ, a PEC foi encaminhada ao Plenário daquela Casa por mais de 19 vezes,6 entretanto, não foi votada. A morosidade e a não priorização da matéria pelo Congresso Nacional propicia a quantidade excessiva de cargos de livre nomeação e exoneração na Administração Pública. A ausência de parâmetro objetivo quanto ao percentual acarreta na dificuldade de fiscalização do número exorbitante dessa modalidade de contratação”, afirma a Ordem. A ADO menciona estudo que aponta a existência de aproximadamente 100 mil cargos comissionados na Administração Federal.
DADOS
Segundo dados do Tribunal de Contas da União, a administração pública federal gasta R$ 3,47 bilhões por mês com funcionários em cargos de confiança e comissionados. Esse valor representa 35% de toda a folha de pagamento do funcionalismo público da União, que é de R$ 9,6 bilhões mensais. “Em 65 dos 278 órgãos federais analisados, o percentual dos cargos ad nutum ultrapassa 50% do total de servidores. Em tais casos, o número de pessoas exercendo posições de comando era superior ao número de comandados, o que é ilógico sob o ponto de vista organizacional”, mostra a OAB.
Assim, pede na ADO a concessão de liminar para que o presidente da República, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal sejam notificados e manifestem-se em cinco dias e para que seja fixado um prazo para que os Poderes Executivo e Legislativo elaborem lei estabelecendo os percentuais mínimos de cargos comissionados que devem ser ocupados por servidores de carreira no âmbito da administração pública, nos termos do artigo 37, inciso V, da Constituição Federal.
No mérito pede a procedência da ação para que seja declarada a inconstitucionalidade por omissão, de forma a fixar um prazo de 18 meses para que o Poder Executivo elabore o projeto de lei e o Congresso Nacional aprove a matéria.
O relator da ação é o ministro Gilmar Mendes que, diante da relevância da matéria adotou o rito abreviado previsto no artigo 12 da Lei 9.868/1999, para levar a ação diretamente ao Plenário para julgamento de mérito, dispensando a análise de liminar.
Fonte: “Contas Abertas”
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