No momento atual da corrida presidencial, o melhor panorama para que um(a) candidato(a) da terceira via alcance viabilidade eleitoral é a disparada de Lula nas pesquisas e a sinalização que ele já venceria no primeiro turno. Esse cenário produziria a percepção cada vez mais nítida de que Bolsonaro seria incapaz de derrotá-lo, o que levaria uma desagregação ainda maior da base de eleitores do presidente e uma progressiva desidratação de sua candidatura à reeleição.
Mais de Carlos Pereira
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A maioria dos eleitores que votaram em Bolsonaro em 2018 não nutrem conexões com o perfil conservador do presidente. Na realidade, são essencialmente pragmáticos. Apoiaram Bolsonaro na expectativa de que seu governo ofertasse o que de fato lhes interessava: políticas econômicas liberais, combate à corrupção e, principalmente, contenção do petismo. O governo Bolsonaro, especialmente na gestão da pandemia e da economia, frustrou profundamente tais expectativas, o que tende levar esses eleitores anti-lulistas a considerar outras alternativas.
A perda de competitividade eleitoral de Bolsonaro também arrefeceria a percepção de que Lula seria o único candidato capaz de derrotá-lo. Vários desses eleitores têm reservas ao ex-presidente em função dos diversos escândalos de corrupção e/ou do fracasso econômico de gestões petistas. Mas também desenvolveram um desafeto extremo a Bolsonaro diante da ameaça que representaria à democracia liberal brasileira. Por que votar em Lula no primeiro turno se Bolsonaro deixou de ser competitivo eleitoralmente? É esperado, portanto, que esses eleitores venham igualmente a considerar outras alternativas à presidência.
Mesmo os eleitores que consideram votar em Lula na expectativa de que seu eventual governo volte a proporcionar maior inclusão social, quando expostos às várias contradições e inconsistências dos governos Petistas e do próprio ex presidente durante a campanha, teriam suas memórias negativas em relação à Lula reativadas.
Não seria improvável, portanto, que a candidatura de Bolsonaro derreta e fique reduzida ao tamanho de seu “core voters” (atualmente em torno de 11%, DataFolha) e que a candidatura de Lula perca musculatura alcançando no máximo 40% das intenções de voto, desempenho histórico do PT em disputas à presidência em primeiros turnos.
Esta hipótese, entretanto, se baseia na premissa de que os eleitores pragmáticos de Bolsonaro em 2018 sejam racionais e, portanto, consigam hierarquizar suas preferências em 2022. De acordo com o Ipec, 55% dos eleitores de Bolsonaro em 2018 não desejam mais votar no capitão. Mas 20% deles dizem que pretendem votar no Lula, o que parece não ser tão racional.
Paradoxalmente, a rejeição extrema a Bolsonaro tem sido o “anabolizante” de Lula. Cabe ao candidato(a) da terceira via se mostrar competitivo(a) o suficiente para atrair os que romperam com Bolsonaro, os que ainda não têm candidato e, finalmente, os incautos que, mesmo tendo reservas aos comportamentos desviantes de Lula, consideram votar nele por aversão a Bolsonaro.
Fonte: “Estadão”, 19/12/2021
Foto: Joédson Alves/EFE