Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro deu um passo importante para promover a articulação política com o Congresso. Ele recebeu líderes de seis partidos que representam, no seu linguajar, a “velha política”. Em vez de continuar demonizando as elites parlamentares, Bolsonaro sentou-se com elas para discutir o apoio à reforma da Previdência. A mudança é positiva, mas insuficiente.
Logo após os encontros, Bolsonaro disse que vai constituir um Conselho Político para discutir temas de interesse do país e assessorá-lo em suas decisões. Tal conselho pode ser útil para conversar sobre as reformas e discutir temas associados à agenda do governo. Dificilmente terá, todavia, papel relevante em arregimentar votos no Congresso.
De fato, será muito difícil avançar nas mudanças sem formar uma base parlamentar majoritária, coesa e comprometida com a agenda do governo. Em sistemas políticos multipartidários como o nosso, em que o partido do presidente não elege a maioria no Congresso, será preciso organizar uma coalizão de partidos políticos com tais objetivos.
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Como se sabe, aqui e em outros países, coalizões pressupõem alianças cuja eficácia está condicionada ao compartilhamento do poder. Os partidos dividem com o presidente a participação no governo e indicam pessoas para ministérios e outros órgãos públicos. Aqui, a coalizão envolve também a liberação de emendas parlamentares. Em resumo, os aliados partilham êxitos e fracassos. Em contrapartida, se comprometem a votar favoravelmente os projetos integrantes da agenda do governo.
Bolsonaro declarou que não discutiu a distribuição de cargos, o que foi corroborado pelos seus interlocutores. Isso pode ser verdadeiro ou resultar de uma combinação prévia entre eles. O presidente elegeu-se prometendo acabar com o toma lá dá cá de cargos e com a liberação de emendas, dando a entender que esse processo é por natureza corrupto, o que não correspondente à realidade. Foi assim, essencialmente, no período de governo do PT.
Uma visão otimista sobre os encontros dirá que Bolsonaro começou a rever o seu discurso, convencido de que precisa render-se às negociações características do presidencialismo de coalizão. Ademais, o presidente tem a prerrogativa de não acolher indicações para cargos. Os parlamentares entendem isso e procurarão outros nomes.
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Na visão pessimista, as reuniões com os partidos representam apenas um gesto do presidente. Não conduziriam à formação da necessária aliança, estabelecida sob a forma de uma coalizão partidária. Isso não impediria a aprovação da reforma da Previdência, mas submeteria seu êxito à mera boa vontade dos parlamentares.
Por aí, os deputados e senadores se moveriam individualmente por um instinto de sobrevivência, dados os riscos, para eles e o país, de um fracasso. É arriscado, contudo, contar com tal postura para obter uma reforma ampla, capaz de gerar substancial economia de recursos e manter a confiança no futuro da economia brasileira.
Fonte: “Veja”, 07/04/2019