O PT continua a ser o partido que mais atrai a preferência do brasileiro, segundo o último levantamento divulgado ontem pelo Datafolha. Desde o impeachment de Dilma Rousseff, a parcela de brasileiros que afirmam ter mais simpatia pelo PT que por qualquer outro partido cresceu de 9% para 24%.
A simpatia pelo PT já chegou a 31% em abril de 2012, quando o partido superara a crise do mensalão e, ainda no primeiro governo Dilma, não sofrera o revés da política econômica desastrada adotada por ela. Não há partido brasileiro que apresente números comparáveis.
Na pesquisa divulgada ontem, PSDB, MDB e PSOL, os segundos colocados, atraem, cada um, apenas 4% da preferência dos eleitores. Ao longo de 30 anos, o PSDB não ultrapassou os 7%. O MDB tinha 19% no início dos anos 1990. Desde 2010, também não passa de 7%.
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“De todos os muitos partidos brasileiros, apenas o PT conseguiu cultivar um apego psicológico forte entre uma proporção substancial dos eleitores brasileiros”, escrevem os cientistas políticos David Samuels e César Zucco no livro Partisans, antipartisans and nonpartisans, sobre o qual escrevo em minha coluna desta semana na revista Época.
Apesar da dificuldade dos demais partidos para atrair simpatizantes, eles constatam um fenômeno paralelo e simultâneo ao partidarismo petista: o antipetismo. Mesmo sem demonstrar preferência explícita por outro partido, uma parcela substancial dos brasileiros manifesta antipatia clara pelo PT. Não são indiferentes ou apartidários. São antipartidários.
O Datafolha não faz levantamento sobre antipatia partidária. Samuels e Zucco a medem por meio de outras pesquisas. Enquanto o partidarismo chegou a quase 60% do eleitorado no final dos anos 2000, o antipartidarismo mais que dobrou entre 1997 e 2014, de 10% para 23%.
Em 2014, dois terços dos que tinham simpatia por algum partido eram petistas; três quartos dos que tinham antipatia, antipetistas.
No início do governo Lula, dizem Zucco e Samuels, 40% dos brasileiros eram ou petistas ou antipetistas. “O antipetismo parece ter surgido como reação à emergência do PT e do petismo entre os eleitores brasileiros, não porque os rivais do PT o tenham cultivado deliberadamente.”
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O PT, dizem, foi vítima do próprio sucesso. “Por 30 anos, foi a marca partidária mais importante no Brasil. Apesar dos escândalos que feriram sua reputação, um fato permanece verdade: eleitores ainda formam suas opiniões sobre o PT e pintam seus integrantes e autoridades eleitas nas mesmas tintas, tanto negativas quanto positivas.”
Ao contrário do que se poderia imaginar, eles não constataram nenhuma diferença significativa entre os dois grupos no que diz respeito a nível social, econômico ou cultural. “Mesmo hoje, a divisão petista/antipetista não pode ser descrita como ‘elites contra povo’.”
Mais que isso, mesmo comparados numa escala ideológica entre direita e esquerda – levando em conta fatores como posição sobre aborto, direitos dos homossexuais ou papel do Estado na economia – os dois grupos, petistas e antipetistas, se revelaram supreendentemente similares.
“Os caminhos para o petismo e o antipetismo não começam com as diferenças demográficas nem seguem uma história convencional de polarização esquerda-direita”, dizem. “Em vez disso, as diferenças entre petistas e antipetistas derivam de atitudes normativas distintas sobre como a política deveria funcionar.”
Na interpretação deles – discutível, apresentada sem muita base empírica –, os petistas se mostram mais “abertos à mudança política e social”, à participação popular e ao ativismo. Antipetistas, ao contrário, “tendem a temer a mudança social e têm mais chance de questionar o valor da democracia”. Em nenhum momento, Samuels e Zucco mencionam ou discutem o apoio petista às ditaduras de Cuba ou da Venezuela.
Mesmo que a explicação deles para o êxito petista seja insuficiente, a divisão que detectaram na sociedade brasileira é real e já se mostra decisiva no cenário eleitoral deste ano. Ao insistir na candidatura ilegal do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso e condenado por corrupção, o PT conseguiu formular um narrativa de perseguição que fez crescer, ao mesmo tempo, a simpatia dos petistas e a antipatia dos antipetistas.
Ao logo das sete últimas eleições, a estratégia do “nós contra eles” foi eficaz para levar o PT quatro vezes à vitória. Lula será, ao que tudo indica, impedido de concorrer este ano pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O candidato petista que vier substituí-lo poderá ganhar ou perder a eleição. Pouco importa. Enquanto a polarização em torno do partido prevalecer no sentimento do eleitor, o vitorioso só poderá ser o próprio PT.
Fonte: “G1”, 24/08/2018